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“Entre os tratados e os povos, escolhemos os povos”

No encerramento do encontro “Um Plano B para a Europa”, Catarina Martins afirmou que o Tratado de Lisboa trouxe “apenas imposição, cegueira e incapacidade de atuação”, e realçou a importância da luta "por maiorias sociais progressistas" capazes de transformar a Europa.
Sessão de encerramento do encontro da esquerda europeia “Um Plano B para a Europa”. Foto de Paulete Matos.

Decorreu este fim-de-semana, em Lisboa, o encontro da esquerda europeia “Um Plano B para a Europa”. A sessão final plenária, marcada para as 12h deste domingo, foi subordinada à questão “Para onde vamos agora? - Um plano B para a Europa”. A iniciativa contou com as intervenções da coordenadora do Bloco, Catarina Martins, de Eleonora Forenza, membro do Parlamento Europeu (L’Altra Europa - Itália), Marina Albiol, membro do Parlamento Europeu (Izquierda Unida – Estado Espanhol), Nicolas Galepides (SUD-PTT – Altersummit), Nikolaj Villumsen, membro do Parlamento Dinamarquês (Aliança Vermelha e Verde - Dinamarca), e Panagiotis Lafazanis, secretário-geral da Unidade Popular (Grécia).

"Tratado de Lisboa não trouxe nem capacidade de ação conjunta nem democracia"

Catarina Martins recordou que, há dez anos, “um abraço entre José Sócrates e Durão Barroso selava o Tratado de Lisboa com um ‘porreiro, pá’”: “Dez anos passados, concluímos que, para os povos, não foi porreiro, seguramente”.

“Rejeitamos os tratados europeus não por sermos contra a Europa”, mas porque é rasgando estes tratados que podemos “construir um caminho solidário em que possamos caber todos e todas

“Prometeram-nos há dez anos que o Tratado de Lisboa traria mais democracia. Dez anos depois, o que conhecemos são mais imposições sobre os povos, menos democracia, e a completa incapacidade de responder aos desafios – do Brexit, à situação na Catalunha, à crise dos refugiados, às alterações climáticas… O Tratado de Lisboa não trouxe nem capacidade de ação conjunta nem democracia ou capacidade de ouvir os povos. Trouxe apenas imposição, cegueira e incapacidade de atuação”, vincou a coordenadora bloquista.

“Rejeitamos os tratados europeus não por sermos contra a Europa”, mas porque é rasgando estes tratados que podemos “construir um caminho solidário em que possamos caber todos e todas, olhando-nos olhos nos olhos como iguais”, acrescentou Catarina Martins.

A dirigente do Bloco falou também sobre a necessidade de desmontar o cinismo e a hipocrisia “de quem diz, em cada país, que não pode responder aos povos porque há imposições europeias que não permitem, quando foram essas mesmas pessoas que firmaram esses mesmos tratados e os impuseram, e, em Portugal, sempre sem referendo”.

Catarina Martins frisou que a Esquerda que é Esquerda é feminista, luta contra o racismo e a xenofobia e acredita na fraternidade e na igualdade por inteiro, luta por estratégias que combatam as alterações climáticas, opõe-se ao dumping social e combate a ideia de um exército europeu, porque a militarização só acrescenta problemas.

A coordenadora referiu ainda a necessidade de “lutar por maiorias sociais progressistas em cada um dos nossos países para podermos transformar a Europa”.

Incêndios: "Precisamos de investimento público para prevenir novas tragédias”

No que respeita aos incêndios que atingiram Portugal, Catarina Martins afirmou que as medidas anunciadas este sábado, não obstante serem importantes, “são ainda insuficientes e, portanto, sabem que podem contar, da parte do Bloco, com uma vigilância atenta para o cumprimento das medidas que foram anunciadas e para uma exigência sempre presente para irmos a todos os temas a que ainda não chegámos, e a todas as urgências a que o nosso país ainda tem de responder”.

