Dia-a-dia, o ano de 1968 em França

08 de maio 2008 - 0:00
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No ponto mais alto do mês de Maio de 1968 em França, dez milhões de trabalhadores estavam em greve, os transportes e os serviços públicos estavam paralisados, centenas de fábricas e de universidades ocupadas, os confrontos nas barricadas em Paris sucediam-se até a madrugada. Leia em seguida uma cronologia detalhada dos acontecimentos.





8 de Janeiro: Na inauguração da piscina da universidade de Nanterre, nos arredores de Paris, o ministro da Juventude e Desportos, François Missoffe, discute com o estudante Daniel Cohn-Bendit e é vaiado pelos estudantes.



9 de Fevereiro: Henri Langlois, director da Cinemateca, é substituído. Protestos no meio cinematográfico.



14 de Fevereiro: Manifestações estudantis, sobretudo em Nanterre, contra o regulamento das cidades universitárias. Três mil estudantes defrontam a polícia na Cinemateca.



11 de Março: Manifestação de metalúrgicos em Redon.



20 de Março: É atacada por manifestantes em Paris uma agência do American Express, como protesto contra a guerra do Vietname.



22 de Março: Incidentes na faculdade de Letras de Nanterre. Quatro alunos que protestavam contra a guerra do Vietname são presos. Os estudantes ocupam a torre administrativa da faculdade e o movimento alastra à Sorbonne e a alguns liceus. É criado o movimento 22 de Março, encabeçado por Daniel Cohn-Bendit, que viria a ser um dos mais activos da revolta.



23 de Março: O reitor da Faculdade de Letras suspende as aulas. Os estudantes invadem a escola.



27 de Março: Cohn-Bendit é preso e libertado pouco depois.



28 de Março: Grappin, reitor da Faculdade de Letras, suspende as aulas até 1 de Abril.

22 de Abril: Dois mil estudantes manifestam-se no Quartier Latin em solidariedade com Rudi Dutschke, líder da Liga de Estudantes Socialistas de Berlim, ferido com uma bala na cabeça num atentado contra a sua vida praticado por Josef Bachmann.



2 de Maio: Novos incidentes entre os estudantes e a polícia em Nanterre. Com a faculdade encerrada, os estudantes convocam um meeting para o dia seguinte na Sorbonne. Grappin suspende mais uma vez o funcionamento dos cursos. Oito estudantes são intimados a comparecer no dia 6 perante o Conselho de Disciplina da Sorbonne.



3 de Maio: No pátio da Sorbonne realiza-se a reunião de estudantes que exigem o acesso aos anfiteatros. O reitor, Jean Roche, quebrando uma regra secular, chama a polícia para entrar nas instalações universitárias. A polícia interrompe o meeting, expulsa os estudantes e encerra as instalações. Vários alunos são detidos. Muitos outros jovens são detidos nessa noite em manifestações no Quartier Latin, onde é levantada a primeira barricada, no Boulevard Saint-Michel.



4 de Maio: A revolta alastra aos liceus e às universidades do interior do país.



5 de Maio: 13 manifestantes detidos nos dias anteriores são sumariamente condenados.



6 de Maio: Oito dirigentes estudantis comparecem ao Conselho Disciplinar cantando A Internacional. O evento tem cobertura da TV e da rádio. Realizam-se novas manifestações no Quartier Latin e são erguidas barricadas. Exige-se a reabertura da Sorbonne e das restantes faculdades, bem como a libertação dos estudantes presos e a saída da polícia do Quartier Latin. Confrontos entre a polícia e manifestantes. Há 400 detenções e cerca de 600 estudantes e 345 polícias ficam feridos.



7 de Maio: Cerca de 30 mil estudantes percorrem as ruas de Paris cantando A Internacional. Em frente ao Parlamento, a palavra de ordem é: "O poder está na rua!". A polícia bloqueia o Quartier Latin e há novos confrontos. De Gaulle reage: "Não é possível tolerar a violência que grassa nas ruas."



8 de Maio: No Parlamento, o Ministro da Educação, Alain Peyrefitte, promete reabrir a Sorbonne e a Universidade de Nanterre em troca do restabelecimento da ordem. Mas os liceus, um após o outro, começam a fechar. Realizam-se novas manifestações.



