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A culpa é sempre dos palestinianos

Desde a ocupação dos territórios palestinianos em 1967 até aos dias de hoje, os cidadãos palestinianos acusados de crimes de segurança ou de outro tipo são julgados no sistema de tribunais militares israelistas dos Territórios Ocupados. Estes tribunais julgaram mais de 150 mil palestinianos. Outro dado impressionante é que metade dos presos que povoam as prisões israelitas estão nessa condição por decisão de tribunais militares.

Artigo publicado a 8 de Janeiro, no site Palestine Monitor.  

A justiça militar israelita na Palestina ocupada: os palestinianos são sempre culpados

"A justiça militar está para a justiça como a música militar está para a música"
Georges Clémenceau, Estadista francês (1841-1929)

A Yesh Din, uma ONG israelita de voluntários que se organizaram contra a violação dos direitos humanos dos palestinianos nos Territórios Ocupados, levou a cabo uma investigação detalhada sobre a implementação de direitos de defesa dos acusados nos Tribunais Militares Israelitas situados na Cisjordânia. As conclusões foram publicadas num exaustivo relatório intitulado "Procedimentos de Bastidores".

Este relatório contém informações precisas e de longo alcance sobre um sistema que constitui um pilar da ocupação israelita na Cisjordânia. As conclusões evidenciam claramente violações massivas dos direitos de defesa, desde o direitos das pessoas processadas a saberem as acusações que recaem sobre elas, de modo a poderem preparar uma defesa efectiva, até ao respeito por princípios básicos tais como a presunção de inocência e o direito a um julgamento público.

Justiça pronta a servir

Os voluntários da Yesh Din conduziram um impressionante estudo, baseado na observação de 800 procedimentos judiciais e na realização de entrevistas a pessoal dos tribunais militares israelitas e a advogados de defesa. As suas conclusões são demolidoras para Israel.

Por exemplo, foram analisadas 118 audições de suspeitos detidos, que se destinavam a decidir sobre a sua libertação ou não. Conclusão: estas audições duravam em média três minutos e quatro segundos e conduziram ao prolongamento da detenção em todos os casos menos um. Na verdade, a detenção de suspeitos ainda antes de qualquer julgamento no Tribunal Militar é quase sempre prolongada, e decidida em audições que terminam em poucos minutos.

Outras audições para autorizar "a prisão até ao fim dos procedimentos judiciais" duraram ainda menos tempo: em média, um minuto e 54 segundos. Em todas essas audições analisadas pela Yesh Din, o tribunal autorizou a detenção do palestiniano acusado. De acordo com os militares israelitas, no final de 2006, dois terços dos acusados cujos casos permaneciam sob a deliberação dos tribunais militares foram mantidos presos. Estas decisões foram tomadas em menos de dois minutos.

De facto, estes procedimentos legais são sistematicamente muito demorosos. A Yesh Din documenta que a primeira sessão do tribunal ocorre em média 61 dias depois da decisão de manter o acusado palestiniano na cadeia, a segunda sessão 51 dias mais tarde, e a média de dias entre quaisquer outras sessões posteriores é de 52. Assim sendo, os palestinianos são rotineiramente presos por mais de um ano, e às vezes durante mais de dois anos, enquanto esperam pelo julgamento.

Os palestinianos são sempre culpados

Os investigadores da Yesh Din constataram que durante o ano de 2006 os tribunais militares israelitas, num total de 9.123 casos concluídos, consideraram o réu palestiniano completamente inocente em apenas 23 casos. Ou seja, 0,29% dos casos! Ainda para mais, destes 9.123 casos, apenas 130 foram concluídos depois de um processo completo que consistia na apresentação de provas e na interrogação de testemunhas, o que representa 1,42% do total de casos concluídos em 2006.

A verdade é que a esmagadora maioria dos casos, 95% segundo a Yesh Din, foram concluídos através de plea-bargains (acordos em que o réu dava como verdadeiras a maior parte das acusações para evitar a condenação total).

Os tribunais militares israelitas condenam virtualmente todos os palestinianos indiciados, e isso sucede, na esmagadora maioria dos casos, sem um julgamento completo mas através de acordos em que o réu assume a culpa (plea-bargains). O relatório da Yesh Din analisa todos os motivos que levam as diferentes partes do processo judicial a decidirem-se pela assumpção da culpa do réu. Um deles tem que ver com o facto de "os advogados de defesa considerarem que a condução do julgamento até ao final, incluindo a convocação de testemunhas e a análise de provas, normalmente origina uma pena mais severa, enfim, uma espécie de "castigo" infligido pelo tribunal a um réu que não teve o bom senso de chegar a um acordo assumindo a sua culpa.

Por último, a Yesh Din analisa a forma como os advogados são impedidos de fazer correctamente o seu trabalho, o modo como os militares israelitas espiam as conversas entre advogados e clientes, ou como o sistema de tribunais militares israelitas - pensado apenas para julgar falantes de Árabe - utiliza o Hebreu como língua oficial e corrente, sem oferecer um sistema de tradução adequado.

