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Dezenas de refugiados acolhidos por Portugal não conseguem renovar documentos

“Se não há condições, porque nos acolheram?” é o que perguntam 28 das 37 pessoas resgatadas no Mediterrâneo e acolhidas por entidades com parcerias com a Câmara de Lisboa que viram os seus documentos caducar e continuam sem resposta do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
O Conselho Português de Refugiados é uma das instituições que acolhem e acompanham os processos dos refugiados em Portugal. Foto João Relvas/Lusa

A reportagem publicada este sábado no jornal Público dá conta da ansiedade em que vivem dezenas de refugiados acolhidos no nosso país ao abrigo de acordos com as Nações Unidas ou em situações de emergência como as dos navios Aquarius ou Ocean Viking.

Após a chegada a Portugal, estes refugiados têm de requerer o Pedido de Proteção Internacional, com validade de dois meses. Segue-se a Autorização de Residência Provisória (ARP) na fase de requerimento de asilo, documento que permite a celebração de contrato de trabalho ou arrendamento ou a abertura de conta bancária. Segundo o gabinete do vereador bloquista Manuel Grilo, responsável pelo pelouro da Educação e Direitos Sociais na Câmara de Lisboa, dos 28 refugiados sem documentos válidos, dez aguardam a primeira ARP e outros 18 já viram esse documento caducar e aguardam ainda pela renovação.

Embora o programa de acolhimento preveja um período de 18 meses até à decisão de conceder estatuto de refugiado ou proteção subsidiária, há muitos refugiados impedidos de trabalhar legalmente ou arrendar casa por falta de documentos. No Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, dizem-lhes para esperar.

Francisca Barreiros, da Associação Crescer, diz ao Público que o que está a acontecer é “uma desresponsabilização do Estado para com a sociedade civil”. Do lado dos refugiados, na maior parte em fuga dos conflitos armados nas regiões onde viviam, como o maliano de 19 anos Mahamadou Bembélé, “trabalhar é urgente para mandar dinheiro” para a família que antes sustentava com trabalho no campo.

Mas não é só a falta de documentos para procurar casa ou emprego que atinge estas pessoas. O Serviço Jesuíta de Apoio aos Refugiados diz que há casos de refugiados que deixaram de ter isenção das taxas moderadoras nos serviços de saúde por falta de documentos.

“Sentimos que existe essa abertura para acolher pessoas, mas que a partir do momento em que estão entregues às entidades acolhedoras, o Estado central não garante os direitos das pessoas ao longo dos 18 meses” do processo de acolhimento, disse ao Público Joana Teixeira, do gabinete do vereador Manuel Grilo. “Então se não há condições, por que nos acolheram?”, perguntam estas dezenas de refugiados nas reuniões trimestrais com os serviços da Câmara, fartos de serem “chutados de serviço em serviço, de instituição em instituição”, acrescenta. Francisca Barreiros confirma este sentimento de revolta e diz que até há refugiados a pedir “que o Estado português lhes passe um papel a dizer que não os pode acolher”.

Apesar de não garantir documentos válidos aos refugiados que acolhe, e dessa forma dificultando bastante a vida dessas pessoas num novo país, o Estado português não parece muito preocupado com esta situação. Contactado pelo Público, o gabinete do ministro da Administração Interna Eduardo Cabrita diz que todos os requerentes de proteção internacional, “independentemente da fase em que se encontra o seu processo, estão sempre em situação regular em Portugal”. O SEF alinha pelo mesmo argumento: “durante a instrução processual, o requerente nunca se encontra em situação irregular”, respondeu ao Público, indiferente aos problemas que a ausência de documentos válidos levanta no dia a dia destes refugiados que querem recomeçar a vida no país que os acolheu.

 

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