9 de Maio: A Sorbonne continua encerrada. Centenas de estudantes sentam-se no chão no Boulevard Saint-Michel. Cohn-Bendit diz aos polícias: "Informamos os senhores agentes que hoje não combatemos. Será inútil provocarem-nos, porque não responderemos."



10 de Maio: Através da Rádio Luxemburgo, Alain Geismar, secretário-geral dos Sindicato dos Professores do Ensino Superior (Snesup), um dos líderes do movimento, mantém conversações em directo com o vice-reitor da Sorbonne. Mais tarde, há outra tentativa de diálogo entre o professor Alain Touraine e Cohn-Bendit. Ambas sem resultados.



Manifestações diante da prisão de La Santé. A polícia bloqueia as pontes do rio Sena. Os estudantes ocupam o Quartier Latin e fazem barricadas. Seguem-se os confrontos que se prolongam pela madrugada e seriam os mais violentos desde o início desta crise. Os estudantes tiram as pedras da calçada para atacar as forças policiais. Mais de mil feridos.



11 de Maio: As principais centrais sindicais, a CGT e a CFDT, convocam uma greve geral para dia 13 de Maio, de protesto contra a repressão. O primeiro-ministro, Georges Pompidou, interrompe a visita que estava a fazer ao Afeganistão e no regresso anuncia a reabertura da Sorbonne no dia 13 e a libertação dos estudantes detidos no início do mês.



12 de Maio: Prosseguem os confrontos entre polícia e estudantes, aos quais se juntam grupos de jovens operários.



13 de Maio: Greve geral e manifestações em todo o país. Em Paris, calcula-se que o desfile tem a participação de um milhão. Surge o grito "Dez anos, já chega!", que tem como alvo o presidente De Gaulle. A Sorbonne é reaberta e ocupada pelos estudantes. No Festival de cinema de Cannes as projecções são suspensas.



14 de Maio: O presidente da República, general De Gaulle, inicia uma visita à Roménia enquanto se desencadeiam novas greves: a fábrica da Sud-Aviation, em Nantes, é ocupada. O primeiro-ministro Georges Pompidou anuncia um projecto de amnistia.



15 de Maio: Os operários da Renault decretam uma greve e ocupam as instalações da fábrica em Cléon. A média de idades dos 4.500 trabalhadores é inferior aos 30 anos. Os 70 mil metalúrgicos de Billancourt seguem o exemplo.



16 de Maio: O movimento grevista alastra a mais de 50 empresas. A sede da Academia Francesa é ocupada.



17 de Maio: Já são cerca de cem mil os operários que ocupam fábricas em todo o país. Os sindicatos dizem que há 600 mil trabalhadores em greve. A paralisação alastra aos serviços públicos.



18 de Maio: O número de grevistas sobe para dois milhões. De Gaulle regressa da visita à Roménia.



19 de Maio: A emissão da ORTF (televisão) passa a ser controlada pelos jornalistas e técnicos.



20 de Maio: O número de grevistas já se eleva a dez milhões. Os transportes estão paralisados, o correio bloqueado, a gasolina começa a ser racionada. Ocupação do porto de Marselha pelos trabalhadores. A esquerda parlamentar pede a demissão do governo e a convocação de eleições gerais. O franco regista uma grande queda. Jean-Paul Sartre encontra-se com os estudantes da Sorbonne ocupada e diz que "é evidente que o presente movimento grevista teve a sua origem na insurreição dos estudantes."



21 de Maio: Os teatros de Paris estão ocupados.



22 de Maio: No Parlamento é derrotada uma moção de censura ao governo, mas por apenas 11 votos. As autoridades aproveitam a viagem de Daniel Cohn-Bendit (que tem nacionalidade alemã) a Berlim e a Amsterdão e retiram-lhe a licença de permanência em França.



23 de Maio: Novas manifestações e barricadas no Quartier Latin. Protestos contra a expulsão de Cohn-Bendit.



24 de Maio: Em Paris, uma manifestação estudantil grita "Somos todos judeus alemães", em solidariedade com Cohn-Bendit. Manifestantes ocupam a Bolsa de Paris, incendeiam as instalações e atacam esquadras de polícia. De Gaulle fala ao país e anuncia a realização de um referendo no prazo de um mês. Segunda noite de barricadas em Paris.



