A continuidade do golpe nas eleições do Brasil: A direita irá aceitar o resultado caso perca?

27 de setembro 2018 - 12:12
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É verdade, não presenciamos no Brasil um ambiente de normalidade democrática como muitos se esforçam em pintar no país e no exterior. Por Dmitri Felix do Nascimento.

Foto publicada na página do Facebook do candidato Fernando Haddad.

É verdade, não presenciamos no Brasil um ambiente de normalidade democrática como muitos se esforçam em pintar no país e no exterior. A campanha eleitoral que terá o primeiro turno em Outubro/2018, já demonstra que a insatisfação e os pesadelos dominam o (in)consciente popular.

A primeira fase do Golpe Jurídico-Parlamentar-Midiático de abril de 2016 capitaneada pelos setores partidários da direita brasileira como o MDB do então vice-presidente Michel Temer e ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha(preso), o PSDB de Fernando Henrique Cardoso, Aécio Neves (que deveria estar preso) e Geraldo Alkmin (candidato e fiador do Governo Temer), juntamente com a mídia monopolista (Globo, Folha de São Paulo e Estadão), empresariado das Federações Industriais (FIESP) e setores do judiciário( Operação Lava-Jato) deram início ao ciclo dos desastres cotidianos que vivenciamos, após aquelas cenas obscenas do Congresso Nacional na votação do impedimento de Dilma Rousseff (PT).

A segunda fase, nos faz lembrar os economistas neoliberais Milton Friedman e Friedrich Hayek. Estes ficariam surpresos com a velocidade com que o governo Temer (PMDB)/Alkmin (PSDB) conseguiu fazer as contra-reformas de maneira tão rápida e agressiva. Cortes drásticos no orçamento de programas fundamentais para a maioria da população como saúde, educação, seguro desemprego, acesso a alimentação e investimento na geração de trabalho e renda, isto feito num espaço tão curto de tempo. A Emenda Constitucional que congelou por 20 anos os investimentos sociais, nem a Troika na União Europeia poderia imaginar um programa tão “austero”. Vivemos a plenitude da Doutrina do Choque descrita pela jornalista Naomi Klein.

Com uma popularidade beirando a zero, o governo Temer apela a medidas mais duras. Sem ter apoio no Congresso nacional para aprovar a reforma previdenciária, o governo para não cair propagou o medo (estratégia já bastante conhecida), e por desespero e oportunismo adotou a medida de Intervenção Federal/Militar no Rio de Janeiro. Buscou recursos extras no orçamento e colocou as tropas do exército nas ruas e morros numa guerra sem ganhadores contra o tráfico de drogas. Com isto abriu as portas para os militares no primeiro escalão do governo. Esta medida também engessou o Congresso Nacional, pois sob Intervenção não é possível aprovar qualquer Emenda Constitucional. Ainda bem.

O Brasil de hoje possui 13 milhões de desempregados, 37 milhões sem carteira assinada e 65 milhões que nem trabalham e nem procuram emprego. Um real desastre bem diferente daquela propagandeada quando Temer assumiu: “Não pense em crise, Trabalhe!”. Após a Reforma Trabalhista que criou sub categorias de contratação e remuneração, precarizando o trabalho e destruindo os mecanismos jurídicos de proteção e fiscalização da Justiça do Trabalho. O serviço para o empresariado industrial, do comércio e pro sistema financeiro já estava feito, reforçado com o perdão das dívidas milionárias que deviam ao Estado.

Começado o período eleitoral e ninguém mais quer saber do desgoverno Temer, muito menos os seus aliados. O cenário permanece incerto e algo de pior poderá surgir.

A terceira fase do golpe tem como objetivo barrar a candidatura do candidato Lula da Silva (PT). Mesmo preso, permanece em primeiro lugar em todas as pesquisas, o judiciário brasileiro (em especial a Lava-Jato e o STF) obedece aos ditames da elite do país que range os dentes para que Lula permaneça preso ad infinitum. Setores das Forças Armadas se expressam cotidianamente no melhor estilo Donald Trump por meio do Twiter destilando palavras de ordens em defesa da “moral e princípios da pátria” com o intuito que Lula permaneça preso.

Enquanto isso, boa parte dos brasileiros e eleitorados ficam se perguntando se existe alguma prova (até agora nenhuma apresentada) sobre os supostos crimes de Lula de possuir um apartamento ou não. O eleitorado com o andamento das pesquisas coloca o candidato do PT, Fernando Haddad ex-prefeito de São Paulo, no segundo turno e com grandes chances de vencer Bolsonazi, provando a migração dos votos que seriam de Lula. O PT e Haddad entram nas eleições recuados após o bombardeamento midiático constante alimentando o anti-petismo, mas também de programa político, onde dificilmente se observa o ímpeto de realizar alguma reforma estrutural para o país.

