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As crianças iemenitas morrem de fome por crimes cometidos em nosso nome

O nosso silêncio contínuo dá carta branca ao governo britânico para manter o seu sórdido apoio ao ataque saudita contra os civis e os direitos humanos. Por Owen Jones
Um menino carrega um pedaço de explosivo de artilharia na vila de Al Mahjar, um subúrbio de Saná, capital do Iémene. Foto: UNICEF / Mohamed Hamoud
Um menino carrega um pedaço de explosivo de artilharia na vila de Al Mahjar, um subúrbio de Saná, capital do Iémene. Foto: UNICEF / Mohamed Hamoud

É possivelmente a casa mais cara do mundo: uma mansão francesa com estátuas de mármore e “jardins com cerca de 30 hectares” avaliada em mais de 300 milhões de dólares foi arrebatada pelo herdeiro do trono saudita. O príncipe herdeiro Mohammed bin Salman está num verdadeiro frenesim de compras: um iate de 500 milhões de dólares aqui, um quadro de Leonardo da Vinci de 450 milhões de dólares ali. Enquanto este déspota se cobre de um luxo decadente, as crianças do Iémene morrem de fome e as bombas sauditas - muitas fornecidas com a cortesia do governo britânico - destroem o país.

É um dos maiores crimes na Terra, por isso é bem-vinda a notícia de que, hoje, 350 pessoas de reconhecido perfil – entre laureados com o prémio Nobel da Paz e celebridades – tenham assinado uma carta a exigir aos líderes da França, dos EUA e do Reino Unido: parem de “alimentar as chamas da guerra”. O bárbaro regime saudita está ser armado e apoiado pelo Ocidente, enquanto esmaga o Iémene.

Os nossos governos partilham a responsabilidade pelos 60.000 mortos na guerra dos 1.000 dias, pelos 17,8 milhões de pessoas sem acesso à alimentação necessária, e pelos 22 milhões que precisam de ajuda humanitária e de proteção. Estima-se que quase um terço dos ataques aéreos levados a cabo pelos sauditas tiveram alvos não militares: tais como quintas, mercados e armazéns de alimentos. Num ataque aéreo saudita recente, doze mulheres foram mortas quando regressavam a casa, após uma cerimónia de casamento. Estes são crimes que não aparecem nas notícias - mas que não podemos ignorar, porque estão a ser cometidos em nosso nome.

Os nossos governos partilham a responsabilidade pelos 60.000 mortos (link is external) na guerra dos 1.000 dias, pelos 17,8 milhões de pessoas sem acesso à alimentação necessária, e pelos 22 milhões que precisam de ajuda humanitária e de proteção

O governo conservador ofereceu a soma irrisória de 50 milhões de libras de ajuda para comida e abastecimento de combustível: é como pegar fogo à casa dos vizinhos, e depois deixar uma nota de dez dólares na caixa do correio carbonizada.

Até Samantha Power - a anterior embaixadora de Barack Obama para a ONU – admitiu que os EUA estão “errados (tal como nós estávamos na anterior administração) ao continuar a apoiar a coligação liderada pelos sauditas, uma vez que ela mata civis com impunidade e bloqueia o fornecimento de medicamentos, alimentos e combustíveis, apesar da fome galopante.

È um pouco tarde para admitir a culpa, e Obama devia estar perturbado pelo horror que ajudou a libertar. Mas esta confissão sublinha certamente a catástrofe que a guerra Saudita apoiada pelo Ocidente representa.

Depois de ter escrito sobre o pesadelo do Iémene, e de ter visitado um campo de refugiados no Djibouti, no outro lado do mar, é profundamente desanimador quão ignorada esta situação permanece. O nosso silêncio contínuo dá carta branca ao governo britânico para manter o seu sórdido apoio ao ataque saudita contra os civis e os direitos humanos. As crianças continuam a passar fome em silêncio , os civis continuam a morrer silenciosamente sob as bombas fornecidas pelos britânicos. É certamente tempo de denunciarmos o que está a ser feito em nosso nome.

Artigo de Owen Jones, publicado em “The Guardian” a 19 de dezembro de 2017. Tradução de Javier Biosca Azcoiti para espanhol, publicado em eldiario.es em 23 de dezembro de 2017

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