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Diretor em exclusividade da Nova SBE ganha 143 mil euros no Santander

A notícia, avançada pelo Diário de Notícias, revela que Daniel Traça é simultaneamente diretor em exclusividade da faculdade de Economia da Universidade Nova e, simultaneamente, é administrador do Banco Santander, com a permissão do Reitor. E não é caso único de conflito de interesses.
Biblioteca do campus de Carcavelos da Nova SBE, via https://www2.novasbe.unl.pt/pt/
Biblioteca do campus de Carcavelos da Nova SBE, via https://www2.novasbe.unl.pt/pt/

Daniel Traça, professor catedrático e diretor da faculdade Nova SBE, é também vogal do conselho de administração do Banco Santander, bem como da Comissão de Auditoria, do Comité de Riscos e do Comité de Remunerações, e ainda presidente do Comité de Nomeações do banco, auferindo um salário de 143 mil euros, noticia o jornal Diário de Notícias.

Apesar do Estatuto da Universidade Nova de Lisboa deixar claro no artigo 43.º que “o cargo de diretor é exercido em regime de dedicação exclusiva, sem prejuízo dos cargos que exerça por inerência”, a faculdade confirmou ao jornal que “após pedido de pareceres jurídicos e do Conselho de Ética da Universidade e tendo sido salvaguardada a não conflitualidade de interesses”, a acumulação dos cargos foi aprovada pelo Reitor da Universidade, não sendo claro que salvaguardas permitem estabelecer a não conflitualidade.  

E não é o único caso. Segundo o trabalho desenvolvido pela jornalista Fernanda Câncio, no Diário de Notícias, a ausência de limites, controlo ou transparência na relação da faculdade com os seus parceiros privados é um problema transversal à instituição, há muito diagnosticado, que continua por resolver.

Apesar do financiamento privado da Nova SBE corresponder a apenas 9% do seu orçamento - o bolo principal de 54% é proveniente de propinas, 23% do Orçamento do Estado, 14% de financiamento público para investigação -, a sua influência parece ser estrutural à instituição, resultando numa cultura sem fronteiras éticas entre o interesse público e o interesse empresarial.

Miguel Ferreira, professor com a cátedra do BPI e presidente do conselho científico da faculdade, foi um dos autores de um estudo da EDP que concluiu que não existia

favorecimento nos contratos de energia (resultando numa investigação do Ministério Público à Nova SBE), e é a a estrela de um conjunto de vídeos publicitários para promoção de produtos de crédito do BPI nas redes sociais, onde se apresentava como professor de finanças da Nova SBE. Nos vídeos publicados nas contas oficiais do BPI, ainda hoje disponíveis, Miguel Ferreira dá conselhos, por exemplo, sobre “como posso proteger-me de uma subida das taxas de juro, ao contratar um crédito à habitação?”

Mas o problema começa nos próprios contratos de cátedra, que definem o financiamento das empresas à faculdade em troca da utilização do nome desta por parte das empresas, e que não são públicos. O Diário de Notícias solicitou estes contratos à Nova SBE mas não obteve qualquer resposta ou justificação para permanecerem secretos. Questionado pelo jornal, também não respondeu sobre “se acreditava que as disposições e orientações existentes para acautelar eventuais conflitos de interesses eram as suficientes ou que seria preciso clarificar normas éticas, assim como sobre se o tipo de colaboração de académicos com empresas exemplificado no caso de Miguel Ferreira, implicando a utilização da respetiva imagem e do nome da universidade, tinha de ser objeto de algum pedido de autorização ou alguma comunicação superior, com análise dos conteúdos e, caso afirmativo, quem tinha autorizado a colaboração”.

Em abril de 2019, a direção da faculdade indicou ao Diário de Notícias que, eventuais conflitos de interesses “são auscultados no Conselho de Ética da Nova SBE”. Sucede que, segundo confirmou o jornal, este órgão simplesmente não existe nem nunca existiu.

Nenhum destes problemas de conflitos de interesses claros suscitou, até hoje, a publicação de qualquer código de ética, comissão ou orientação pública que esclareça as relações da faculdade e dos seus professores com as empresas. No entanto, parece ter sido a tentativa de censurar as opiniões publicadas por uma das suas docentes no jornal Público, Susana Peralta, num caso noticiado pela revista Sábado, que despoletou esta quarta-feira o anúncio do Reitor - o catedrático João Sáàgua -, para a criação de uma comissão independente para avaliar as relações da faculdade com as empresas. A preocupação, contudo, parece ser a de garantir o apoio continuado destas, com o Reitor a garantir que a comissão será “uma forma de reforçar ainda mais a transparência das relações entre a escola pública e a esfera privada”.

 
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