The Lancet sublinha que o Ministério da Saúde de Gaza tem comunicado historicamente dados de mortalidade precisos, com discrepâncias entre os relatórios do Ministério da Saúde e as análises independentes das Nações Unidas a variar entre 1,5% e 3,8% em conflitos anteriores. E que uma comparação entre os números de mortalidade do Ministério da Saúde de Gaza e do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Israel referentes à guerra de 2014 resultou numa discrepância de 8%.
A revista científica realizou uma análise temporal da mortalidade cumulativa relatada em Gaza para mortes de habitantes locais, conforme relatado pelo Ministério da Saúde, e mortes relatadas de funcionários da Agência das Nações Unidas de Assistência e Obras para Refugiados da Palestina no Oriente Próximo (UNRWA), de 7 de outubro a 10 de novembro. De acordo com a The Lancet, estas duas fontes de dados utilizaram métodos independentes de verificação de mortalidade, permitindo a avaliação da consistência dos relatórios.
“No evidence of inflated mortality reporting from the Gaza Ministry of Health”: new letter by Benjamin Q Huynh and colleagues. https://t.co/cvd6BCsdci
— The Lancet (@TheLancet) December 7, 2023
“Observámos tendências diárias semelhantes, indicando consistência temporal na resposta aos bombardeamentos até que ocorreu um pico de mortes de funcionários da UNRWA em 26 de outubro de 2023, quando 14 funcionários da UNRWA foram mortos, dos quais 13 morreram nas suas casas devido aos bombardeamentos. Os ataques subsequentes aumentaram a taxa de mortalidade da UNRWA, enquanto os serviços hospitalares do Ministério da Saúde diminuíram até que as comunicações e os relatórios de mortalidade do Ministério da Saúde entraram em colapso em 10 de novembro de 2023. Durante este período, a mortalidade pode ter sido subnotificada pelo Ministério da Saúde de Gaza devido à diminuição da capacidade”, escreve a revista.
As mortes cumulativas relatadas foram de 101 funcionários da UNRWA e 11.078 habitantes de Gaza durante 35 dias. Em comparação, foi registada uma média de 4.884 mortes por ano no período entre 2015 e 2019 em Gaza.
A Lancet explica que, “se os números de mortalidade do Ministério da Saúde fossem substancialmente inflacionados, seria de esperar que as taxas de mortalidade do Ministério da Saúde fossem superiores às taxas de mortalidade da UNRWA. Em vez disso, as taxas de mortalidade do Ministério da Saúde são inferiores às taxas comunicadas para o pessoal da UNRWA (5,3 mortes por 1000 vs 7,8 mortes por 1000, a 10 de novembro de 2023)”.
Sublinhando que “a notificação de mortalidade é difícil de realizar em conflitos em curso” e que é provável “subestimar as mortes que não são registadas pelos hospitais ou morgues, tais como pessoas soterradas sob os escombros”, a revista refere que é certo que “a situação em Gaza é grave, com elevados níveis de danos civis e acesso extremamente restrito à ajuda”.
A The Lancet defende que “os esforços para contestar a notificação de mortalidade não devem desviar a atenção do imperativo humanitário de salvar vidas de civis, garantindo o fornecimento imediato de artigos médicos, alimentos, água e combustível adequados”.
Israel mata reféns desarmados e com bandeira branca
A imprensa internacional, que se baseia numa fonte do exército de Telavive, refere que, de acordo com uma investigação inicial, um soldado disparou sobre três reféns desarmados que saíram de um edifício ostentando uma bandeira branca. O porta-voz do exército israelita apontou que dois dos jovens israelitas foram imediatamente mortos e que o terceiro ficou ferido, procurando alcançar um prédio ao mesmo tempo que pedia ajuda "claramente ajuda em hebraico". Apercebendo-se desse facto, o comandante do batalhão terá emitido "uma ordem de cessar-fogo". Ainda assim, foi disparado mais um tiro, que matou o refém.
