Na manhã deste sábado, em Lisboa, Francisco Louçã proferiu o discurso de abertura da VIII Convenção do Bloco de Esquerda, começando por dedicar umas palavras de homenagem a Valentina Loução, Fernando Silveira Ramos e Miguel Portas, porque “um partido que se respeita, homenageia os seus”. Citando Zé Afonso – “estou disponível para novas batalhas e não estou disponível para desistir, é desta fibra que se fazem os construtores” – afirmou ainda que “Valentina, Fernando e Miguel eram desta fibra de construtores”.
Percorrendo os 13 anos de vida do Bloco, Louçã referiu as batalhas ganhas, como a lei sobre a violência doméstica, a proteção dos toxicodependentes, a luta pelo direito ao aborto e pelo casamento entre pessoas do mesmo sexo, o levantamento do segredo bancário, o direito à saúde e o reconhecimento das medicinas alternativas.
“O país mudou para melhor e muda sempre para melhor quando há batalha e uma sociedade de lutadores”, sublinhou. Mas não deixou de referir que “a saúde e a escola pública, a Segurança Social, as funções sociais do Estado, poderiam estar mais protegidas, se a proposta do Bloco de Orçamento Base Zero tivesse sido aplicada”.
O debate o Estado não deveria ser uma ameaça apar as pessoas, mas sim um exercício de democracia, disse Louçã, afirmando que “o Bloco é uma barreira contra o populismo”. Referiu ainda os adversários sérios que o partido encontrou no seu caminho, dando o exemplo recente dos deputados do PS que se juntaram ao Bloco para levar ao Tribunal Constitucional a “óbvia inconstitucionalidade do corte dos subsídios e das pensões”.
“O impossível está a acontecer”
Afirmando que “vivemos a maior crise desde o 25 Abril”, o dirigente bloquista destacou a mudança que ocorreu há 2 anos, quando “a austeridade passou a ser o único remédio, a solução”, dos sucessivos PEC’s do governo socialista ao memorando da troika, com o qual Passos Coelho executa “o maior ataque à vidas pessoas, contra todas as promessas eleitorais”. “Como os gangsters de Chicago, dizem ‘se não consegues vencê-los, junta-te a eles’ e por isso aceitam a precariedade, o desemprego, as privatizações porque tem de ser”, criticou.
Mas “o impossível está a acontecer”, disse Louçã, e o impossível é 1.300 mil desempregados, a dívida de 210 milhões de euros, a fome, tirar aos reformados, ir mais fundo, e estamos a afundar-nos”, vaticinou Francisco Louçã.
“Radicais são suas excelências”
“Chamam-nos radicais por queremos correr com a troika desde o dia zero”, disse Louçã, perguntando: “mas e agora, quando vemos uma senhora do movimento nacional feminino a brincar à caridadezinha, um banqueiro cheio de dinheiro do Estado a dizer que nós aguentamos mais austeridade, a transferência de quase 20% do PIB para os detentores de riqueza estrangeira, 4 mil milhões de euros vindos de offshores de milionários que cometerem um crime fiscal e agora são perdoados no IRS, um Presidente da República que prefere receber a sua pensão em vez do salário e se queixa que esta mal lhe dá para viver - o que é que vão chamar-nos?”
“Radicais têm sido suas excelências e o país já não aguenta”, acusou. “O atraso não é solução, nem a decadência”, tal como a denunciou Eça de Queirós, disse ainda.
Louçã defende por isso que em vez de refundar o estado, “é preciso refundar a democracia, com toda a força”. Porque depois do festim, o povo não aceita a fatura do empobrecimento”, afirmou, referindo que não foram os salários que criaram o buraco de 4 mil milhões de euros, mas sim as PPP’s, as rendas e o BPN.
Ainda sobre a questão da refundação das funções socias do Estado, Louçã questiona: “quem quer as universidades com promoções Outono/Inverno do género de Miguel Relvas, hospitais privados dos Mello e Espírito Santo, Ulrich ou Jardim Gonçalves a gerir as nossas reformas?”
“Um Governo de Esquerda, uma solução para levantar Portugal”
Perguntando como chegámos aqui, Louçã afirma que foi por causa da “certeza mansa de que a política financeira nunca mudaria”, por causa do “rotativismo” e a alternância entre dois partidos que não têm ideias realmente diferentes. Mas o Bloco “mudou o mapa político”, afirmou, elencando as “17 oportunidades falhadas do rotativismo” na história da nossa democracia, referindo, em particular, e muito criticamente os governos socialistas eleitos desde o 25 de Abril.
O Bloco luta por uma alternativa à esquerda, e por isso “lutamos
intransigentemente para demitir Passos Coelho e Paulo Portas”, afirmou Francisco Louçã, porque “o povo não aguenta a destruição, o desemprego, o empobrecimento, a decadência”. Defendeu também que “o Bloco é um partido de protesto mas também de soluções”, criticando o PS, “o partido que protesta mas quer sempre continuar com o memorando da troika”.
E a solução é um Governo de Esquerda, “uma solução para levantar Portugal, a solução sensata, para defender os salários, as pensões, com ideias fortes, democracia inteira, estamos no olho do furacão e por isso este é o governo de um movimento social que corre nas artérias da República”, defendeu. “O Bloco de Esquerda está aqui para vencer e para mudar”, afirmou Louçã, aplaudido entusiasticamente pelos delegados e delegadas da Convenção.
“Está tudo à nossa frente, boa continuação”
“Termino aqui o mandato que desempenhei nestes anos”, disse Francisco Louçã – “estive no Bloco e vocês também, foi o princípio do melhor tempo das nossas vidas, e vem aí a vida toda”.
“Este é um partido de emoções fortes”, afirmou, continuando “gostei de cada momento, de cada emoção, das ideias e das invenções, mas não vou falar-vos do que passou, pois demos tudo e está tudo à nossa frente” – “hoje, tenho uma certeza, não há despedidas aqui”.
Louçã disse ainda que não vale a pena perguntar-lhe para onde vai, porque está aqui – “sou daqui e estou aqui”, sublinhou, referindo-se ao projeto do Bloco de Esquerda. O fundador e dirigente do Bloco enumerou “a gente de confiança” que conheceu neste percurso, nomeando a gente de Rabo de Peixe, nos Açores, os sindicatos, os movimentos sociais, os autarcas, os organizadores do Bloco, os deputados e as deputadas.
“Quando oiço o Acordai cantado em frente ao Palácio de Belém ou a Grândola cantada na ruas de Madrid, sinto que vale a pena”, afirmou.
“ Aqui estou, aqui estamos, vamos fazer o nosso tempo, com responsabilidade e vida intensa”, disse Francisco Louçã, sublinhando com emoção que “sabemos o que quer dizer a luta toda e nós somos a luta toda – boa continuação”.