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Liberdade de expressão: Espanha soma 128 condenações desde 2004

Alfredo Remírez, preso em 2015, passou um ano na prisão por ter publicado tweets de apoio aos presos bascos. “É um tipo de delito que nunca devia ter sequer existido, espero que mais ninguém tenha de ir para a prisão por uma parvoíce destas”, afirmou Ramírez ao portal El Salto em reação à promessa do governo espanhol de alterar o código penal nesse sentido.
Além do enaltecimento do terrorismo ou injúrias à Coroa, a lei espanhola também criminaliza a blasfémia, ao punir no artigo 525º com multas de oito a doze meses quem queira “ofender os sentimentos dos membros de uma confissão religiosa” e “faça escárnio dos seus dogmas, crenças, ritos ou cerimónias”. O segundo ponto deste artigo acrescenta que a mesma pena se aplica a quem faça o mesmo dirigindo-se a quem não professe nenhuma religião. Já a interrupção de atos religiosos pode ser punida com prisão pelo crime de profanação, pelo qual ativistas da Femen foram condenadas em 2019 a uma multa. O mesmo aconteceu a um jovem de Jaén que publicou no Instagram uma montagem em que pôs a imagem de Cristo com a sua cara. A única pena de prisão efetiva por este crime aconteceu em 2017, com a condenação a seis meses de prisão a um homem por ter gritado “Aborto livre e gratuito!” e lançado panfletos durante uma missa na Catalunha em 2014, quando se discutia na sociedade uma proposta do governo do PP para restringir a lei do aborto.
O crime de ofensa à Coroa também tem dado origem a condenações, como a da revista satírica El Jueves em 2007 a propósito do “cheque-bebé” do Governo Zapatero. A imagem de Felipe e Letizia a praticarem sexo enquanto o atual monarca espanhol dizia que aquilo era o mais parecido a trabalhar que já tinha feito valeu a apreensão de toda a edição da revista antes de chegar às bancas e uma multa de três mil euros aos autores. Desta vez, o ilustrador Azagra publicou nas redes sociais o seu desenho na próxima revista, em que volta a desafiar a censura:
Esta semana en el Jueves #LlibertatPabloHasel #LibertadPabloHasel pic.twitter.com/3e0TqybUDI
— Carlos Azagra (@cazagra) February 18, 2021
Também o líder independentista basco Arnaldo Otegui foi condenado a um ano de prisão por chamar a Juan Carlos “o rei dos torturadores”, tendo o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos condenado depois o Estado espanhol a indemnizá-lo em 20 mil euros por considerar a sentença excessiva.
A reportagem do El Salto lembra também o primeiro condenado a pena de prisão por estes crimes em democracia, o cantautor galego Suso Vaamonde em 1980, primeiro a doze anos de prisão e depois reduzida para seis anos e um dia. Suso fugiu para a Venezuela e depois regressou a Espanha para se entregar à justiça, em troca da promessa de indulto de Felipe González, concretizada após passar 46 dias preso. Durante os quatro anos de exílio contou com a solidariedade de muitos artistas portugueses com quem partilhara palcos, como Zeca Afonso, José Mário Branco, Fausto ou Adriano Correia de Oliveira. A razão do seu crime por ofensas à pátria foi ter acrescentado esta estrofe a uma canção popular durante um recital em Pontevedra contra as centrais nucleares:
Cando me falan de España
sempre teño unha disputa
que se España é miña mai
eu son un fillo de puta.
Suso Vaamonde morreu em 2000, sem chegar a assistir ao fim destas punições à liberdade de expressão na lei espanhola.
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