O exército de Israel enfrenta também uma acusação, por parte do grupo israelita de direitos humanos B’Tselem, de levar a cabo duas 'execuções ilegais'. Num vídeo divulgado por este coletivo, é possível ver o exército israelita a executar dois homens desarmados, um deles incapacitado, durante uma operação militar a um campo de refugiados.
A ministra da Saúde palestiniana, Mai al-Kaila, pediu uma “investigação urgente” depois de as forças israelitas serem acusadas de esmagar palestinianos, incluindo pacientes feridos, usando escavadoras no pátio do Hospital Kamal Adwan, no norte de Gaza. No sábado, médicos e outras testemunhas disseram que as forças israelitas demoliram tendas que abrigavam palestinianos deslocados perto do hospital e os esmagaram até a morte.
“Povo de Gaza está preso num ciclo de morte, destruição, fome e doença”
Funcionários das Nações Unidas (ONU) que, no sábado, entregaram mantimentos médicos ao Hospital Al-Shifa, no norte de Gaza descreveram o departamento de emergência como um “banho de sangue”, com centenas de feridos no interior e um fluxo constante de novos pacientes.
Segundo a equipa, os pacientes com lesões traumáticas estavam a ser suturados no chão, o que limita o controlo da dor no hospital, e a urgência está tão lotada que os funcionários devem ter cuidado para não pisar os pacientes.
WHO delivers health supplies to Al-Shifa Hospital, appeals for continued access to address urgent needs in north #Gaza
WHO staff participated in a joint UN mission to Al-Shifa Hospital in north Gaza on 16 December to deliver health supplies and assess the situation in the… pic.twitter.com/gIa3tG97mC
— World Health Organization (WHO) (@WHO) December 16, 2023
O hospital só consegue assegurar estabilização básica de traumas e não dispõe de sangue para transfusão. Um punhado de médicos e enfermeiros, e cerca de 70 voluntários, estão a trabalhar sob o que a equipa da Organização Mundial de Saúde (OMS) descreveu como “circunstâncias incrivelmente desafiantes” num hospital “que necessita de reanimação”.
Em comunicado divulgado no sábado, a OMS afirmou que está empenhada em fortalecer o Hospital Al-Shifa nas próximas semanas, para que possa retomar pelo menos a funcionalidade básica, fornecer serviços de salvamento extremamente necessários e servir “um povo sitiado preso num ciclo de morte, destruição, fome e doença”.
Ataques aéreos e incursões terrestres continuam a multiplicar mortos
Nas últimas horas, ataques aéreos israelitas ao campo de refugiados de Jabalia, no norte de Gaza, mataram pelo menos 20 pessoas e feriram cerca de 100. As forças israelitas atacaram vários outros locais da Faixa de Gaza, incluindo a cidade de Khan Younis, no sul, e Deir el-Balah, no centro de Gaza. Duas pessoas foram mortas no distrito de Geneina, em Rafah, e muitas outras ficaram feridas.
Uma aeronave israelita teve como alvo o campo de refugiados de Nur Shams, em Tulkarem, na Cisjordânia ocupada. O Crescente Vermelho Palestiniano e o Ministério da Saúde registaram, pelo menos, cinco mortos. A agência de notícias Wafa informou que as forças israelitas impediram as ambulâncias de aceder ao campo e prenderam um paramédico. Um ataque em grande escala com tanques e escavadoras seguiu-se ao ataque aéreo.
Os militares de Israel afirmam que dois soldados da reserva foram mortos nos combates em Gaza, elevando para 121 o número total de militares israelitas mortos desde o início da ofensiva terrestre de Israel no território.
Até ao momento, e desde 7 de outubro, o ministério da Saúde de Gaza já reportou 18.787 mortos e 50.897 feridos na Faixa de Gaza. Na Cisjordânia ocupada foram comunicados 297 mortos e 3.365 feridos.
De acordo com as autoridades israelitas, 1.139 israelitas morreram e 8.730 ficaram feridos. Desde o início da ofensiva terrestre, morreram 121 soldados israelitas.