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Água de fevereiro vale muito dinheiro

No caso da Câmara de Barcelos a água vale, concretamente, 172 milhões de euros.

É este o valor que o Município terá de pagar ao concessionário privado a quem foram entregues as Águas de Barcelos em 2005, pela mão de Fernando Reis, autarca do PSD.

Segundo o Tribunal de Contas, o negócio das Águas de Barcelos tem "factos que são suscetíveis de consubstanciarem a prática de ilícitos de natureza administrativa, contraordenacional, criminal e financeira". Não é difícil perceber porquê.

Na altura, a Câmara acordou que, no caso de o consumo de água ficar 20% abaixo do previsto, seria a Autarquia a compensar o privado. Fosse como fosse, este nunca ganharia menos que a rentabilidade garantida de 10,3%. Acontece que as estimativas feitas para o consumo eram absolutamente irrealistas, sobretudo para um concelho rural, onde a água do furo ou do poço ainda era uma prática corrente. Para evitar o descalabro financeiro, até se começou a cobrar mais a quem não consumia água, promovendo ativamente o desperdício.

Depois de exigências de aumentos do preço de 35% num só ano, a Autarquia decide, já com novo Executivo, resgatar a concessão ruinosa. Pagará por isso mais 87 milhões de euros. Não há forma da AGS, a empresa que detém a maioria da concessão, ficar a perder neste negócio. Por irónico que seja, esta empresa, pertencente à Somague, terá sido entretanto vendida a um consórcio japonês por 72 milhões de euros.

Será este apenas mais um negócio que correu mal? É pouco provável, já que a repetição dos casos aponta para um padrão: o da usurpação de recursos públicos por consórcios privados chamados a gerir serviços do Estado.

Seguindo um movimento um pouco por todo o Mundo onde as águas tinham sido privatizadas, também em Mafra o serviço vai ser remunicipalizado. A concessão feita pelo PSD culminou com a exigência do aumento da tarifa em 33% pela concessionária chinesa BeWater, rejeitada pela atual Autarquia.

Olhemos bem à nossa volta, da privatização dos CTT às ruinosas PPP na saúde ou nas estradas, e encontraremos dezenas de casos parecidos com o das Águas de Barcelos. São eles, entre outros, uma das causas do empobrecimento do nosso país.

Artigo publicado no “Jornal de Notícias” a 7 de fevereiro de 2017

Sobre o/a autor(a)

Deputada. Dirigente do Bloco de Esquerda. Economista.
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