Regime transitório para os docentes do Ensino Superior: é agora ou nunca

porLuís Monteiro

25 de março 2016 - 16:54
PARTILHAR

As centenas de docentes que anseiam pela prorrogação deste regime transitório não podem continuar à espera. A aplicação da prorrogação só surtirá efeito se realmente acontecer agora.

Em 2010, o governo socialista liderado por José Sócrates fez aprovar uma lei que obrigava todos os docentes do ensino superior universitário e politécnico que quisessem continuar a lecionar a obter o grau de doutorado, caso contrário perderiam o seu lugar como professores da instituição em causa. Esta decisão política criou um período para que todos os docentes que não possuíam o grau de doutorado o pudessem fazer. Este período garantia ainda isenção de propina e redução da carga horária, criando assim as condições necessárias à conclusão do doutoramento. Aliado a isto, estava a promessa de que estes mesmos docentes, aquando da obtenção do doutoramento, entrariam no quadro das instituições, ganhando um vínculo estável e deixando para trás a sua relação precária no contrato laboral. Esta medida cumpria a norma europeia 70/2010, que obriga as instituições de ensino superior a dar contratos de trabalho a todos os docentes que comprovem que todos os anos são contratados a termo ou a prazo para funções que são fixas e não temporárias.

Durante estes seis anos, fazemos um balanço sobre a forma como este regime foi aplicado. Em variados casos, os docentes não tiveram isenção de propina nem redução da carga horária. Ainda que a maioria tenha, com bastante esforço financeiro e de tempo, concluído o doutoramento, existem ainda umas centenas que não concluíram o doutoramento derivado ao incumprimento destes direitos. Sabemos hoje, também, que a maioria dos que concluíram o doutoramento permanecem ainda com uma relação precária à instituição.

Já na anterior legislatura, na altura da governação da coligação de Direita, o Bloco apresentou na Assembleia da República um projeto de resolução que visava estender este período para que ninguém ficasse prejudicado. Essa iniciativa foi chumbada pela então maioria, mas contou com os votos favoráveis do PS, do PCP e do PEV.

No início desta legislatura, apresentámos uma iniciativa idêntica, apelando à nova maioria parlamentar que resolvesse um problema que a anterior governação nunca resolveu. O próprio Partido Socialista e o Partido Comunista Português acompanharam o Bloco nesta matéria e todos apresentaram iniciativas idênticas, ainda que com algumas pequenas diferenças – enquanto que os projetos do BE e do PCP estipulavam um período exato para a prorrogação deste regime, o projeto do PS deixava isso em aberto. A verdade é que todos os projetos foram aprovados e desceram à Comissão de Educação e Ciência, no sentido de, no debate em especialidade, encontrar um texto conjunto que compilasse as vontades dos três proponentes. Entretanto, estes dois momentos (entre a aprovação e a discussão em comissão), o debate do Orçamento do Estado começou e esta matéria ficou prejudicada no tempo.

Para que o assunto não ficasse esquecido, em sede do Orçamento do Estado, o Bloco de Esquerda voltou a apresentar esta medida como proposta de alteração, no sentido de garantir que o Governo cumpria o que o próprio Partido Socialista já tinha feito aprovar na Assembleia da República, como projeto de resolução (que não vincula o Governo, a sua aplicação depende da boa vontade do mesmo). O Partido Socialista, desta vez, chumba a proposta de alteração do Bloco de Esquerda, sem qualquer tipo de justificação e contrariando até a posição que tinha vindo a tomar na anterior legislatura e já desde que é Governo. Isso significou uma deceção para todos aqueles que olharam com esperança esta nova vontade de resolver o problema.

No entanto, na semana passada, em sede de comissão, fizemos aprovar um texto conjunto sobre esta matéria, que contou com a aprovação dos três partidos proponentes. Mesmo assim, não deixa de ser um projeto de resolução que não vincula o Governo. Será que o Ministério vai pôr em prática a vontade da maioria parlamentar?

As centenas de docentes que anseiam pela prorrogação deste regime transitório não podem continuar à espera. A aplicação da prorrogação só surtirá efeito se realmente acontecer agora, caso contrário torna-se inútil porque os visados já não se encontram sequer inseridos no subsistema do ensino superior.

O debate hoje não se se centra, portanto, na razoabilidade da medida, mas sim no espaço temporal em que ela irá ser posta em prática. Em todas as legislaturas, são aprovados projetos de resolução na Assembleia da República que nunca conhecem a luz do dia. Lutaremos para que este não seja um desses casos, não baixando os braços nem em torno da prorrogação do regime transitório nem pelo cumprimento da norma 70/2010 que combate a precariedade no ensino superior.

Artigo publicado no Jornal “O Panorama”

http://opanorama.pt/

Luís Monteiro
Sobre o/a autor(a)

Luís Monteiro

Museólogo. Investigador no Centro de Estudos Transdisciplinares “Cultura, Espaço e Memória”, Universidade do Porto
Termos relacionados: