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A excepção polaca no novo tratado europeu
A Presidência Portuguesa da União Europeia ficou com um caso espinhoso para resolver. É que o Governo Polaco conseguiu introduzir uma polémica cláusula de excepção no rascunho do novo tratado da União Europeia. Na prática, esta cláusula de moralidade impedirá os polacos de protestar perante o Tribunal Europeu de Luxemburgo quando sejam acusados na Polónia de violar a moral pública e a integridade física e familiar. Neste artigo do diário espanhol El Pais a jornalista Cristina Galindo explica as implicações desta medida, cuja batata quente passa agora para a Presidência Portuguesa.
Artigo de Cristina Galinda. Tradução de Adriana Lopera.
Participe no protesto contra esta claúsula organizado pelos blogues "Devaneios Desintéricos" e "Coroas de Pinho"
Os Kackzynski não estão dispostos a que a entrada do país na UE os impeça de levar a cabo a sua campanha de limpeza da moralidade pública polaca. Para isso, a semana passada conseguiram introduzir, perante a perplexidade do resto de sócios, uma excepção na Carta dos Direitos Fundamentais do último rascunho do tratado europeu que só serve para a Polónia, e que deixa fora da protecção desta carta qualquer lei que elabore Varsóvia que esteja relacionada com a família, a moral pública e a integridade física. A inclusão desta cláusula de moralidade não é definitiva e ainda existe a possibilidade de ser eliminada do texto durante a presidência portuguesa da UE.
A cláusula, situada no artigo 18 do documento, deixa tudo claro: "A Carta (de Direitos Fundamentais) não afecta de modo algum o direito dos Estados membros (apenas a Polónia) a legislar no âmbito da moral pública, o direito de família, assim como a protecção da dignidade humana e o respeito da integridade física e moral humana".
Não se conhece ainda a sua aplicação prática exacta (este diário tentou sem êxito obter essa explicação por parte do Governo de Varsóvia), mas a frase não deixa lugar a dúvidas. Assim, o ultranacionalista ministro polaco de Educação, Roman Giertych (conhecido pelo seu radicalismo católico e pela sua homofobia) poderia levar a cabo sem problemas o seu plano- adjectivado de discriminatório por Bruxelas- de proibir aos/às professores/as de falar sobre a homossexualidade nas aulas. Como exemplo, se um professor chegar a ser despedido por mostrar nas suas aulas que é gay, não poderia recorrer ao Tribunal de Luxemburgo.
"Trata-se duma notícia muito má", explica Tomazs Szypula, da Campanha contra a Homofobia. "Significa que os polacos têm direitos diferentes do resto de países e que, se este artigo entrar em vigor, não se reconhecerão os poucos direitos que tínhamos conseguido", lamenta-se Szypula, que também espera que esta proposta caia durante o semestre da presidência portuguesa, que começou no dia 1 de julho.
Outra aplicação lógica desta cláusula de defesa da integridade física pode ser o aborto. Na Polónia, interromper a gravidez está permitido em caso de violação, malformação congénita ou risco para a vida da mãe. E aplica-se com dureza, como se viu no caso de Alicja Tísica, que solicitou o aborto perante a possibilidade da sua terceira gravidez agudizar a miopia de que sofria, mas o pedido foi-lhe negado e ficou cega. No passado mês de Abril, a Comissão Europeia dos Direitos Humanos condenou a Polónia por isso. Em Varsóvia, agiram como se nada fosse com eles.
Os gémeos estão a tentar há já algum tempo "com boas maneiras", e sem êxito, convencer o resto de membros da União da boa causa que a sua cruzada representa contra os homossexuais e o aborto. A semana passada tentaram impor sem êxito esta cláusula a toda a União Europeia. Um momento chave foi a reunião que se realizou na sexta feira passada, à qual assistiram o presidente francês Nicolas Sarkozy; o presidente do Governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero; o mandatário polaco, Lech Kaczynski; o primeiro ministro britânico, Tony Blair, e o Luxemburguês, Jean Claude Junker. Kaczynski insistiu em introduzir a cláusula da moralidade para todos os Estados membros. A proposta surpreendeu toda a gente.
Rejeitaram a oferta, mas essa cláusula introduziu-se apenas para os polacos.
Cristina Galindo, 28-06-2007
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