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Como construir uma avaliação de desempenho alternativa?

Isto é, uma proposta de avaliação que estimule a reflexão profissional, mais do que o controlo burocrático? Cremos que essa proposta tem de ser construída a partir dos compromissos que os educadores e os professores possam assumir, de forma clara, reflectida e responsável, nos Projectos Curriculares de Escola e de Turma que, deste modo, deveriam deixar de ser entendidos, então, como documentos inócuos e inconsequentes do ponto de vista pedagógico.

Artigo de Ariana Cosme e Rui Trindade na revista "a página da educação", Dezembro de 2007.
 

É possível desenhar uma proposta de avaliação de desempenho alternativa àquela que o Ministério da Educação (ME) formulou?

Cremos que essa proposta não só é possível, como, mais do que isso, é necessária.

É necessária, em primeiro lugar, para que os nossos jardins-de-infância e as nossas escolas se assumam como contextos educativos o mais congruentes possível com os valores próprios e as finalidades de uma sociedade democrática. É necessária, por isso, quer para estimular a reflexão consequente dos educadores e dos professores sobre os sentidos e a qualidade dos projectos educativos que animam, quer para confrontar o ME com as suas respsonsabilidades políticas num domínio que também lhe diz respeito. A avaliação de desempenho é necessária, finalmente, para combater as meias-verdades e interpelar as respostas mágicas e ilusórias que se andam a semear acerca do papel redentor das escolas.

É, aliás, em nome dessa necessidade que pensamos ser imperioso denunciar e reprovar a proposta que o ME apresentou. É inaceitável que se possa afirmar a possibilidade de alguém avaliar até que ponto um educador ou um professor se relaciona «positivamente com as crianças proporcionando um clima favorável à sua segurança, ao seu bem-estar e ao seu desenvolvimento afectivo, emocional e social». O que é que isto significa? Em que condições é que este propósito é avaliável? Quais os instrumentos que se vão utilizar? Quem será capaz de realizar uma tal tarefa? Eis-nos perante um exemplo, entre muitos outros exemplos possíveis, retirado das grelhas de avaliação que o ME anexou à proposta por si divulgada, provando, de algum modo, que aquilo que a actual equipa ministerial deseja, através da avaliação do desempenho dos professores, nada tem a ver com os propósitos acima enunciados.

Como construir uma avaliação de desempenho alternativa? Isto é, uma proposta de avaliação que estimule a reflexão profissional, mais do que o controlo burocrático?

Cremos que essa proposta tem de ser construída a partir dos compromissos que os educadores e os professores possam assumir, de forma clara, reflectida e responsável, nos Projectos Curriculares de Escola e de Turma que, deste modo, deveriam deixar de ser entendidos, então, como documentos inócuos e inconsequentes do ponto de vista pedagógico. Seria através desses documentos, cuja matriz, assuma a forma que assumir, se configura em torno de três questões-chave, que a avaliação de desempenho de educadores e de professores se concretizaria.

Um projecto de avaliação que construiria, assim, os seus referentes fundamentais, a partir de uma primeira pergunta: O que é que eu espero que os meus alunos aprendam e realizem? Uma pergunta que justifica uma outra, «O que é que eu vou fazer para que os alunos aprendam e realizem aquilo que eu espero que os meus alunos aprendam e realizem?», e ainda uma terceira, «Como é que eu vou avaliar o desempenho dos meus alunos e o meu próprio desempenho?»

São estas as questões que poderão inspirar um outro tipo de postura profissional dos educadores e dos professores, em função da qual a problemática da avaliação do desempenho adquire uma importância estratégica nuclear para o desenvolvimento dessa mesma postura. Acaba-se, deste modo, com o paradoxo de uma avaliação de desempenho que estimula o individualismo, quando deveria estimular a colegialidade docente. Acaba-se, igualmente, com o absurdo de uma avaliação que se constrói em torno de referentes esotéricos, como aquele em que se afirma a necessidade dos docentes poderem contribuir para o desenvolvimento afectivo e emocional dos alunos. Criam-se, deste modo, as condições para que educadores e professores possam ser responsabilizados pelo trabalho que desenvolvem, explicitando os seus compromissos profissionais e sujeitando-os a um processo de auto-avaliação e de avaliação institucional que não os desqualifique.

Isto é, quando um educador ou um professor é capaz de responder às três perguntas, discutir, no seio de um colectivo de docentes, a legitimidade e pertinência das mesmas e tomar decisões em função da linha de rumo que essas respostas e essa reflexão possibilitam, cremos estarem reunidas as condições para que o seu desempenho possa ser entendido como um desempenho mais proactivo do que reactivo. Infelizmente, a proposta do ME parece investir mais na segunda das propriedades enunciadas do que na primeira, por razões em que o pedagógico não passa do embrulho adequado para esconder uma política de contenção orçamental cujos efeitos colaterais, no domínio da educação, serão devastadores quer em termos da degradação da auto e da hetero imagem profissional dos educadores e dos professores, quer em termos da natureza e da qualidade da intervenção que estes possam protagonizar como formadores.

Ariana Cosme e Rui Trindade

Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto

(...)

