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Cessar-fogo no Curdistão Sírio: negociado, violado e à espera da Rússia

Mike Pence voou para Ankara e saiu de lá com um cessar-fogo. A Turquia concordou suspender ofensiva para os curdos retirarem da zona que quer ocupar. Os curdos concordam em não atacar mas o cessar-fogo já foi violado e só funciona se governo sírio e Rússia concordarem.
Combatente curdo do YPG. Outubro de 2014.
Combatente curdo do YPG. Outubro de 2014. Foto de Kurdishstruggle/Flickr.

Incidente isolado ou reinício das hostilidades, será cedo para dizer. Depois do vice-presidente norte-americano, Mike Pence, e do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, terem divulgado um acordo de cessar-fogo, não demorou muito até as marcas da guerra voltarem ao Curdistão Sírio.

Esta sexta-feira de manhã, Ras al-Ayn e os seus arredores foram alvo de bombardeamentos e ouviram-se tiroteios. No resto da zona fronteiriça entre Turquia e Curdistão Sírio a paz parece reinar.

O acordo anunciado na véspera só parece ser um negócio vantajoso para os turcos. Implica um cessar-fogo de cinco dias apenas para que as forças curdas abram caminho para a invasão turca. Na verdade, a ofensiva turca já alcançou parte significativa do seu objetivo de estabelecer uma zona de ocupação de 100 quilómetros ao longo da fronteira. Ras al-Ayn, onde os confrontos desta sexta-feira aconteceram, é uma das pedras no sapato de Erdogan. Kobani é outro ponto de tensão.

Do lado curdo, os sinais são contraditórios. Um dos comandantes das forças militares curdas, Mazloum Abdi, em declarações à televisão curda Ronahi TV imediatamente a seguir ao anúncio do cessar-fogo, assegurou: “faremos o que quer que possamos para o sucesso do acordo de cessar-fogo.” Mas outro dirigente curdo, Razan Hiddo, tratou de esclarecer que os curdos se recusarão a viver sob ocupação turca.

Para que o acordo se mantenha, seria, portanto, necessária a retirada das zonas ainda sob controlo dos curdos. Para além disso, será preciso o acordo dos outros atores do conflito. A seguir a Trump ter ordenado a retirado dos militares norte-americanos, deixando o caminho aberto para que os turcos entrassem na Síria, as forças curdas sírias viram-se obrigadas a entrar em acordo com o regime sírio e os seus aliados russos que avançaram no terreno. Ambos insistem em defender a integralidade territorial da Síria, o que dificulta os planos turcos de consolidar uma zona controlada por si no país vizinho.

Ainda na quinta-feira, a agência noticiosa RIA Novosti divulgou uma posição cuidadosa do governo russo através das declarações do porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, que disse estar “à espera de receber mais informações da Turquia”. E, para a próxima terça-feira, está marcado um encontro entre os chefes de Estado dos dois países que poderá ser decisivo. Turquia e Rússia têm mantido boas relações. Putin joga assim em vários lados tabuleiros, impondo-se como decisivo para qualquer resolução do conflito. E, ao contrário de Trump, as suas peças estão bem colocadas e prontas a avançar.

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