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2018: furo de petróleo em Peniche

Se os contratos forem cumpridos, 2018 será ano de quatro furos de prospeção petrolífera algures entre Lisboa e o Porto.

Depois de aparentemente o Governo ter cancelado as concessões de petróleo no Algarve em terra e no mar por incumprimentos contratuais e de, segundo o secretário de Estado da Energia, o furo petrolífero em Aljezur ter definitivamente caducado, é em Peniche o furo que se segue. Se os contratos de concessão petrolífera assinados pelo anterior governo para a Bacia de Peniche forem cumpridos, 2018 será ano de quatro furos de prospecção petrolífera algures no litoral português entre Lisboa e o Porto.

As concessões da Bacia de Peniche, designadas pelos irónicos nomes de Camarão, Amêijoa, Mexilhão e Ostra, foram entregues pela primeira vez em 2007, pelo ministro Manuel Pinho do governo de José Sócrates. As concessionárias de então — Petrobras, Galp e Partex (da Fundação Calouste Gulbenkian) — realizaram vários dos trabalhos, não sendo claro que tenham cumprido a calendarização das acções previstas. Em 2008, realizaram uma campanha sísmica no mar entre Lisboa e o Porto. Em 2010 fizeram uma campanha sísmica no mar entre Lisboa e Torres Vedras. Em 2011, foi a Mohave Oil a realizar uma campanha sísmica entre Cantanhede e a Nazaré.

É em 2015 que acontece algo peculiar: os quatro contratos recebem adendas e assim mudam-se os concessionários, sendo a brasileira Petrobras substituída pela americana Kosmos Energy e pela Repsol. No mesmo ano — 2015 —, a petrolífera espanhola faz uma sondagem sísmica no mar entre Cantanhede e Vila Nova de Gaia. Os trabalhos são adiados e recalendarizados, depois de aparentemente não ter sido feito nenhum furo de prospecção no deep offshore entre Lisboa e o Porto (2011 era o ano limite).

Voltando à leitura dos contratos, todos disponíveis no site da Entidade Nacional para o Mercado dos Combustíveis, fica claro que o 11.º ano do contrato é ano de “furo”, isto é, em 2018 a Repsol (que é a empresa que “manda” nas concessões, apesar das participações da Galp, Partex e Kosmos) tem de fazer furos de prospecção no mar entre Lisboa e no Porto.

Entre Lisboa e o Porto estão 26 municípios litorais em que os futuros executivos municipais deparar-se-ão, no seu primeiro ano de mandato, com um furo de petróleo que desemboca nas suas praias. Acresce que as concessões em terra na Batalha e em Pombal terão, por contrato, furos petrolíferos em terra já em 2019, possivelmente precedendo exploração petrolífera por fracking. No actual processo eleitoral autárquico esta questão tem estado ausente, em particular nas zonas que serão afectadas mais rapidamente.

Olhando o passado recente das concessões petrolíferas em Portugal e a contestação social à volta das mesmas, é importante destacar que, apesar de todas as notícias relativamente à “suspensão”, “cancelamento” ou “rescisão” de contratos e de furos petrolíferos, ainda não existiu qualquer documento oficial tornado público que assegure o sucesso da luta contra o petróleo no Algarve ou no Alentejo. Os incumprimentos contratuais das petrolíferas são claríssimos e dão toda a margem ao governo para acabar com os contratos (sem ser sequer necessária grande coragem política ou invocar os imperativos climáticos), mas a ameaça continua presente. A norte, há manchas no horizonte.

Artigo publicado no jornal “Público” a 23 de setembro de 2017

Sobre o/a autor(a)

Investigador em Alterações Climáticas. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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