“Nada pode ficar na mesma”, vincou, adiantando que “não podemos ter tragédias destas a sucederem-se", e que o compromisso do Bloco "é para com a concretização concreta das mudanças anunciadas”.

Sobre os incêndios, Catarina Martins defendeu que o compromisso do Bloco "é para a concretização concreta das mudanças anunciadas”. Foto de Paulete Matos.

Sublinhando que “essa efetivação precisa, naturalmente, de meios”, a dirigente bloquista lembrou que “a Comissão Europeia já veio dizer, tão generosa que ela é, que podemos não ter os limites do défice para responder à tragédia”. “Mas precisamos mais do que isso. Precisamos de investimento público para prevenir novas tragédias”, alertou.

Catarina Martins sinalizou ainda que “há quem diga que temos de escolher entre a recuperação de pensões e salários ou responder àquilo que a tragédia nos exige”, salientando que o Bloco “sabe bem quais as escolhas que faz: Prosseguir com o caminho de recuperação de salários e pensões" e de "criação de emprego com direitos”, e, da mesma forma, “com todo o nosso esforço e determinação, alocar todos os meios necessários para prevenir novas tragédias e responder a todas as pessoas que foram afetadas”.

“E o nosso país pode fazê-lo. Porque somos um país de gente que trabalha e de gente que contribui. Porque temos contas públicas que dão lucro, a cada ano que passa, de mais de 5 mil milhões de euros. Tenhamos a coragem de dizer que o nosso povo merece um pouco mais do que o sistema financeiro e vos garanto que não faltam meios para responder”, apontou.

Catalunha: “O debate é democracia ou autoritarismo”

Marina Albiol, membro do Parlamento Europeu pela Izquierda Unida, começou a sua intervenção condenando o que aconteceu este sábado no Estado Espanhol: “um golpe, sem tanques nem militares, mas um golpe contra a democracia”.

Para a eurodeputada, “não está em causa o sim ou não à independência, o debate é sobre democracia ou autoritarismo”.

Não está em causa o sim ou não à independência, o debate é sobre democracia ou autoritarismo

Defendendo que “a Catalunha tem de ser o que o povo decidir”, Albiol frisou que estamos perante um regime herdado do franquismo, e teceu críticas à “monarquia espanhola corrupta, antidemocrática anacrónica”, às “instituições podres de corrupção”, ao “sistema económico que gera desemprego e pobreza” e ao “sistema territorial que não dá resposta às aspirações de milhões de pessoas”. A representante da Izquierda Unida acusou o Partido Popular e o Partido Socialista de quererem “recuperar e reconstruir esse sistema com violência e repressão”.

“Face à violência, respondemos com democracia”, frisou, assinalando que o regime de 78 tem de chegar ao fim de uma vez, para dar lugar a uma República Federal.

Para Albiol, “a UE é o projeto político do capitalismo para a Europa”. Um projeto que não é reformável”, porque foi “pensado desde o princípio para manter os privilégios de uns poucos”. A eurodeputada frisou que temos partidos tradicionais que não são resposta e assumem, inclusive, discursos populistas e xenófobos, sendo que “a esquerda tem de oferecer uma alternativa com força”, tem de “canalizar a indignação e dar-lhe forma, caso contrário, “abrimos lugar à extrema-direita”.

 “Há alternativa para a Grécia e para outros países fora da Zona Euro”

Panagiotis Lafazanis, líder da Unidade Popular (Grécia), defendeu que a Zona Euro é “uma prisão numismática”, que assegura os interesses dos ricos contra a maioria social. O ex ministro da Reconstrução Produtiva, do Ambiente e da Energia do governo do Syriza frisou que “o Euro não é uma moeda neutra”, é “o programa neoliberal”, que assegura o poder alemão.

