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Lucros estão a puxar pelos preços na Zona Euro e em Portugal

A escalada da inflação ao longo dos últimos meses afetou o poder de compra da maioria das famílias. A subida dos preços, que começou por estar concentrada nos produtos energéticos (petróleo, gás ou eletricidade) mas se alastrou ao resto da economia, desencadeou um debate sobre as origens deste processo e as respostas necessárias.
Durante vários meses, a maioria dos economistas estava sobretudo focada na evolução dos salários e nos riscos de uma “espiral inflacionista”: o receio era o de que os aumentos dos salários sobrecarregariam as empresas e levariam a novos aumentos dos preços, acentuando a tendência.
No entanto, os dados disponíveis contam uma história diferente: foram as margens de lucro, e não os salários, que mais cresceram no contexto inflacionista. Fontes presentes na última reunião do Banco Central Europeu (BCE) disseram à Reuters que o banco central tem dados que mostram que foram as margens das empresas, e não os “custos do trabalho” ou os impostos, a contribuir para as pressões inflacionistas, sobretudo em setores como o comércio, a indústria ou as atividades ligadas ao turismo.
Em Portugal, o cenário não é muito diferente. Segundo o Jornal de Negócios, “no terceiro trimestre, o excedente bruto de exploração das atividades económicas, que traduz margens de lucro no valor acrescentado bruto (VAB) gerado pelo país, subia 7% face a um ano antes. Os salários pagos a trabalhadores cresciam apenas 0,5%”.
Os economistas ouvidos pelo Jornal de Negócios não atribuem, contudo, a subida dos preços ao aumento das margens das empresas. Para Miguel Faria e Castro, economista da Reserva Federal norte-americana, e Gonçalo Pina, professor da ESCP Berlim, os lucros seriam apenas uma consequência do aumento do consumo num contexto em que os preços estão a subir, não implicando necessariamente que haja aproveitamento por parte das empresas. Faria e Castro diz mesmo que estes dados dão força ao BCE para continuar a subir as taxas de juro para desacelerar o consumo.
Economistas defendem que o aumento das taxas de juro não é a solução adequada
No entanto, nem todos partilham esta visão. Num artigo publicado recentemente, a economista Isabella Weber, em conjunto com Evan Wasner, apresenta uma visão alternativa: apesar de a inflação ter sido inicialmente desencadeada pelos problemas na oferta de energia, há empresas com poder de mercado suficiente para aproveitar o contexto e não apenas manter, mas aumentar as suas margens.
Este fenómeno acontece em setores particularmente concentrados, como o caso da energia ou da distribuição de bens alimentares. Nestes setores, o mercado é dominado por um pequeno número de grandes empresas. Num contexto em que a oferta é insuficiente face à procura, se todas as empresas aumentarem os preços ao mesmo tempo, o risco de perderem quota de mercado é muito reduzido, o que explica a possibilidade de aumento das margens.
Face a este cenário, Weber e Wasner defendem que o aumento das taxas de juro não é a solução adequada. As respostas passam antes pela intervenção dos poderes públicos para garantir reservas de matérias-primas que permitam atenuar as oscilações dos preços, limitar as margens máximas das empresas, tributar lucros extraordinários e controlar preços em setores estratégicos.
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