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ADSE: que caminho?

Publicamos no esquerda.net o texto de Eugénio Rosa “A ADSE : um direito dos trabalhadores da Função Pública que deve ser defendido da “gula” das seguradoras e dos grupos privados da saúde”. No domingo 28 de agosto, pelas 14.30h, estará em debate no Fórum Socialismo 2016 o tema “ADSE: que caminho?”, com a participação de Eugénio Rosa e Moisés Ferreira.
"A dita 'comissão de peritos' como foi designada pela comunicação social dá o dito por não dito, dando seguidamente uma cambalhota, acabando por defender 'uma entidade coletiva de direito privado' e a desresponsabilização do Estado (ao fim de 2 anos devia-se afastar integralmente)"
"A dita 'comissão de peritos' como foi designada pela comunicação social dá o dito por não dito, dando seguidamente uma cambalhota, acabando por defender 'uma entidade coletiva de direito privado' e a desresponsabilização do Estado (ao fim de 2 anos devia-se afastar integralmente)"

A ADSE : um direito dos trabalhadores da Função Pública que deve ser defendido da “gula” das seguradoras e dos grupos privados da saúde

Aproveitando a divulgação do chamado “Relatório Final” da “Comissão de Reforma da ADSE” nomeada por este governo, foi lançada uma furiosa campanha que procurou convencer a opinião pública que a solução para a ADSE seria a sua transformação em “entidade coletiva do direito privado”, com a eventual entrega da gestão da sua carteira a uma seguradora, ou seja, a sua total privatização a curto ou médio prazo.

A campanha que se prolongou durante dois dias em quase todos os jornais e televisões, revelou, pelos seus conteúdos e caraterísticas, que era planeada e que o seu objetivo não era informar com verdade a opinião pública, mas sim convencê-la que a “solução” para a ADSE era apenas uma, e só uma, a saber: “entidade de direito privado”. E apesar dos sindicatos da Função Pública, ligados quer à CGTP quer à UGT, e das associações de aposentados bem como o próprio ministro da Saúde terem tomado uma posição clara contra a privatização da ADSE, afirmando que essa não seria a solução, mesmo assim a mensagem que passou na comunicação social, pela sua intensidade que procurou abafar as posições contrárias, foi a de que a solução para a ADSE teria de ser a “entidade de direito privado”. Mais uma operação de manipulação da opinião pública a que, infelizmente, a maioria dos media se prestou.

Quem tenha lido com atenção, e na totalidade, quer a chamada “versão preliminar do relatório para suporte à discussão pública” quer o “relatório final”, o que não aconteceu com a maioria daqueles que falaram aos órgãos de comunicação social, certamente terá ficado surpreendido quer pelas contradições existentes quer pela sua fragilidade.

Na “versão preliminar” e no “relatório final” a comissão reconhece que a ADSE é um direito dos trabalhadores da Função Pública pois faz parte do seu Estatuto laboral, devendo ser reconhecido num “contexto de benefícios atribuídos no quadro de uma politica de recursos humanos do Estado” (pág. 25 e 26 do relatório final). Este reconhecimento obrigaria a comissão, se fosse coerente consigo mesmo, a concluir. (1) O âmbito da ADSE são apenas os trabalhadores da Função Pública, seja qual for o seu vínculo jurídico, e os aposentados; (2) O Estado, como empregador, é responsável pela ADSE, já que esta integra os direitos laborais dos seus trabalhadores e, consequentemente, nunca se poderá desresponsabilizar; (3) O financiamento devia competir ao empregador, que é o Estado, porque os benefícios dados pela ADSE representam uma parte da remuneração (em espécie) do trabalhador; (3) O Estado ao eliminar o seu financiamento da ADSE, e ao obrigar os trabalhadores e aposentados da Função Pública a financiá-la integralmente, está a obrigar estes a financiarem uma parte das suas próprias remunerações (a parcela em espécie), o que não deixa de ser, pelo menos, insólito.

No entanto a dita “comissão de peritos” como foi designada pela comunicação social dá o dito por não dito, dando seguidamente uma cambalhota, acabando por defender “uma entidade coletiva de direito privado” e a desresponsabilização do Estado (ao fim de 2 anos devia-se afastar integralmente). E isto apesar de contrariar quer a conclusão que se tira do próprio relatório quer a opinião manifestada por mais de 90% de cerca de 3.500 trabalhadores e aposentados que participaram no debate público e que que enviaram a sua opinião à comissão defendendo um instituto publico de gestão participada. A própria comissão, no “relatório final” reconhece esse facto nos seguintes termos: “Do processo de discussão pública resultaram vários contributos, a preocupação com a confiança dos beneficiários levou, no entendimento da comissão quanto ao conteúdo dos comentários recebido, à proposta de um modelo jurídico e estatutário baseado na figura do instituto público” (pág. 31 do relatório final). Esta proposta defendida pela esmagadora dos participantes no debate público foi intencionalmente contrariada pela comissão e ignorado pela comunicação social.

Fomos dos primeiros... A defender que a solução mais adequada para a ADSE seria a criação de um Instituto Público de gestão participada

Fomos dos primeiros: (1) A alertar os trabalhadores e aposentados da Função Público para a criação de uma “comissão de sábios” donde tinham sido excluídos os representantes dos trabalhadores e aposentados da Função Pública, que são atualmente os únicos financiadores da ADSE; (2) A esclarecer que a continuação da ADSE como direção geral impedia os trabalhadores e aposentados de ter qualquer controlo sobre os dinheiros da ADSE que era financiada por eles, funcionado a ADSE como um autentico “saco azul “ para o governo que utilizava os seus dinheiros para pagar despesas que deviam ser suportadas pelo Estado; (3) A defender que a solução mais adequada para a ADSE seria a criação de um Instituto Público de gestão participada.

E isto por três razões: (1) Permitiria aos trabalhadores e aposentados da Função Pública controlar, através dos seus representantes, a forma como eram utilizados o dinheiro dos seus descontos; (2) Impedir que o governo continuasse a utilizar os dinheiros da ADSE para pagar despesas que devem ser suportadas pelo Orçamento do Estado; (3) Obrigar o Estado a continuar a ser responsável pela ADSE, o que daria também mais segurança aos trabalhadores e aposentados da Função Pública.

Seria necessário que no futuro Instituto Público de gestão participada fossem criados órgãos que permitissem aos trabalhadores ter o controlo efetivo da ADSE

Mas para isso seria necessário que no futuro Instituto Público de gestão participada fossem criados órgãos que permitissem aos trabalhadores ter o controlo efetivo da ADSE, o que exigiria: (1) Para além de um conselho diretivo, onde representantes dos trabalhadores e aposentados poderiam também participar se fosse essa a decisão das associações sindicais e de aposentados, conjuntamente com os membros nomeados pelo governo; (2) Um conselho de fiscalização constituído pelos representantes das associações sindicais e de aposentados, com poderes efetivos de fiscalização. Um aspeto também importante era a total autonomia financeira em relação ao Orçamento do Estado, o que pressupunha que os saldos acumulados ficariam obrigatoriamente no Instituto podendo este os utilizar, para fazer face a despesas autorizadas pelos seus órgãos, ou então para os rentabilizar.

Um instituto desta natureza e com estas caraterísticas exigiria inovação legislativa, como refere a comissão, pois a sua criação teria de ser feita por meio de lei aprovada pela Assembleia da República já que este Instituto Público de gestão participada tem diferenças em relação ao previsto na lei quadro dos institutos públicos (Lei 3/2004).

Eugénio Rosa, Economista

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