“Se queremos pensar o que é a Europa e a UE temos de olhar o caso grego”, afirmou Lafazanis, defendendo que, se a Grécia não estivesse na Zona Euro, não teria entrado na bancarrota.

Marina Albiol, membro do Parlamento Europeu (Izquierda Unida – Estado Espanhol), e Panagiotis Lafazanis, secretário-geral da Unidade Popular (Grécia). Foto de Paulete Matos.

Assinalando que a Grécia vive uma “tutoria de ocupação”, um “regime de colonialismo sem fim”, o líder da Unidade Popular lamentou que os governos gregos, que foram eleitos contra os memorandos”, tenham, “todos eles, e debaixo da chantagem, seguido o mesmo caminho – o dos memorandos”.

“Há alternativa para a Grécia e para outros países fora da Zona Euro”, vincou Lafazanis, avançando que a moeda nacional é uma “ferramenta essencial para conseguir um programa radical”.

“A Europa pode existir e ter esperança, mas a Zona Euro tem de ficar no passado”, reforçou.

“É preciso construir um novo projeto europeu, baseado na soberania popular”

Na imagem (esq. para a dir.): Nicolas Galepides (SUD-PTT – Altersummit), Eleonora Forenza, membro do Parlamento Europeu (L’Altra Europa - Itália) e Nikolaj Villumsen, membro do Parlamento Dinamarquês (Aliança Vermelha e Verde - Dinamarca). Foto de Paulete Matos.

Eleonora Forenza, membro do Parlamento Europeu pela força política italiana L’Altra Europa, propôs “uma palavra-chave para o Plano B: autodeterminação”: Autodeterminação para o povo da Catalunha, “alvo de um golpe de Estado”, autodeterminação para as mulheres, que continuam a sofrer todo o tipo de violência, e autodeterminação “para os migrantes que estão a perder as suas vidas no Mediterrâneo”.

Segundo Eleonora Forenza, “o projeto da União Europeia foi assumido pelas classes dominantes contra o povo”, sendo que “é preciso romper esta UE e construir um novo projeto europeu, baseado na soberania popular”.

Para tal, o Plano B deve escolher as suas alianças, que não passam pelos socais democratas, “responsáveis pelas políticas austeritárias”.

“Queremos uma Europa de democracia. Não uma Europa de chantagem e repressão”

Nikolaj Villumsen, membro do Parlamento Dinamarquês, da força política Aliança Vermelha e Verde, falou sobre as crises que abalam a Europa: a crise social, com desigualdades crescentes, a crise climática, e a crise democrática, com “as decisões que afetam as vidas dos europeus a serem tomadas por banqueiros e burocratas que ninguém elegeu”.

Estamos unidos numa luta comum pelos direitos sociais, pela proteção do ambiente e pelos direitos democráticos dos povos

“Estamos unidos numa luta comum pelos direitos sociais, pela proteção do ambiente e pelos direitos democráticos dos povos”, frisou Nikolaj Villumsen, vincando ainda que “a estrutura neoliberal e não democrática da UE impede uma mudança progressista”.

Fazendo referência à situação na Grécia e na Catalunha, o deputado dinamarquês afirmou que “queremos uma Europa de democracia. Não uma Europa de chantagem e repressão. Essa é a mensagem clara do Plano B”.

É preciso “equilibrar a balança”

Nicolas Galepides, do sindicato SUD-PTT e da Altersummit, explicou que a Altersummit é um processo que começou em 2013, em Atenas, e “que trouxe ideias muito simples”: “É, na verdade, um manifesto pela refundação baseada nos princípios da solidariedade e da igualdade por toda a Europa”.

Galepides falou sobre os desafios com que nos confrontamos atualmente, como a transição ecológica, e também sobre a necessidade de nos dirigirmos a setores da população como os jovens e os migrantes.

“Temos de nos unir para fazer equilibrar a balança”, alertou.

Portugal Left News transmitiu em direto no facebook o encerramento do encontro do Plano B:

 

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