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O mínimo

O subsídio ao salário mínimo pode tornar-se num incentivo ao salário mínimo, e isso é o que queremos combater.

Grécia, Malta, Espanha, Eslovénia, Reino Unido, Alemanha, Franca, Bélgica, Holanda, Irlanda e Luxemburgo. Esta é a lista de países que, segundo o Eurostat, têm salários mínimos superiores ao português. Em algum caso mais do dobro. Sabendo que mais de meio milhão de trabalhadores recebe o salário mínimo em Portugal, não admira que um em cada dez não consiga sair da pobreza. O trabalho ainda não é garantia de uma vida digna no nosso país, e a pobreza é o reflexo do nosso subdesenvolvimento.

Não se pense no entanto que salário mínimo é política social e que deve por isso ser subsidiada. O salário é o valor do trabalho, e uma sociedade justa tem de garantir, não só que quem trabalha recebe uma remuneração digna, mas que a divisão de produto entre capital e trabalho é equitativa. Em Portugal, a percentagem dos salários no produto tem vindo a cair ao longo dos últimos anos e está hoje abaixo da média da União Europeia. Em parte, esta evolução aconteceu porque, apesar de todos os outros preços terem continuado a subir, o salário ficou congelado, permitindo às empresas (e ao Estado) apropriarem-se do poder de compra perdido pelos trabalhadores.

Diz quem defende a decisão do Governo de subsidiar o aumento do salário mínimo pago pelas empresas que estas devem ser ajudadas, e por isso o Estado usará 60 milhões de dinheiro público para compensar a descida da TSU. Não está aqui em causa a pertinência de medidas de apoio ao setor empresarial, mas esta é uma política errada.

O subsídio ao salário mínimo pode tornar-se num incentivo ao salário mínimo, e isso é o que queremos combater. O desejável, numa economia em que os baixos salários são uma fraqueza e não uma vantagem, é que o aumento do mínimo provoque um efeito de arrastamento em todos os salários mais baixos. Por outro lado, o pagamento de uma remuneração digna é o dever de qualquer empresa. Os gigantes donos do Pingo Doce ou do Continente serão provavelmente os maiores beneficiários desta medida, muito mais por falta de vergonha que por necessidade.

Finalmente, nunca é tarde para lembrar que os salários dos trabalhadores também são a procura das empresas. No seu conjunto, a economia ganha com os aumentos salariais.

O acordo entre o Bloco e o PS foi e é a garantia de que o salário mínimo aumenta pelo menos 5% ao ano. Ao todo são mais 647euro líquidos por trabalhador em dois anos. É preciso persistir neste caminho, com a certeza de que esta valorização é justa e ainda parca. Subsidiar estes aumentos é dar meio passo atrás quando deveríamos estar a dar dois passos em frente.

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” em 27 de dezembro de 2016

Sobre o/a autor(a)

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
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