Além da violência, o insulto: os militares israelitas respondem à Yesh Din

Com uma conduta profissional irrepreensível, os investigadores da Yesh Din enviaram um resumo do relatório às autoridades militares israelitas apropriadas procurando o diálogo e uma resposta oficial. De facto, receberam uma longa resposta, mas tiveram que abandonar a ideia original de a anexar na íntegra ao relatório, devido ao seu estilo desagradável e duríssimo, ao seu conteúdo insultuoso e repleto de distorções, e o "recorrente recurso a acusações sem fundamento em alternativa a respostas substantivas, ao mesmo tempo que ignora completamente a grande maioria das conclusões e recomendações do relatório".

O resumo do relatório da Yesh Din permite uma leitura curta mas penetrante, enquanto que o relatório completo constitui uma valiosa fonte de informação.

Tradução de Miguel Reis 

(...)

Neste dossier:

O Futuro da Palestina

Na semana em que o presidente dos EUA, George W. Bush, realiza a sua primeira visita ao Médio Oriente e garante que haverá um acordo de paz até o final do ano, o Esquerda.net preparou um dossier sobre as perspectivas actuais e o futuro da Palestina. O que se pode esperar depois de Annapolis? Como está a vida nos territórios ocupados e particularmente na Gaza cercada? E que solução para o território da Palestina histórica: dois Estados, ou um Estado?

Auto-estrada só para israelitas

Uma estrada de quarto faixas atravessa as colinas perto desta aldeia palestiniana, propiciando aos israelitas uma ligação rápida entre Jerusalém e a área de Telavive. Mas os condutores das aldeias que circundam a estrada não a podem usar, pois está vedada aos veículos palestinianos.

Um apelo de Gaza: acabem o cerco!

Um chocante relatório em primeira-mão acerca das condições de vida na Faixa de Gaza foi apresentado no dia 13 de Dezembro a um grupo de activistas pela paz israelitas. Eles reuniram-se na sede da organização Gush Shalom em Telavive para ouvir o testemunho do Dr. Eyad Sarraj, uma dos poucas pessoas que ainda consegue sair da "maior prisão da terra".

A democracia, uma ameaça existencial?

Um único Estado na Palestina histórica, baseado na igualdade, é a alternativa mais promissora a um já morto dogma dos dois Estados.

Declaração de Um Estado

A declaração seguinte foi aprovada pelos participantes de uma reunião realizada em Julho de 2007 em Madrid sobre a Solução de Um Estado, e a Conferência de Londres de Novembro de 2007. Ela considera que os esforços para concretizar uma solução de dois estados na Palestina histórica não conseguiram trazer paz e justiça para os povos palestiniano e israelita judeu, e defende uma solução democrática que ofereça uma paz justa, e portanto duradoura num único Estado, cujos princípios são detalhados em seguida.

A culpa é sempre dos palestinianos

Desde a ocupação dos territórios palestinianos em 1967 até aos dias de hoje, os cidadãos palestinianos acusados de crimes de segurança ou de outro tipo são julgados no sistema de tribunais militares israelistas dos Territórios Ocupados. Estes tribunais julgaram mais de 150 mil palestinianos. Outro dado impressionante é que metade dos presos que povoam as prisões israelitas estão nessa condição por decisão de tribunais militares.

Marwan Barghouti: nada indica que Israel fale a sério sobre acordo

A rede de televisão Al Jazeera entrevistou, por carta, Marwan Barghouti, uma das mais respeitadas vozes da Fatah, a facção do presidente Mahmud Abbas. Barghouti está a cumprir cinco penas de prisão perpétua, mas é apontado como o Nelson Mandela da Palestina e o possível futuro presidente. Na sua opinião, não há nada que indique que Israel fale a sério sobre atingir-se um acordo no próximo ano. Leia mais para ver a reportagem em vídeo, legendada em português.

Socorro! Um cessar-fogo!

O objectivo estratégico de Israel em Gaza é quebrar o Hamas. O método é simples, primitivo mesmo: reforçar o bloqueio por terra, mar e ar, até que a situação da Faixa se torne absolutamente intolerável. Mas mesmo os comandantes israelitas reconhecem que as forças do Hamas estão a consolidar-se. E se o exército israelita invadir Gaza para reconquistá-la, a população irá apoiar os combatentes.

As reivindicações palestinianas estiveram ausentes de Annapolis

Entrevista na rádio Democracy Now! da jornalista Amy Goodman ao palestiniano Mustafa Barghouti e ao israelita Daniel Levy sobre os resultados da Conferência de Annapolis, realizada a 28 de Novembro do ano passado.

Última chamada para uma Solução de Dois Estados?

O ponto de vista predominante em todo o mundo sobre a forma de resolver politicamente o conflito de dois nacionalismos em Israel/Palestina é a chamada solução de dois estados - isto é, a criação de dois estados, Israel e a Palestina, dentro das fronteiras do antigo Mandato britânico da Palestina. Na verdade, esta posição não tem nada de novo. Pode dizer-se que foi a posição prevalecente em todo o mundo durante a século XX.