25 de Maio: Iniciam-se negociações entre os parceiros sociais. Novos confrontos com a polícia. A ORTF adere ao movimento grevista.



26 de Maio: Sindicatos, patronato e governo continuam à mesa de negociações. Na rua, manifestações de trabalhadores exigem aumentos salariais de 35%.



27 de Maio: Governo, sindicatos e patrões assinam um acordo que prevê o aumento do salário mínimo, redução do horário de trabalho e diminuição da idade da reforma.



28 de Maio: Demissão do ministro da Educação, Alain Peyrefitte. François Mitterrand anuncia a sua intenção de se candidatar à presidência "em caso de vazio político".



29 de Maio: A CGT faz uma enorme manifestação em Paris. A palavra de ordem mais gritada è "Governo popular". De Gaulle cancela a reunião do Conselho de Ministros e dirige-se secretamente a Colombey-les-Deux Églises e a Baden-Baden, na Alemanha, onde se encontra com as chefias militares.



30 de Maio: O General De Gaulle regressa a Paris e anuncia a sua recusa de se demitir. Dissolve a Assembleia Nacional (Parlamento) e convoca eleições antecipadas para Junho. Adia o referendo que anunciara dia antes. Circulam rumores dando como certa a intervenção do Exército no caso de a situação se deteriorar. Manifestação de apoio a De Gaulle em Paris.



31 de Maio: De Gaulle remodela o governo e realizam-se em todo o país novas manifestações de apoio ao general.



4 de Junho: Algumas empresas regressam ao trabalho.



5 de Junho: Regresso ao trabalho na EDF-GDF (Gás e Electricidade), nas minas, na siderurgia e dos trabalhadores do Estado.



6 de Junho: Os transportes voltam a circular.



7 de Junho: De Gaulle, em entrevista, aponta o estado caduco da universidade e a "tentativa de tomada de poder pelos comunistas". A Renault de Flins é violentamente desocupada pela polícia. Há confrontos.



10 de Junho: Novos confrontos com a polícia. Em Flins, novos confrontos com a polícia. Morre o estudante de liceu Gilles Tautin. Começa a campanha eleitoral.



11 de Junho: Confrontos com a polícia diante da fábrica da Peugeot em Sochaux : morrem dois operários. Reocupação da Renault de Flins pelos grevistas. A UNEF promove uma manifestação contra a repressão. Nova noite de barricadas no Quartier Latin.



12 de Junho: O governo proíbe as manifestações em todo o território francês e anuncia a dissolução de onze organizações políticas, entre as quais o Movimento 22 de Março, a Juventude Comunista Revolucionária (JCR, trotskista), e a União da Juventude Comunista (M-L), maoísta. Reabertura das aulas nos liceus.



14 de Junho: Evacuação do Odeon pela polícia. Retomada do trabalho nas fábricas Wonder (Saint-Ouen) e outras.



16 de Junho: A polícia acaba com a ocupação da Sorbonne.



17 de Junho: Fim da greve das várias fábricas da Renault.



Citroën em greve em 196824 de Junho: A Citroën volta ao trabalho.



27 de Junho: A ORTF volta ao trabalho. Evacuação da Escola de Belas-Artes pela polícia.



30 de Junho: A frente política liderada por De Gaulle vence as eleições gerais, com 43,6%. O Centro Democrático tem 10,3%, o PCF 20%, a Federação da Esquerda Democrática e Socialista (Mitterrand) 16,5% e o PSU 3,9%.



5 de Julho: Desocupação da Faculdade de Medicina de Paris pela polícia.



10 de Julho: Prisão de Alain Krivine, líder da JCR. Só será libertado no Outono.



13 de Julho: Maurice Couve de Murville sucede a Pompidou como primeiro-ministro.



29 de Abril de 1969: De Gaulle renuncia depois de se ver derrotado no referendo para transformar o Senado num corpo consultivo, ao mesmo tempo que ampliava os poderes aos concelhos regionais. Houve quem dissesse que o referendo foi um suicídio político cometido pelo presidente depois dos eventos traumáticos de Maio de 68.



9 de Novembro de 1970: De Gaulle morre subitamente, nas vésperas do seu 80º aniversário.

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