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Superexploração de refugiados e trabalho infantil na Turquia

Mesmo com o conhecimento destes casos, nunca foi registado um decréscimo de vendas nas lojas envolvidas em casos de exploração. Por Joana Soares.
Foto Arturo de Albornoz – Unicef – Child Labour

Uma reportagem da BBC revelou esta semana mais um caso de exploração de trabalho infantil, que envolve algumas das “grandes” marcas de vestuário. O programa de investigação Panorama da BBC descobriu uma fábrica na Turquia que tem como trabalhadores vários refugiados, alguns menores de idade, a produzir roupas para os fornecedores de marcas conhecidas como a Zara e a Mango.

Sem documentos e em condições desumanas, é desta forma que se encontram os trabalhadores dessas fábricas. Um dos casos mais chocantes é de um rapaz de 15 anos, que diz ser forçado a trabalhar 12 por horas por dia, com a noção de que o que submetem a fazer não é correcto, mas o medo e a falta de segurança obrigam-no a continuar lá. Um dos refugiados afirma que “Se alguma coisa acontecer a um sírio, deitam-no fora como a um pedaço de tecido”, é este o tratamento a que estão sujeitos.

Na Turquia, uma conjuntura trágica propiciou esta situação. O país, que se encontra em grande instabilidade, recebeu mais de três milhões de refugiados. Devido à falta de apoios, estes cidadãos viram nestes trabalhos a única forma de sobrevivência. O seu desespero, em conjunto com uma ausência de controlo, foi visto pelos patrões como uma forma fácil de fazer dinheiro, através da superexploração. Praticam salários absurdos, como de uma libra à hora, o equivalente a 1,12 euros, valor muito abaixo do salário mínimo nacional.

Após a transmissão da reportagem, as marcas apontadas pela investigação afastaram culpas e dizem ter uma política de tolerância zero perante estes casos. Alegam não ter conhecimento das situações.

No entanto, este problema não é inesperado para nenhuma empresa. A organização Business and Human Resource Center estimou que entre 250 a 400 mil refugiados se encontram em circunstâncias de trabalho ilegal na Turquia, muito propícias a abusos. Num estudo elaborado em janeiro, a organização questionou 28 marcas sobre o que pensam fazer face a esse problema. Apenas duas admitiram estar alertas, enquanto as restantes se mostraram indiferentes. Podemos concluir, que mesmo tendo noção da gravidade e complexidade da situação em causa, a resposta em defesa dos trabalhadores foi nula. Nenhuma política foi posta em prática para evitar que essas situações de superexploração acontecessem, por isso a investigação da BBC apenas revelou o expectável.

Apesar de estes factores serem a principal causa do problema, não podemos descartar a nossa responsabilidade, como consumidores que continuam a alimentar estas marcas. Mesmo com o conhecimento destes casos, nunca foi registado um decréscimo de vendas nas lojas envolvidas em casos de exploração. É legítimo partir do princípio que quase todos os cidadãos repudiam o contexto em questão, contudo o consumismo intrínseco no espírito capitalista da nossa sociedade tem impedido uma ação social que manifeste indignação. Ninguém apoia a situação desumana vivida por estes trabalhadores, no entanto os nomes das marcas envolvidas nestes escândalos são de conhecimento público e a passividade prolonga-se.

Não é a primeira vez que são revelados casos como este, nem é só na Turquia que acontecem. Este é um problema global, muito presente na indústria têxtil e que se agrava com a crescente chegada de refugiados. Torna-se clara a indiferença da indústria face a este problema, por isso cabe-nos a nós não fechar o olhos e não deixar a história repetir-se. Para isso, temos de parar de sustentar a ganância dos exploradores e tomar uma iniciativa no sentido de derrubar quem se aproveita dos que se encontram em situações de fragilidade.


Publicado origialmente no blogue Contradição

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