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Agricultura e pecuárias intensivas degradam qualidade das águas subterrâneas

Pelo menos 55 dos 62 sistemas aquíferos existentes em Portugal continental estão contaminados. A associação ambiental ZERO exige medidas imediatas e o fim da subsidiação às práticas agrícolas e pecuárias insustentáveis.
24 sistemas aquíferos possuem amostras que excedem os valores máximos admissíveis para os nitratos, correspondendo a 42% do total dos aquíferos analisados. Foto de Paulete Matos.

Ao analisar os dados referentes à presença de azoto amoniacal e de nitratos nas águas subterrâneas, entre os anos 2011 e 2015, com base na informação disponibilizada pela Agência Portuguesa do Ambiente, a ZERO constatou “uma situação preocupante, com registo de poluição na totalidade dos 55 sistemas aquíferos com dados disponíveis”.

Em comunicado, a associação alerta que a “poluição generalizada é a norma” e que a mesma “pode colocar em causa a utilização atual e futura” da água existente nos 62 sistemas aquíferos de Portugal continental, comprometendo um recurso “essencial para prevenir os riscos cada vez mais evidentes e recorrentes de escassez hídrica - como aquela que estamos a assistir neste ano e que tenderão a agravar-se com os efeitos das alterações climáticas”.

A ZERO salienta ainda que “existiam, em 2015, 6.016 captações de água subterrânea responsáveis por abastecer 33% do volume total de água potável consumido em Portugal Continental (ERSAR, 2015), e que muitos dos pontos de água poluídos coincidem com pontos de abastecimento público”.

Da análise aos dados disponíveis, a associação ambiental pôde concluir que 46 sistemas aquíferos estão poluídos com azoto amoniacal, que chega aos solos pelas descargas da indústria pecuária ou pelo uso de estrume.

29 sistemas aquíferos apresentam poluição por nitratos, que podem inviabilizar a utilização da água, nomeadamente para consumo humano

Já 29 sistemas aquíferos apresentam poluição por nitratos, que provêm dos fertilizantes agrícolas e podem inviabilizar a utilização da água, nomeadamente para consumo humano.

A ZERO recorda que existe legislação dedicada especificamente para prevenir a poluição dos recursos hídricos, contudo, assinala que “24 sistemas aquíferos possuem amostras que excedem os valores máximos admissíveis para os nitratos (50 miligramas/litro), correspondendo a 42% do total dos aquíferos analisados”.

Apesar de terem sido definidas 9 zonas vulneráveisi à poluição por nitratos, e ter sido aprovado um programa de ação para as mesmas em 2012, a situação tem vindo a agravar-se nos últimos anos, existindo “um quadro de descontrolo total”.

Acresce que, conforme enfatiza a associação ambiental, “existem aquíferos, não designados ou incluídos em zonas vulneráveis, que apresentam já dados preocupantes, com excedências recorrentes ao valor máximo admissível, o que poderá mesmo obrigar à definição de novas zonas ou à ampliação das existentesii.

A ZERO refere ainda que “será também necessário e urgente conhecer o estado atual dos sistemas aquíferos para os quais não existem dados disponíveis”.

Fim da subsidiação às práticas agrícolas e pecuárias insustentáveis

Alertando que, perante este cenário, está patente “como a insustentabilidade das atividades agrícolas e pecuárias, muitas vezes com subsídios públicos, pode estar a colocar em causa a qualidade de um bem cada vez mais escasso e precioso”, a ZERO critica a “paralisia total e a negligência das autoridades que deviam zelar pela preservação dos recursos naturais”.

Neste contexto, a associação “exige que o Ministério da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural e o Ministério do Ambiente avaliem de imediato esta situação e tomem medidas para a resolver no curto prazo, sob pena de se criarem situações irreversíveis, com custos acrescidos para os contribuintes”.

A ZERO critica a paralisia total e a negligência das autoridades que deviam zelar pela preservação dos recursos naturais

Entre as medidas preconizadas pela Zero, encontram-se a avaliação imediata e rigorosa à implementação do Programa de Ação para as Zonas Vulneráveis, com vista a analisar o desempenho das entidades responsáveis, o seu grau de eficácia no terreno e a definição de novas medidas mais exigentes para os agricultores e o exercício da atividade pecuária; a definição de novas zonas vulneráveis e/ou alargamento das existentes; e a retirada de todos e quaisquer apoios públicos aos agricultores que, comprovadamente, utilizem fertilizantes em excesso, em particular os de origem industrial, desrespeitando o Código de Boas Práticas Agrícolas.

A associação pretende ainda que se garanta o controlo da aplicação de estrumes e chorumes nos solos e a fiscalização adequada das explorações pecuárias, por forma a avaliar se as mesmas possuem capacidade apropriada de tratamento para as águas residuais.


i As nove zonas são Esposende-Vila do Conde, Estarreja-Murtosa, Litoral Centro, Tejo, Beja, Elvas, Estremoz-Cano, Faro e Luz-Tavira.

ii Os sistemas que poderão vir a ser incluídos são: , por forma a incluir os sistemas de Monforte-Alter do Chão, São Bartolomeu, Monte Gordo, Mexilhoeira Grande-Portimão, Querença-Silves, Albufeira-Ribeira de Quarteira, Quarteira, Ourém, Maciço Calcário Estremenho, Paço, Louriçal, Caldas da Rainha-Nazaré, Aluviões do Mondego e a área de Évora, situada no Maciço Antigo Indiferenciado.

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