Neste dossier:

Dossier avaliação dos professores

O novo modelo de avaliação dos professores foi um dos motivos que levou 100 mil a virem para a rua gritar. Os docentes acusam a ministra de querer iniciar um processo altamente burocrático no terceiro período escolar, logo no momento em que os alunos mais precisam deles. E sublinham que não estão contra a avaliação mas sim contra este modelo. Neste dossier, o Esquerda.net analisa o novo diploma da avaliação de desempenho dos professores e as propostas alternativas que o governo recusa ouvir.

Proposta apresentada pela Fenprof

A 14 de Junho de 2006 a FENPROF apresentou um conjunto de propostas relativas à alteração ao Estatuto da Carreira Docente, no decurso de um processo iniciado pela exclusiva vontade do Ministério da Educação.

 

A avaliação do desempenho antes da inefável

A formidável máquina de propaganda do Governo tem repetido à exaustão uma mentira que, de tão repetida, assume foro de verdade inquestionável - os professores nunca foram avaliados e assim querem continuar.
E no entanto, desde Janeiro de 1990 - com a publicação do Estatuto da Carreira Docente - existe um modelo formal de avaliação do desempenho de todos os docentes da educação pré-escolar e do ensino básico e secundário e desde essa data todos os docentes foram avaliados nos termos da lei.
Artigo de Manuel Grilo, dirigente do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa (SPGL) 

Proposta alternativa, por Manuel Rodrigues

Em nada terá adiantado a luta dos Professores se não forem, de uma vez por todas, resolvidas as situações anómalas do Estatuto da Carreira Docente (ECD), porque é isso que, na essência de todos os problemas, está em causa.

Artigo de F. Manuel Rodrigues (Professor EB 2,3 Dr. Pedro Barbosa)

 

 

Proposta alternativa, por Ramiro Marques

A minha proposta vai no sentido de a avaliação de desempenho do professor ser feita no quadro da avaliação externa da escola. Essa avaliação externa seria feita, não apenas por inspectores, mas por um painel de personalidades formado por um inspector e mais duas personalidades exteriores à escola, designadas pelo ME, após consulta ao Conselho Pedagógico da escola.

Artigo de Ramiro Marques, composto a partir de vários posts do blogue ProfAvaliação
 

Como construir uma avaliação de desempenho alternativa?

Isto é, uma proposta de avaliação que estimule a reflexão profissional, mais do que o controlo burocrático? Cremos que essa proposta tem de ser construída a partir dos compromissos que os educadores e os professores possam assumir, de forma clara, reflectida e responsável, nos Projectos Curriculares de Escola e de Turma que, deste modo, deveriam deixar de ser entendidos, então, como documentos inócuos e inconsequentes do ponto de vista pedagógico.

Artigo de Ariana Cosme e Rui Trindade na revista "a página da educação", Dezembro de 2007.
 

Abordagem inovadora da avaliação

Proposta estudada pela Escola Superior de educação de Beja, entre 2005 e 2007O professor como actor principal da avaliação do seu próprio desempenho profissional. A sugestão é apresentada no Manual de Implementação do Modelo de Avaliação de Competências para Professores e Educadores, ferramenta que surge no âmbito do projecto TEVAL - Modelo de Avaliação das Competências Práticas de Professores e Formadores, coordenado pela Escola Superior de Educação/Instituto Politécnico de Beja, numa iniciativa que envolveu vários especialistas na área e docentes de Portugal, França, Grécia, Alemanha, Estónia e Reino Unido, entre 2005 e 2007.

Artigo de Sara Oliveira, publicado em educare.pt

O exemplo da Bélgica, por António Brotas

É importante que o Ministério da Educação, antes de tentar impor uma reforma global que pode estar radicalmente errada, se procure informar sobre as formas de avaliação dos professores adoptadas noutros paises da Europa, que parecem serem razoavelmente aceites pelos seus professores.

Texto de António Brotas  

A avaliação na Finlândia

Os directores das escolas são responsáveis pela avaliação da atmosfera de trabalho e aprendizagem nas escolas, avaliando-se colectivamente o trabalho dos professores no seu contributo para a "performance" da escola. A avaliação, sendo global, não atribui notas individuais aos professores. Por isso, a avaliação não afecta directamente os salários dos professores, dado que estes são pagos de acordo com os seus anos de trabalho.

Artigo de Paula Rauhala - Representante da Left Alliance no Conselho de Educação da Cidade de Helsínquia, Finlândia.  

Avaliação dos professores: qual a questão de fundo?

Na verdade, a finalidade máxima da avaliação já não tem como primeira preocupação assegurar a correspondência entre a qualidade do trabalho produzido e a qualidade da carreira, mas, antes, controlar administrativamente o acesso a determinados patamares profissionais, tendo em vista a obediência a critérios económicos e financeiros.

Artigo de Manuel Matos, publicado na revista "a página da educação", Março de 2008   

O gigantismo desta avaliação

Como alguns colegas sabem, eu tenho uma opinião muito crítica relativamente ao conteúdo do decreto regulamentar da avaliação de desempenho dos professores. Contudo, é claro para todos nós que a crítica ou a defesa deste modelo de avaliação apresentado pelo ministério da educação constituem posições legítimas, desde que, ambas as posições, se sujeitem ao debate argumentativo, se sujeitem ao escrutínio do contraditório.

Comunicação de Mário Carneiro em Colóquio sobre a Avaliação de Desempenho dos professores, 27/02/2008. Publicado aqui