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“A ideia de um bloco central nunca trará soluções ao país”

Em entrevista à RTP, Catarina Martins afirmou que em matérias como a defesa do SNS, dos salários e das pensões é à esquerda que se encontram soluções e que a ideia de um bloco central “não é muito diferente da ideia de uma maioria absoluta do PS”.
Catarina Martins
Catarina Martins na entrevista desta quinta-feira a RTP.

A coordenadora do Bloco foi entrevistada esta quinta-feira na RTP1 e assumiu que o partido vai disputar as eleições de 30 de janeiro com o objetivo de “manter-se como terceira força política e aumentar o seu grupo parlamentar”. Para Catarina, essa “é uma garantia de haver força à esquerda para debater matérias fundamentais como os salários, a saúde, os serviços públicos e a resposta climática, mas também dar uma lição à extrema-direita”.

Quanto à ideia de um bloco central, Catarina afirma que ”nunca trará nenhuma solução ao país, só trará mais problemas”. Por isso, “quem não quer premiar a arrogância de António Costa, que quis ir a eleições para ter uma maioria absoluta, sabe que conta com o Bloco para todas as soluções que contam para a vida das pessoas e o Bloco como terceira força é essa garantia”.

“A ideia do bloco central é a ideia para ficar tudo na mesma, ou seja, acaba por não ser muito diferente da ideia de uma maioria absoluta do PS”, prosseguiu a coordenadora bloquista, dando três exemplos: “Temos problemas com o SNS, mas o PSD quer privatizar o SNS, como é que vai ser o bloco central a resolver os problemas do SNS? Na questão dos baixos salários, não será com o PSD, que nem o salário mínimo nacional quer subir, que se resolve o problema”. E na Educação, onde há “30 mil alunos que neste momento não têm professor e ano após ano temos passado esta vergonha nacional de o segundo período de aulas começar com alunos sem professores”, lembrou o que aconteceu em 2019, quando o Bloco “lutou para que houvesse uma carreira e contagem do tempo de serviço de professores, o PS não quis e foi o PSD que roeu a corda aos professores para deixar tudo pior”.

Por isso, conclui Catarina, “estas eleições devem ser sobre as soluções e não sobre se o PS e o PSD se podem entender um com o outro, numa espécie de conspiração, para não resolverem os problemas do país”.

No último Orçamento, “o PS recusou qualquer passo que resolvesse problemas do país, mas quando tivemos um acordo houve estabilidade porque havia um caminho que o país estava a seguir”, recordou a coordenadora do Bloco, reforçando a necessidade de abrir “um novo ciclo”.

No entanto, não deixou de evocar algumas declarações das últimas semanas que vêm no sentido das propostas bloquistas rejeitadas pelo PS na negociação orçamental. Na questão das carreiras no SNS, o diretor do Instituto Português de Oncologia, “que perdeu 200 profissionais mal acabou o estado de emergência e puderam sair, dizia que por lhe recusarem progressões na carreira de cerca de 200 euros, estão a gastar milhares de euros a contratar serviços fora do IPO”. Nas questões do trabalho, “o líder dos sindicalistas do PS veio dizer que era preciso retirar o que está ainda da troika na legislação laboral”. E no que toca aos cortes do fator de sustentabilidade nas pensões, esta semana “a OCDE diz que não tem sentido a dupla penalização de pensionistas”.

Combate à corrupção: “Não há uma boa razão para recorrer a offshores”

A entrevista começou por assinalar o Dia Internacional contra a Corrupção e falar sobre o pacote de medidas agora promulgadas. Para Catarina, “há matérias em que se podia ter ido mais longe e outras que estão um pouco ao lado do que é necessário”. Por exemplo, “é incompreensível que possamos continuar a ter no Parlamento deputados que estão a uma hora a fazer uma lei e na hora seguinte na sua consultora financeira ou no seu escritório de advogados a ajudar as empresas a fugir aos impostos que acabaram de legislar”. Apesar da insistência do Bloco, onde “todos os deputados e deputadas estão em exclusividade“, a maioria do Parlamento preferiu manter este “conflito de interesses permanente”.

Além da necessidade de que “a Justiça e o Ministério Público tenham meios para atuar e que a Polícia Judiciária tenha meios de investigação”, Catarina sublinhou as propostas do Bloco para proibir transferências para offshores e impedir o Estado de contratar empresas sediadas nesses territórios.

“Não há uma boa razão para recorrer a offshores”, que servem apenas “para não pagar impostos e para fugir à lei”. Por isso, se “Portugal não pode acabar com os offshores no mundo”, deve pelo menos criar regras para “um sistema fiscal claro e transparente e que pode tratar da mesma forma quem ganha menos e quem ganha mais”.

Também a “floresta de benefícios fiscais opacos” está na mira do Bloco. Catarina Martins citou a intervenção de Ana Gomes numa sessão na véspera sobre o tema, em que a ex-eurodeputada do PS fazia as contas a 22 mil milhões de euros que saíram de Portugal em impostos não pagos nos últimos anos. "É mais do que o PRR, a famosa bazuca europeia”, apontou.

Transição energética, banca e Europa

Entre os outros temas abordados na entrevista, destacam-se as propostas que o Bloco apresenta para recuperar o controlo de setores estratégicos como o da energia. “Temos de fazer uma transição energética. Quando um Estado não tem nenhum poder sobre a sua energia, é complicado”, resumiu Catarina, avançando com a prioridade de trazer para o controlo público a central de despacho da REN que é o “coração do sistema”. No setor financeiro, Catarina defendeu que além do Novo Banco dever passar a ser um banco público, “todo o dinheiro que nós metemos nos bancos devia dar a capacidade ao Estado de pelo menos ser parte da decisão que esses bancos tomam, por exemplo impedindo que andassem a fazer com os fundos abutres imobiliários os despejos que fizeram e deixar tanta gente sem casa. Se já pagámos, devíamos usar esses imóveis para responder ao direito à habitação que é tão importante neste momento”.

Quanto à política europeia, Catarina insistiu que “o Tratado Orçamental é de tal forma errado que cada vez que há uma crise a UE o tem de suspender” e que “a posição um pouco subserviente do Governo português sobre a matéria não tem muito sentido”. Para a coordenadora do Bloco, Portugal devia fazer parte de “uma aliança com os países do sul da Europa que foram mais prejudicados com a crise financeira, que são vítimas de um euro que foi construído de forma assimétrica para que os países do sul fossem uma espécie de repositório de mão de obra barata da Europa”. Essa “aliança para mudar a Europa” seria mais benéfica ao país do que termos “governantes bons alunos que depois têm cargos europeus, mas que deixam Portugal na Europa muito fragilizado”.

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