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Contestação ao modelo de gestão e aos mega-agrupamentos de escolas acabou silenciada

Tal modelo de gestão de mega-agrupamentos, que deixou “vazios” orgânicos em algumas unidades escolares, como escolas básicas do 2.º e 3.º ciclo, foi lamentavelmente desvalorizado e assim deixado tal como foi imposto. Texto de José Carlos Lopes.
“O reordenamento da rede de escolas públicas veio pôr fim ao órgão de gestão colegial democrático, evoluindo posteriormente para a organização de agrupamentos verticais, até ser instalada a instabilidade provocada pelos mega-agrupamentos”
“O reordenamento da rede de escolas públicas veio pôr fim ao órgão de gestão colegial democrático, evoluindo posteriormente para a organização de agrupamentos verticais, até ser instalada a instabilidade provocada pelos mega-agrupamentos”

O reordenamento da rede de escolas públicas que resultou do Decreto-Lei n.º 115-A/98 e que definiu o “Regime de Autonomia, Administração e Gestão dos estabelecimentos de ensino públicos de educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário”, em nome de mais autonomia, veio pôr fim ao órgão de gestão colegial democrático, substituído pelo unipessoal de Diretor, para a gestão da nova realidade então desenvolvida, da generalização de agrupamentos horizontais (reunindo escolas do Pré-Escolar e 1.º Ciclo), evoluindo posteriormente para a organização de agrupamentos verticais ao reunir também as escolas EB do 2.º e 3.º ciclos, em que o espírito de proximidade ainda foi suportável e minimamente coerente para as diferentes comunidades ao nível destes ciclos básicos, até ser instalada a instabilidade provocada pelos mega-agrupamentos nas comunidades que assumiram o seu exercício de cidadania.

Com os novos órgãos de gestão a consolidarem as suas competências, mesmo as “ilusórias” e pouco consequentes, ainda que definidas como de “gestão estratégica” a exemplo dos conselhos gerais. Só mesmo aquando da criação de mega-agrupamentos no âmbito do Decreto-Lei 75/2008, que agregaram também aos verticais as escolas secundárias para se tornarem privilegiadamente sede de serviços centralizados e prioridade aos seus diretores na gestão destes novos agrupamentos, despertaram focos de contestação das comunidades escolares e educativas, que depararam com a imposição dos vários governos à revelia de muitas das comunidades escolares e educativas, vítimas de tais políticas economicistas e centralistas, cujos resultados mais evidentes foram redução de custos com profissionais da educação, em que nomeadamente os docentes foram transformados em trabalhadores polivalentes e burocratas da era digital, desvalorizados numa missão que se exige mais dignificante.

Sem confirmados resultados pedagógicos relevantes desde logo na articulação de ciclos ao fim de quase duas décadas, as agregações megalómanas também não trouxeram “mais-valia” às próprias escolas secundárias, em que, mesmo custando naturalmente reconhecer, são notórias as consequências desta caminhada agregadora sem critérios convincentes, que se pode agravar com âmbitos ainda mais centralizadores no âmbito dos municípios, ao contrário de práticas de maior proximidade exercidas em países no Norte da Europa, que vêm servindo de referência na educação.

Tal modelo de gestão de mega-agrupamentos, que deixou “vazios” orgânicos em algumas unidades escolares, como escolas básicas do 2.º e 3.º ciclo, foi lamentavelmente desvalorizado e assim deixado tal como foi imposto, sem qualquer tentativa de o resgatar para uma efetiva eficiência e verdadeira autonomia da escola pública, que seria possível conquistar com justiça, nesta legislatura suportada à esquerda, e que agora chega ao fim de mandato, sem repor a gestão democrática nem desarticular mega-agrupamentos que até hoje, não reúnem consenso junto das suas comunidades escolares e educativas. Tal é a sua descaraterização, que nem critérios apontados na Lei, como, “construção de percursos escolares integrados”, ou “articulação curricular entre níveis e ciclos educativos”, refletem resultados assim tão animadores para justificar que este modelo tenha ficado intocável pela maioria política que suporta o atual governo.

Prevaleceram silêncios comprometedores depois de vários períodos de contestação que marcaram várias comunidades escolares, assim como o movimento associativo de pais, sindicatos, municípios ou os partidos, ainda que, com posicionamentos políticos em função da sua condição de governo ou oposição, durante as várias legislaturas em que decorreram as fases de reorganização da rede escolar no país. Foram momentos de resistência vividos em alguns dos conselhos gerais que acabaram fundidos em “megas”, e silenciados pela falta de diálogo com as comunidades escolares, particularmente no período mais afrontoso como foi o alargamento dos agrupamentos às escolas secundárias na governação de direita com a tutela de Nuno Crato na Educação. Contestação que o tempo deixou em silêncio, sacrificando a reposição da gestão democrática nas escolas agrupadas e não agrupadas.

Texto de José Carlos Lopes, de Ovar

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