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Manifesto apela à libertação dos presos na Catalunha

Em vésperas de eleições em Espanha, manifesto divulgado esta terça-feira no jornal Público apela à libertação dos líderes catalães presos devido ao referendo à independência de outubro de 2017.
Bandeiras pró-independência, Barcelona, Fevereiro de 2019. Foto Cory Doctorow/Flickr.
Bandeiras pró-independência, Barcelona, Fevereiro de 2019. Foto Cory Doctorow/Flickr.

Com eleições marcadas em Espanha no próximo fim de semana, a situação dos presos políticos catalães é relembrada esta terça-feira num manifesto no jornal Público. Mais de uma dezena de pessoas enfrentam julgamento por crimes de rebelião e sedição por terem ajudado a organizar um referendo à independência da Catalunha em outubro de 2017, não reconhecido por Madrid.

O manifesto "Pela democracia e pelas liberdades na Catalunha", afirma que o processo "contra os independentistas catalães põe um sério problema de liberdades públicas e de democracia". Considera que o problema carece de "soluções políticas e não judiciais", pelo que apela à "libertação imediata dos líderes políticos e associativos catalães presos" e ao levantamento das "acusações contra todos os cidadãos catalães que participaram na organização do referendo".

O manifesto é subscrito por mais de 50 personalidades da academia, da política e de outras áreas. O esquerda.net reproduz abaixo o texto na íntegra.


Pela democracia e pelas liberdades na Catalunha

Os subscritores deste manifesto consideram que o problema catalão é de natureza eminentemente política e pugnam pela libertação imediata dos líderes políticos e associativos catalães presos.

Em fevereiro, começou em Madrid, no Supremo Tribunal, o julgamento de 12 líderes políticos e associativos catalães. São estes acusados pelo Estado espanhol de “rebelião”, “sedição” e “desvio de fundos” por terem organizado e implementado o referendo sobre a independência da Catalunha em 1 de outubro de 2017. Os acusados, detidos há já um ano e meio, declaram-se “presos políticos” e o julgamento tem sido descrito por diversas organizações e personalidades à escala internacional (a Prémio Nobel da Paz Jody Williams, parlamentares de vários países, etc.) como um processo político, exigindo a libertação dos acusados.

Contudo, não são apenas os líderes políticos e sociais catalães que são perseguidos pelo Estado espanhol e respetivo aparelho judiciário: há milhares de cidadãs e cidadãos catalães que participaram na organização do citado referendo e que são alvo de processos judiciais e correm o risco de prisão e/ou de pesadas penalizações. É o caso de vários professores universitários (de ciência política e de direito) nomeados pelo governo catalão para monitorizar o referendo, o que levou a Associação Americana de Ciência Política (APSA) a pedir ao primeiro-ministro Pedro Sánchez que o Estado espanhol retire de imediato as acusações contra estes profissionais. E é revelador o facto de as autoridades e os órgãos de comunicação social catalães terem sido oficialmente proibidos de usar expressões como “presos políticos” e “exilados”.

A acusação de “sedição” (isto é: o “levantamento coletivo de natureza contestatária contra as autoridades ou poderes estabelecidos, geralmente de carácter violento”) representa uma evidente tentativa de criminalização de uma atitude política. Mas enferma também de falta de objetividade: televisões e jornais do mundo inteiro mostraram claramente que foi o Estado espanhol que encetou uma mobilização sem precedentes de forças policiais para usarem a força contra cidadãs e cidadãos indefesos, e para tentarem impedir a realização do referendo de outubro de 2017. O processo atual contra os independentistas catalães põe assim um sério problema de liberdades públicas e de democracia. E tanto mais quanto a justiça espanhola é considerada como uma das mais politizadas da Europa e largamente suspeita de fraca imparcialidade.

