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Orçamento de Estado suicidário

O Orçamento que o Governo apresentou à AR, ou melhor, o que pelo menos uma parte do Governo apresentou, não pode ser cumprido. Todos os ministros sabem que nenhuma previsão bate certo. É um Orçamento de Estado suicidário, apresentado por um governo a prazo.

Depois de dias e dias de especulação, alimentada pelo próprio Governo, o “enorme” aumento de impostos, para usar a expressão do ministro Vítor Gaspar, não só não foi “mitigado” como apareceu de mãos dadas com cortes significativos no Ministério da Saúde ou em algumas das principais prestações sociais.

Nem aumento de impostos “mitigado”, nem recuo nos escalões do IRS. Nada. O Orçamento de Estado para 2013 é o mesmo, mas mais forte. São mais despedimentos, mais cortes na Saúde ou Educação, mais desemprego, mais taxas moderadoras, mais dinheiro para a Defesa e para pagar os juros da dívida. A menos só há o crescimento económico que vai diminuir.

O Orçamento que o Governo apresentou à Assembleia da República, ou melhor, o que pelo menos uma parte do Governo apresentou à Assembleia da República, não pode ser cumprido. Todos no Governo o sabem, os que fingem que acreditam no Orçamento e os que fingem que se alguém os ouvisse nas Finanças isto afinal podia correr tudo bem.

O CDS, aliás, inaugurou um novo conceito político. Está no Governo, mas há dias em que gosta de fingir que está na oposição. Na segunda, quarta e sexta é do Governo, na terça, quinta e sábado é da oposição. Ao domingo o Dr. Paulo Portas dirige-se ao país, numa das suas rábulas em que simula as perguntas e finge dar algumas as respostas.

Ou está ou não está no Governo. E, encenações à parte, o CDS está no Governo. E está no Governo de braço dado com o PSD a aumentar impostos, multiplicar o desemprego e empobrecer o país.

Onde antes falava do esbulho e do confisco fiscal, agora está a aumentar os impostos até níveis desconhecidos. Onde antes era o partido dos reformados, agora corta meses inteiros às reformas. Onde antes era o garante das famílias, agora corta apoios sociais, corta os passes escolares e faz o aumento de todas as taxas.

O Governo finge que acredita, mas todos os ministros sabem que nenhuma previsão bate certo, nenhum número pode bater certo. É um Orçamento de Estado suicidário, apresentado por um governo a prazo em que já todos só pensam na forma como vão aparecer na fotografia do seu enterro.

Não há uma ideia neste Orçamento, uma ideia que seja, sobre como o país poderá sair da crise. Corta, corta, corta. É esse o único mantra de Pedro Passos Coelho e Vítor Gaspar.

Corta o apoio social aos desempregados, num país onde metade dos desempregados já não recebe qualquer apoio social.

Corta o subsídio de doença, porque adoecer é coisa de piegas.

Corta nas despesas com a Saúde, ao mesmo tempo que aumenta mais uma vez as taxas moderadoras nos hospitais.

Corta milhares de funcionários públicos, num corte absolutamente cego sem nenhuma ideia de requalificação dos serviços públicos, mas apenas e só como um revanchismo ideológico da direita contra os serviços públicos.

É um Governo sem réstia de ambição e sem qualquer ideia para o futuro. Pode cortar-se em tudo, dos salários à educação, do apoio aos desempregados às reformas, mas nunca, nunca pensa em mexer nos juros que consomem mais do que todo os gastos em saúde.

Pedro Passos Coelho e Vítor Gaspar podem governar Portugal, mas comportam-se na realidade como se o seu único objetivo fosse ganhar aquela medalhinha de mérito de empregado do mês da senhora Merkel.

Este Orçamento do Estado não pode ser aprovado porque não pode aplicado, não pode. É um Orçamento que faz tábua rasa do resultado das políticas do Governo ao fim de um ano e meio. Pior do que não saber, é mesmo não querer saber. E é isso que o Governo não quer. Não quer saber o estado de destruição a que chegou o país.

O resultado do Orçamento que ainda está em vigor já é conhecido. PSD e CDS cortaram salários, lançaram o país na recessão e criaram um mar de desempregados com o gigantesco aumento de impostos. E tudo isto para o défice real, o tal em nome do qual tudo tinha sido feito, ficar exatamente na mesma.

E agora, que a recessão induzida pela política da austeridade “custe o que custar” colapsou, querem repetir o mesmo veneno em 2013, mas numa dose mais forte. Pior. Insultam a inteligência de todos os cidadãos, ao dizerem que o resultado do investimento zero e do maior aumento de impostos da história será uma recessão de apenas 1%.

Seria o sinal de uma colossal ignorância se não fosse uma fraude, uma fraude trágica para o país.

Nos últimos dias, contudo, o CDS tem vindo a tentar “vender” a ideia que está a batalhar para limitar o aumento de impostos com cortes nas despesas.

Sejamos claros. Pode-se enganar algumas pessoas durante algum tempo, muita gente durante pouco tempo, mas não se pode tentar enganar toda a gente durante todo o tempo. Os cortes de que CDS e PSD estão a falar são mais do mesmo do que têm feito. São cortes no apoio a quem perdeu o emprego, são cortes na saúde, onde ficamos muito abaixo da média europeia, ou na educação, onde passamos a ser o país europeu que menos investe na qualificação. Tem sido esta a política do Governo.

Destruir os serviços públicos e os apoios sociais do Estado é retirar rendimentos aos portugueses. Pior. É penalizar sobretudo os mais pobres.

Só a cegueira de quem vive entre os mais privilegiados pode explicar que se faça este debate por parte de certos partidos que estão tão preocupados com os impostos e proponham, em vez disso, a destruição dos serviços públicos que são essenciais exatamente para quem tem menores rendimentos.

Se havia dúvidas de que era possível, num ano e meio, destruir tantas vidas, tantos postos de trabalho, tanta iniciativa privada, tantos direitos sociais, aqui está a resposta, o estado do país. Afinal parece que sim, PSD e CDS acham que é possível. E é para parar esta possibilidade, para salvar estas vidas, estes postos de trabalho, estes direitos sociais, que que é preciso parar esta proposta orçamental. É preciso parar este governo.

Declaração política sobre Orçamento de Estado e crise na coligação, 17 de outubro de 2012

Sobre o/a autor(a)

Investigadora do CES
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