Está aqui

Em defesa das pessoas, dos animais e da natureza

Qualquer solução que vise impedir atentados contra os direitos dos animais, legalmente reconhecidos, não pode assentar em atentados contra os direitos das pessoas envolvidas no processo de abate.

O Bloco de Esquerda coloca-se na linha da frente da defesa do bem-estar animal e na sensibilização para que se acabe de vez com os maus-tratos a animais, que reputamos de desnecessários, cruéis, anacrónicos e imorais até. Temo-lo feito, tanto com iniciativas legislativas, como com a nossa presença nos debates e no apoio às mais variadas manifestações dessa vontade. Cremos contribuir assim para uma sociedade mais moderna e civilizada, conscientes de que partilhamos o nosso espaço, os nossos recursos e a nossa vida com outros seres que merecem ser tratados com respeito e dignidade.

Apesar destes esforços - que não são exclusivos do Bloco de Esquerda, nem pertencem, por natureza ou direito, a nenhuma força política ou social em particular – sabemos que os maus-tratos a animais continuam. Sabemos também que nos matadouros subsistem práticas que não são compagináveis, nem com as leis existentes para a proteção e bem-estar dos animais, nem com uma ética que se exige respeitadora da sua dignidade, quer em vida quer na hora do seu abate.

Temo-lo dito, e repetidamente, que para a implementação das leis da proteção e bem-estar dos animas o Estado tem faltado, em muito, com a parte que lhe compete. Nomeadamente na contratação de veterinários e técnicos necessários para a fiscalização do transporte e abate, além de outros investimentos que têm sido descurados, principalmente em pessoal e meios nos organismos públicos - centrais e municipais - a quem compete a fiscalização das boas-práticas no tratamento dos animais e salvaguarda da saúde-pública, no que concerne aos matadouros.

Porém, a nossa abordagem a este tema não é desligada da realidade social e económica que o envolve. Qualquer solução que vise impedir atentados contra os direitos dos animais, legalmente reconhecidos, não pode assentar em atentados contra os direitos das pessoas envolvidas no processo de abate.

Daí não concordamos com a introdução de câmaras de vigilância nos matadouros, como proposto pelo PAN num seu projeto-lei porque, muito simplesmente, valorizamos a privacidade e os direitos dos trabalhadores.

De resto, a proposta do PAN, suportada numa vigilância 24h por dia dos trabalhadores, não garante, de modo nenhum, a proteção dos animais. Está mais do que estudado e provado que a videovigilância é pouco eficaz na dissuasão de comportamentos indesejáveis.

Esta proposta concorre para um sistema cada vez mais opressor, abrindo, neste caso, caminho à entidade patronal para se servir das imagens como quiser e, ao mesmo tempo, desresponsabilizando-os, assim como ao Estado, de cumprirem com as normas estabelecidas por lei.

E é esta abordagem, mais abrangente, que tem em conta a realidade social que envolve o tema, que nos impede de acompanhar o PAN nesta iniciativa legislativa. Introduzir mecanismos de securitização e vigilância nos matadouros que, não nos esqueçamos, são também locais de trabalho de pessoas com direito à sua privacidade. Seria mais um perigoso passo em frente na presença de um tentacular bigbrother.

Talvez alguém ganhasse com isso. Mas não seriam, seguramente, nem as pessoas, nem os animais nem a natureza.

Sobre o/a autor(a)

Engenheiro técnico de comunicações. Dirigente do Bloco de Esquerda
(...)