As causas próximas da crise atual remontam a 2010: durante o consulado de José Luis Zapatero (então líder do PSOE e primeiro-ministro) foi aprovada uma reforma do Estatuto da Catalunha num sentido mais federal. A dita reforma foi aprovada por 85% dos deputados do Parlamento da Catalunha (2005), por 73,9% dos eleitores na Catalunha (2006) e, numa versão mais minimalista, por uma maioria absoluta no Congresso dos Deputados de Espanha (2006). Porém, o Partido Popular, recorrendo ao Tribunal Constitucional, fez rejeitar 41 artigos do Estatuto, levando desde logo ao impasse político-constitucional atual.

Os subscritores deste manifesto consideram que o problema catalão é de natureza eminentemente política, carecendo de soluções políticas e não judiciais, pelo que pugnam pela libertação imediata dos líderes políticos e associativos catalães presos. Almejam ainda que sejam levantadas as acusações contra todos os cidadãos catalães que participaram na organização do referendo. E instam os responsáveis políticos espanhóis e catalães a que encontrem uma solução política, de modo a que os cidadãos da Catalunha (“independentistas” ou “unionistas”) possam, em condições de igualdade de oportunidades e de lisura processual, votar livremente sobre o seu destino político-institucional. A bem de todos: da Catalunha, da Espanha e da União Europeia.

Subscritores:

Abílio Hernandez, professor de literatura e estética
Adelino Maltez, politólogo
Alfredo Barroso, cronista e ensaísta
Alfredo Caldeira, jurista
Álvaro Garrido, Historiador
Ana Sofia Ferreira, historiadora
Andreia Lourenço Marques, politóloga, activista de direitos humanos
António Borges Coelho, historiador
Ascenso Simões, gestor, deputado do PS
Boaventura de Sousa Santos, sociólogo
Carlos Vargas, jornalista e economista
Cipriano Justo, médico, dirigente da Renovação Comunista
Daniel Adrião, dirigente do PS, consultor
Daniel Oliveira, jornalista​
David Duarte, investigador em filosofia política
Diana Andringa, jornalista
Domingos Lopes, advogado
Elísio Estanque, sociólogo
Fernando Oliveira Baptista, engenheiro agrónomo
Filipe Piedade, investigador em Ciências da Educação e Estudos Políticos
Francisco Louçã, economista
Francisco Oneto Nunes, antropólogo
Francisco Teixeira, professor de Filosofia e Ciência Política
Gaspar Martins Pereira, historiador
Isabel Faria, médica, funcionária reformada da Comissão Europeia
Isabel Moreira, jurista, deputada independente do PS
Helena Roseta, arquitecta, deputada independente do PS
Joana Mortágua, politóloga, deputada do BE
João M. Almeida, químico, quadro superior na administração local
João Teixeira Lopes, sociólogo
Jorge Araújo, biólogo
José Manuel Pureza, politólogo, vice-presidente da Assembleia da República
José Pacheco Pereira, Historiador, publicista
Luís Monteiro, licenciado em arqueologia, deputado do BE
Manuel Brito, professor aposentado, ex-presidente do Instituto Nacional do Desporto
Manuel Carvalho da Silva, sociólogo, investigador
Maria Isabel Loureiro, médica, professora de saúde pública
M. Carmo Marques Pinto, advogada, membro do governo da Crida Nacional Per la República
Maria Manuel Rola, designer, deputada do BE
Maria do Rosário Gama, professora do secundário, dirigente da APRE
Marisa Matias, socióloga, eurodeputada pelo BE
Miguel Cardina, investigador em ciências sociais
Miguel Vale de Almeida, antropólogo
Nelma Moreira, professora de ciências da computação
Norberto Cunha, historiador
Paula Godinho, antropóloga
Paulo Fidalgo, médico, dirigente da Renovação Comunista
Paulo Filipe Monteiro, realizador
Pedro Bacelar Vasconcelos, constitucionalista
Ricardo Sá Fernandes, advogado
Richard Zimler, escritor
Rui Pato, médico e músico
Rui Pereira, professor, jornalista e ensaísta
Rui Sá, Engenheiro e Membro da Assembleia Municipal do Porto pela CDU
Rui Tavares, historiador, dirigente do Livre
Sandrina Antunes, politóloga
Sónia Duarte, professora do secundário e investigadora em Linguística
Ulisses Pereira, economista, deputado do PSD

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