Em visita à Escola Secundaria D.João II, em Setúbal, a coordenadora do Bloco de Esquerda quis reafirmar o compromisso do partido com a recuperação do tempo de serviço dos professores. "Se queremos um ensino de qualidade, precisamos de dar condições de trabalho aos professores e ter mais professores. Há 30 mil alunos que não têm professor a pelo menos uma disciplina. Como é que vai ser a aprendizagem destes alunos?", questionou Mariana Mortágua depois de ouvir as queixas dos docentes sobre a falta de professores nas escolas.
"O tempo de serviço dos professores tem de ser respeitado. Mas é preciso fazer mais: compensar os professores deslocados de forma a que possam fazer face às suas despesas, às rendas e despesas de alojamento e as enormes distâncias que têm de percorrer", defendeu a coordenadora bloquista.
Mariana Mortágua acusou o Governo de "irresponsabilidade" por ter dito ao longo dos últimos quatro anos que não era possível recuperar o tempo de serviço dos professores, e agora o mesmo ministro da Educação, "já perto das eleições, diz que afinal até havia margem para recuperar o tempo de serviço e o Governo é que não o quis fazer". Para a coordenadora do Bloco, "não há maior irresponsabilidade que esta, de brincar com a vida das pessoas".
A recuperação do tempo de carreira dos professores é "um dos temas em que se percebe melhor os truques orçamentais do Governo, pois "já foram avançados três números: 300 milhões, 600 milhões e mil milhões. Ninguém sabe quanto é que custa porque o Governo não diz quanto é que custa para poder alimentar esta ideia de que não é possível".
No entanto, contrapôs Mariana Mortágua, "ao mesmo tempo mantém um benefício fiscal a residentes não habituais que custa 1.500 milhões de euros por ano". A conclusão que tira é que esta "não é uma questão orçamental, é uma questão de escolha política", como a recente confissão do ministro João Costa veio confirmar.
PISA: Opções liberais fracassaram, Portugal não conseguiu recuperar aprendizagens após a pandemia
Comentando os resultados do inquérito internacional sobre as aprendizagens, o PISA, Mariana Mortágua destaca duas conclusões: a primeira é que "os países que enveredaram por opções liberais de cheque ensino tiveram muito maus resultados nas aprendizagens". E a segunda é que "Portugal foi incapaz de recuperar aprendizagens depois da pandemia e está a perder qualidade nas aprendizagens".
As razões para essa queda são bem conhecidas, prosseguiu. "Não há professores suficientes para as necessidades do país, porque uma grande parte dos professores está em situação de precariedade e porque quando era mais necessário recuperar a capacidade da escola o Governo preferiu fazer um braço de ferro com os professores".
"O Governo preferiu comprar um braço de ferro, tentou colocar o país contra os professores. Mas os professores não estão a defender só o seu tempo de serviço, estão a defender uma educação com qualidade, porque são os primeiros que sabem qual é o impacto que tem um aluno não ter professor a uma disciplina durante um período, dois períodos, durante anos", acrescentou a coordenadora bloquista.
Mariana Mortágua concluiu que "é preciso recuperar o orgulho que é trabalhar numa escola", porque "no limite o que está em causa é se Portugal consegue ou não consegue oferecer às suas crianças um ensino de qualidade".
Alunos sem professores: "É o currículo que está em causa"
Carla Ascenso, professora de inglês da Escola Secundária D. João II, afirmou aos jornalistas estar "profundamente preocupada enquanto professora e mãe" com a situação atual nas escolas, marcada pela "falta de professores e a falta de qualificação de professores que vêm tapar buracos, não vêm dar aulas". E diz que "há muitas situações em que o professor substituto apenas vem garantir um lugar que está vago, mas não para formar cidadãos na sua habilitação académica para um dia desempenhar uma profissão".
"Deveríamos estar a formar os futuros médicos, engenheiros arquitetos e não estar a fazer serviço de baby-sitting", prosseguiu a docente, alertando que "é o currículo que está em causa", pois "há alunos sem professores anos inteiros".
"No meu grupo há um horário que está há dois meses sem professor", acrescentou a professora, ressalvando que nesta escola a situação é bem melhor do que outras no mesmo distrito, pois "temos boas instalações e bom ambiente de trabalho. Mas há escolas em Setúbal, Palmela e toda esta zona que não têm a nossa sorte".