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Podemos criticar a imprensa?

A acusação da Associação de Imprensa de Madrid (APM) de que o Podemos acossa jornalistas causou grande comoção na direita portuguesa.

De um dia para o outro, os colunistas, bloguistas e os jornais mais engajados trataram de rolar a bola de neve, fazendo sempre questão de lembrar a proximidade do partido espanhol ao Bloco de Esquerda. O contraditório, como de costume, foi esquecido pela maioria dos analistas.

O enfrentamento entre os e as responsáveis do Podemos com a imprensa não é novidade, especialmente com os meios mais próximos do poder político e financeiro que, ao longo destes anos, tem sido alvo da crítica feroz daquele que é hoje o maior partido da oposição no Estado Espanhol.

Por vezes, do lado do Podemos, a ofensa não é engolida em silencio e a resposta é ríspida ou assertiva mas contundente e acredito que, muitas vezes, o tom e a forma não sejam os mais corretos, mas desconfio seriamente que o tal do acosso, que a APM denunciou mas não concretiza, não seja mais do que um misto entre um sentimento de impunidade e de orgulho ferido de quem se julga acima das críticas.

E a opinião da referida APM não é consensual. Olga Rodriguez, jornalista internacional do El Diario, diz que acusar o Podemos dá pontos junto da direção dos jornais e acusa a imprensa de não dar o mesmo destaque a episódios bem mais graves protagonizados por dirigentes do PP de Rajoy, enquanto Ignacio Escolar, diretor do mesmo órgão, recorda que a coação implica ter intenção e meio de prejudicar o visado e que a pressão nas redes sociais, apesar de lamentável, não faz de ninguém agressor.

Por outro lado, a dita associação, tão servil ao poder durante o franquismo e tão próxima de alguns governantes no pós transição, parece ter dois pesos e duas medidas, já que nunca se pronunciou sobre pressões políticas denunciadas pelos trabalhadores da TVE.

Mas falemos de acossamento: Desde que o Podemos surgiu, em Janeiro de 2014, que muitas mentiras foram ditas sobre as intenções e integridade dos seus e das suas principais dirigentes: desde a ofensa pura e dura em crónicas e editoriais, passando pela exposição da vida amorosa de Pablo Iglésias ligando-a a nepotismo dentro do partido, pela indecente utilização de uma fotografia de uma nudista para tentar, devido às evidentes parecenças, fragilizar a imagem de Teresa Rodriguez, acusações de financiamento pelo governo da Venezuela, de simpatia pela ETA, de fraude académica… dezenas de primeiras páginas e destaques que, mesmo nos casos em que houve a decência ou obrigatoriedade de reconhecer o erro, serviram o intento de lanças a suspeição.

Destas pressões, destes truques vergonhosos que, lá como cá, alguma imprensa usa para influenciar a opinião pública e que em muito tem prejudicado o Podemos não falam os paladinos da liberdade de expressão que ocupam o nosso espaço mediático.

Ainda assim, Liliana Valente, do Público, lembrou em tom irónico no seu twitter que “Isto por cá não há nada disto. Nem à direita nem à esquerda!”, mostrando que episódios como o de um certo ministro que ameaçou uma jornalista ou o de um barbado assessor que pontapeou um repórter não estão completamente esquecidos.

Sobre o/a autor(a)

Enfermeiro, doutorando em Saúde Internacional no IHMT/NOVA. Deputado municipal em Sintra, eleito pelo Bloco de Esquerda
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