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O PSD e o acordo entre o PS e o Bloco na CML – o morder de lábio de João Pedro Costa

João Pedro Costa, o segundo (e último) vereador eleito pelo PSD na Câmara Municipal de Lisboa veio pronunciar-se sobre o Acordo celebrado entre o PS e o Bloco de Esquerda no âmbito da Câmara Municipal de Lisboa.

Em primeiro lugar, saúda-se a “prova de vida” de um PSD que foi destroçado eleitoralmente em Lisboa, esperando-se quatro anos de profícuo trabalho em prol da Cidade, ainda que com uma visão muito diversa dos subscritores do acordo alvo de crítica. Ao PSD exige-se presença e proposta na Câmara Municipal de Lisboa, ainda que em posição de princípio contrária a este acordo. Aguardamos pois, com expectativa, por lá esta entrada não se salde com uma saída de “sendeiro”.

Em segundo lugar, a acreditar em algumas notícias que davam conta de um acordo entre o PS e o PSD na Câmara Municipal de Lisboa (algo que decorreria da falta de mandato do PSD para liderar a oposição na Câmara Municipal), este posicionamento pode ser visto como uma amargurada posição face à frustração dessas tão ventiladas negociações, o que se compreende, pois um acordo entre o PS e o PSD comportaria necessariamente soluções diversas, a meu ver, más para a Cidade. É bom lembrar que o PSD defendia no seu programa eleitoral (de forma aliás sincera, ao contrário do CDS que se remeteu ao silêncio) a privatização das operações da Carris e do Metro, aliás a exemplo do que tentou fazer quando estava ao leme do Governo.

Percebe-se com clareza, por estes dois factores, o incómodo do PSD e do seu vereador com o acordo alcançado. No entanto, não resisto a ir mais longe na análise dos incómodos do PSD em Lisboa com o acordo entre o PS e o Bloco de Esquerda.

O PSD rotula um conjunto de medidas previstas no acordo como irresponsáveis, o que é coerente com a postura do PSD rejeitada de forma esmagadora nas urnas:

a) Ao rotular de irresponsáveis as medidas do Acordo quanto à questão do Alojamento Local o PSD, assume que foi num Governo do PSD, pese embora com o papel mais activo do CDS, que se liberalizou o Alojamento Local, o que somado às medidas que assumiram no âmbito do arrendamento urbano lançaram a expulsão de milhares de lisboetas do centro da Cidade, em especial dos mais desprotegidos. Sim, este acordo vem contra a visão do PSD e muito bem;

b) Ao rotular de irresponsável a dimensão de concepção e financiamento público de um programa municipal de habitação, o PSD assume que é pela expulsão das populações menos favorecidas do centro da Cidade, aliás de forma tão curiosa que até diz a este propósito que são “promotores de guetização e geradores de mais dependência social do Estado”. João Pedro Costa diz tudo e o seu contrário, o que não é de espantar: por um lado não quer guetização, mas por outro recusa esta medida que visa mobilizar e reabilitar o património imobiliário do Município, muito dele nas zonas centrais da Cidade, para uma maior integração de quem tem menos, justamente para evitar a guetização. Aqui, está em linha com o programa confuso com que se apresentou a votos.

c) Ao rotular de irresponsável a solução alcançada quanto às dívidas das rendas sociais, João Pedro Costa, e pela sua pena o PSD, demonstra a costumada insensibilidade social do PSD, indiferente a despejos, os mesmos que foram motivados pelo aumento brutal de rendas que PSD e CDS juntinhos no Governo promoveram na renda apoiada. Pior, perante as situações de carência económica, como se pode criticar que ao incumprimento acresça mais metade dos valores de renda em mora sem demonstrar essa insensibilidade social? Perceba o João Pedro Costa e o PSD que este acordo veio para solucionar problemas de incumprimento criados pelo Governo PSD e CDS.

Depois, vem João Pedro Costa referir-se ao carácter redutor de medidas sociais como a aplicação automática da tarifa social da água, do consumo assistido, do acolhimento LGBT+, do apoio à violência (esquecendo-se de referir “doméstica”, não fosse uma praga bíblica abater-se sobre o PSD) , da multiculturalidade e do desporto. Estou certo que João Pedro Costa tenderá a não beneficiar destas medidas, mas a decisão política não se toma em função das nossas circunstâncias pessoais, mas sim pensando nas circunstâncias das demais pessoas, o que bem demonstra da razoabilidade dos lisboetas nas escolhas que fizeram nas eleições.

Por último, que não se preocupe o João Pedro Costa e o PSD quanto à falta de convergência entre PS e Bloco de Esquerda em matérias como a Taxa Municipal de Protecção Civil ou quanto ao modelo de financiamento privado do Programa Renda Acessível. Os dois partidos têm programas próprios e autónomos, sendo certo que votarão na Câmara Municipal e na Assembleia Municipal de acordo com esses programas e com os pontos de convergência vertidos no acordo. Aliás, nestas duas matérias o Bloco de Esquerda teve uma posição bem mais vincada que o PSD, propondo no mandato passado, por duas vezes a anulação da Taxa Municipal de Protecção Civil na Assembleia Municipal (o PSD veio a reboque) e votando contra o Programa Renda Acessível na medida em que este constituía uma PPP (o PSD optou por uma abstenção, aliás pouco violenta).

Em suma, João Pedro Costa parece alimentar uma secreta esperança que o acordo entre o PS e o Bloco de Esquerda falhe, talvez como forma de alimentar a vontade de chegar ao poder com o resultado eleitoral que teve. Parece-me que não vai ter sorte...

Sobre o/a autor(a)

Advogado, ex-vereador a deputado municipal em S. Pedro do Sul, mandatário da candidatura e candidato do Bloco de Esquerda à Assembleia Municipal de Lisboa nas autárquicas 2017. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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