Judiciária só foi chamada a investigar seis das 303 mortes nas prisões

24 de janeiro 2022 - 12:24

Os números são dos últimos cinco anos e mostram como a prática dos serviços prisionais contraria o entendimento seguido por peritos da ONU e Cuz Vermelha de que qualquer morte no interior da prisão deve ser considerada suspeita.

PARTILHAR
grades
Foto Daniele Nicolucci/Flickr

O caso recente da morte do jovem Danijoy Pontes no Estabelecimento Prisional de Lisboa, cuja investigação só foi assumida pela Polícia Judiciária após protestos da família e de associações antiracistas, veio adensar as dúvidas sobre o tratamento por parte das autoridades prisionais das mortes ocorridas dentro das prisões.

Segundo revela o Diário de Notícias, a Polícia Judiciária - que tem a competência de investigação de mortes violentas, como o suicídio - só raramente é a primeira a ser chamada ao local do eventual crime. Nos últimos cinco anos isso aconteceu em apenas 6 das 303 mortes em espaço prisional, incluindo o caso de Danijoy e também o de Maria Malveiro, encontrada morta na cela em Tires a 29 de dezembro. Mas em ambos os casos a PJ só foi chamada tardiamente, impedindo uma análise forense e um exame ao local da morte. "Não temos falta de meios para investigar estes casos. Se não formos logo para o local perde-se a janela de oportunidade para realizar uma inspeção completa e que é essencial", disse ao DN um dirigente desta polícia.   

Segundo um perito da PJ em homicídios  ouvido pelo Diário de Notícias, "as suspeitas de crime podem ser evidentes ou não. São mortes em locais fechados e em ambiente hostil, tratá-las sempre como suspeitas devia ser sempre o ponto de partida".

Este entendimento é partilhado por Duarte Nuno Vieira, perito forense do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos e ex presidente do Instituto de Medicina Legal, ao afirmar ao DN que “todas as mortes em meio prisional devem ser encaradas como suspeitas por princípio de precaução, ou seja, deve ser seguido o procedimento adequado a uma morte suspeita”. E também está de acordo com as normas para a investigação de mortes em custódia seguidas pelo Comité Internacional da Cruz Vermelha, ao estabelecer que “o local da morte deve ser encarado como uma potencial cena de crime, especialmente se o óbito foi inesperado."

Para explicar a ausência de comunicação imediata à PJ nestes casos, a Direção Geral dos Serviços Prisionais escuda-se com a sua interpretação da lei portuguesa, que manda chamar o Órgão de Polícia Criminal. Segundo o DN, os serviços prisionais entendem que essa competência cabe à PSP ou GNR, dependendo do local onde se encontra a prisão, e que serão estas a decidir se chamam ou não a Polícia Judiciária.