No plano internacional é visível a diminuição do papel do Brasil. Com um Mercosul fragilizado juntamente com a Argentina, falta de priorização nos BRICS, incapacidade de dialogar com a Venezuela sobre os problemas da migração, e negação da determinação do Comitê dos Direitos Humanos da ONU em acolher a candidatura de Lula, torna o país cada vez mais excluído das decisões e fóruns que um dia participou.

A esquerda vem com a candidatura Guilherme Boulos (PSOL) psicanalista, líder do Movimento do Trabalhadores Sem-Teto e escritor como a expressão dos setores que mais sofreram com o desmonte dos direitos sociais e trabalhistas, dos que foram jogados na informalidade, dos que perderam seus trabalhos e dos que não tem condições de pagar um arrendamento. Mesmo pontuando timidamente nas pesquisas, a campanha vai se afirmando na plataforma de taxação das grandes fortunas e no combate aos privilégios. Uma esperança que se semeia após o trágico assassinato, onde tudo indica por policiais e milicianos, da Vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson. Caso ainda não finalizado e com indícios de queima de arquivo por parte da milícia.

A nova fase do golpe está a surgir. O maior perigo da frágil democracia brasileira vêm daquele que exalta o período da ditadura militar (1964-1985), faz apologia a tortura, processado por incentivar o estupro e racismo, o candidato que pula de partido em partido por 30 anos, o deputado federal Jair Bolsonaro (Bolsonazi nas redes sociais).

Com uma plataforma pautada no medo, na violência num país que já sofre com mais de 63.000 assassinatos por ano), na exclusão, na perca de direitos por parte dos trabalhadores, e na privatização do que restou das empresas públicas, o candidato de extrema direita indicou o general aposentado Hamilton Mourão como vice. Na mesma linha do Bolsonaro (Bolsonazi) o general dissemina a inferioridade racial brasileira proveniente de negros, índios e portugueses (ops!) como principal causa de nosso atraso civilizacional. Darcy Ribeiro (Autor de “O Povo Brasileiro”) teria outro ataque do coração se estivesse em vida caso ouvisse estas aberrações.

Com palavras de ordem de forte impacto na mentalidade conservadora de diferentes frações sociais, principalmente religiosos evangélicos e parte da classe média, o discurso anti-comunista, anti-direitos-humanos, anti-aborto, anti-feminista, homofóbico, pró armamento e pena de morte seduz um eleitorado que se aliena por soluções rápidas e impactantes. Esta é a campanha mais militarizada dos últimos tempos, com diversos candidatos das Policias Militares e Forças Armadas.

Porém o principal objetivo do candidato de extrema direita nesta etapa é conquistar os mercados. Com palavras prontas “menos direitos e mais emprego” o empresariado industrial e financeiro começa a ver esta como uma boa oportunidade de maximizar seus negócios com um governo duro contra sindicatos e movimentos sociais e dócil para a iniciativa privada.
Colocado este quadro de plena instabilidade, a pergunta fica em aberto, caso Bolsonaro (Bolsonazi) for para o 2º turno a extrema direita aceitará a derrota?

Tudo indica que não. O vice de Bolsonazi, o General Mourão, já se pronunciou que as urnas eletrónicas serão avaliadas pelos técnicos do Exército e a possibilidade de um auto golpe pelo presidente eleito. Outro general reformado, Augusto Heleno, da equipe do candidato deu entrevista colocando em causa a legitimidade das eleições e do futuro presidente, excluindo o seu próprio logicamente.  O grande empresariado e a mídia hegemônica se utilizam de todos os meios para que a centro-esquerda não volte a Presidência da República. Se esforçam com as chantagens usuais mais grosseiras de quebradeira do mercado e propagam a censura televisiva dos debates seletivos. A avalanche conservadora brasileira não se conteve em passar estes últimos 2 anos no poder, eles querem agora o controle total sem oposição, e estão muito bem alinhados com as esferas do judiciário, setor financeiro e do agronegócio. Um novo Reichstag é possível e provável.

Um novo fascismo nos trópicos se desenha, mas se manter no poder no Brasil é preciso mais do que discurso. É preciso força, mas nem todas as vezes a força bruta prevalece. Pode ser decisiva, mesmo que ilegítima.

Como dizia Talleyrand a Napoleão: “as baionetas servem para muitas coisas, menos para se sentar encima delas”.


Artigo de Dmitri Felix do Nascimento, Ativista e Historiador