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Os planos A, B, C, D, E, F… da moeda Irlandesa desde a independência
A questão da moeda chegou às manchetes da campanha do referendo. O governo escocês apresentou o seu Plano A para uma zona esterlina com o resto do Reino Unido. Recusou-se também a dar explicações sobre um Plano B. Para os irlandeses, como nós, ou para aqueles que conhecem a Irlanda, isto está tudo a ficar um bocado aborrecido. Porquê?
A moeda nunca foi central no movimento de independência da Irlanda nem antes, nem durante, nem depois. Pádraig Pearse e James Connolly não içaram a bandeira branca no topo da sede dos correios de Dublin por temerem que Whitehall não os deixasse usar a libra estrelina. Eamon De Valera e Michael Collins já tinham demasiadas causas de desentendimento entre si antes mesmo de chegarem às opções monetárias. A seguir à independência, a decisão de ficar com a libra esterlina foi tomada sem contestação pelo novo Saorstát Éireann (Estado Livre Irlandês), principalmente porque 90% do comércio da Irlanda era com o Reino Unido.
Mas o que aconteceu desde a independência? Durante os primeiros anos, toda a gente continuou a usar a libra esterlina como se nada se tivesse passado. Com o decreto sobre a cunhagem em 1926 e o decreto da moeda em 1927, a libra do Saorstát foi introduzida e, ainda que tenha havido alguma discussão sobre o assunto, foi decidido manter a ligação à libra esterlina em nome da estabilidade. A cunhagem irlandesa que começou a circular tinha o mesmo tamanho, aspeto e valor da cunhagem britânica, e era emitida no Reino Unido pelo mesmo Royal Mint da cunhagem britânica.
Desde a independência, ao longo dos tempos, a Irlanda já passou pela decisão de manter a libra esterlina como antes, por fazer parte de uma zona esterlina alargada, depois de uma zona esterlina atrelada ao dólar, por envolver a sua libra própria no Sistema Monetário Europeu, até chegar ao euro.
Foi instaurada uma comissão para a moeda, destinada a manter a libra irlandesa a par com a esterlina, e esta comissão existiu durante os primeiros cinquenta anos do Estado Irlandês. Depois de a libra esterlina ter abandonado o padrão-ouro em 1931, emergiu uma zona esterlina que incluía quase todos os países da Commonwealth, com excepções como o Canadá e Hong Kong. Quando os bancos centrais passaram a ser moda nos anos 30, a Irlanda criou um banco central em 1943, mas o seu objetivo era ainda manter a paridade com a libra esterlina. Através do sistema Bretton Woods, a libra esterlina passou a estar atrelada ao dólar americano por uma proporção fixa.
Quando o sistema Bretton Woods acabou, em 1971, e em 1972, o governo do Reino Unido, de acordo com os governos Irlandês, de Man, de Jersey e de Guernsey aplicou controlos de câmbio para outros países da zona esterlina, com excepção da Irlanda, da Ilha de Man e das ilhas do Canal. A zona esterlina foi racionalizada a estas jurisdições.
A crise da libra esterlina, em 1976, fez com que a Grã-Bretanha tenha recorrido a um resgate do FMI. Os EUA e a Alemanha usaram o empréstimo do FMI para obrigar a Grã-Bretanha a implementar um imenso número de mudanças internas. Por causa das flutuações erráticas da libra esterlina neste período de crise, a razão principal para a Irlanda manter a ligação à libra britânica, a estabilidade, tinha desaparecido. Em 1978, a Irlanda entrou no Sistema Monetário Europeu, de que o Reino Unido ficou de fora. Ainda que a ligação à libra esterlina fosse acabar por ser quebrada, a Irlanda tencionava manter a paridade monetária por tanto tempo quanto possível. No entanto, por causa das dificuldades financeiras constantes da Grã-Bretanha e da natureza instável da libra esterlina, a separação ocorreu cedo, em Março de 1979. A ligação da libra irlandesa à libra esterlina estava quebrada.
Mais uma vez em nome da estabilidade, a Irlanda associou a sua libra à Unidade Monetária Europeia em 1998 e, em 1999, o euro tornou-se a moeda da do país. As notas e moedas da libra irlandesa começaram a ser retiradas de circulação em 2002. Durante a crise da dívida pública da Zona Euro, disse-se que a libra irlandesa poderia voltar, mas esses rumores foram desmentidos pelo Banco Central Irlandês. Com o euro a afastar-se agora das suas dificuldades, é provável que se mantenha enquanto moeda da Irlanda a longo prazo. Como nação soberana, a Irlanda pode tomar opções monetárias diferentes no futuro, se isso lhe convier.
Desde a independência, ao longo dos tempos, a Irlanda já passou pela decisão de manter a libra esterlina como antes, por fazer parte de uma zona esterlina alargada, depois de uma zona esterlina atrelada ao dólar, por envolver a sua libra própria no Sistema Monetário Europeu, até chegar ao euro. A motivação principal e estruturante por trás destas decisões monetárias era a estabilidade. Será a mesma coisa para a Escócia a partir de 2016. O governo escocês acredita que os interesses da Escócia e do resto do Reino Unido são melhor servidos por uma zona esterlina (Plano A). Não tem nada a ver com auto-determinação. Se a libra esterlina passar em 2020 por uma crise como a dos anos 70, o governo da Escócia independente, SNP ou outro qualquer, fará o que fez a Irlanda: vai abandonar a libra esterlina sem hesitar e usar a libra escocesa, mantendo-a dentro dos limites estabelecidos com as moedas dos seus parceiros de mercado, por exemplo, a Zona Euro, os EUA, a Noruega, etc (Plano B). Se, em nome da estabilidade, um Plano C, D, E ou F se tornar mais desejável, poderemos escolher. É como ter independência - é o que fazem os países normais.
Sean O’Dowd integra o grupo Irish for Yes.
Publicado inicialmente no site Irish for Yes, a 10/08/2014. Traduzido por Mariana Vieira.
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