Um relatório da fundação neerlandesa Changing Markets vem demonstrar como as grandes empresas mundiais do setor da produção de carne e produtos lácteos têm sistematicamente agido para desviar, atrasar e bloquear a ação em defesa do clima.
Os investigadores analisaram 22 das maiores empresas destes setores e encontraram “portas giratórias, conflitos de interesses e acesso privilegiado a decisores políticos de topo” que contribuem para bloquear a monitorização e regulamentação das emissões poluentes. Isto para além de usarem frequentemente “táticas de greenwashing, falsas alegações climáticas e desinformação dirigida à geração Z”.
A FAO, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, estima que apenas o setor da produção de carne seja responsável por 14,5% das emissões de gases com efeito de estufa do mundo. Sendo assim, assumem os redatores, “não podemos cumprir o objetivo de aumento da temperatura de 1,5º do Acordo de Paris sem reduzir significativamente as emissões de metano e o consumo de produto animais”. Mas a produção de carne beneficia de muitas exceções relativamente ao que o resto das indústrias é obrigado a cumprir. Os autores do estudo revelam que esta indústria tem conseguido obter “diversas concessões, isenções e atrasos na ação climática” no seu setores. Já para não falar nos subsídios agrícolas que beneficiam sobretudo as grandes empresas.
Exemplo disto foram os cortes nos objetivos e os adiamentos de “uma parte chave” do Pacto Verde da União Europeia, a estratégia “Da quinta para a mesa” que para além da redução de pesticidas e fertilizantes químicos defendia uma dieta “mais baseada em plantas, com menos carne vermelha e processada”. No relatório indica-se que empresas e organizações do setor tiveram perto de 600 reuniões de alto nível com a Comissão Europeia desde novembro de 2014. Isto apesar de apenas sete delas declararem fazer lóbi junto da UE (despendendo um gasto anual de 2,4 milhões de euros neste tipo de pressão política).
As maiores empresas dos setores da carne e do leite gastam ainda dinheiro no financiamento de supostos estudos científicos para lavar a sua imagem e as ajudar a defender mudanças legislativa. Conclusão: “a indústria distrai-nos com a cortina de fumo dos objetivos climáticos voluntários, os produtos respeitadores do meio ambiente e os investimentos aparentemente ambiciosos em tecnologias de redução das emissões, enquanto que, nos bastidores, mobiliza importantes recursos para atrasar e fazer descarrilar a legislação ambiental progressista”.
A Geração Z como alvo
Outra das estratégias reveladas pelo estudo da Changing Markets é o direcionar de campanhas publicitárias para a chamada Geração Z, usando “influencers” e investindo no TikTok, YouTube, Instagram e outras redes sociais.
Nestas redes sociais, há ainda “ataques diretos às dietas veganas e às proteínas alternativas, que são consideradas opções ultra-processadas e pouco saudáveis”. Apesar disso, algumas destas empresas estão também a promover produtos 100% vegetais como alternativas aos seus principais produtos. Só que “fazem-no com a intenção de fazer crescer um mercado adicional e não como parte de uma transição para produtos mais vegetais e menos e melhores produtos animais”.
A Changing Markets traça o paralelo com as táticas utilizadas pelas grandes empresas dos combustíveis fósseis e tabaqueiras e defende “medidas urgentes para regular a indústria, reduzir as emissões e investir em alternativas”.