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“Orçamento vem demonstrar urgência da reestruturação da dívida pública”

Em entrevista à Antena 1, Catarina Martins identifica o “peso da dívida pública”, que absorve quase tantos recursos como o Serviço Nacional de Saúde e mais que a escola pública, como um dos “maiores problemas” do Orçamento do Estado para 2017.
"Este não é o Orçamento que o Bloco faria. Para nós, o maior problema deste Orçamento é o peso da dívida pública".

“Quem não quiser ter transparência não pode estar na Caixa”.

A coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, foi entrevista esta quarta-feira pela Antena 1. Questionada sobre a polémica em torno da Caixa Geral de Depósitos afirmou que “a posição do Bloco de Esquerda é clara e acompanhada pela maioria do país e, até, por todos os partidos.

“Quem não é capaz de cumprir obrigações de transparência não pode estar à frente da Caixa Geral de Depósitos. A administração da Caixa deixou prolongar demais este problema”, critica.

“O Bloco de Esquerda votou no Parlamento um projeto de lei que, não sendo inovador, porque não dava nenhuma responsabilidade aos administradores da Caixa que eles não já tivessem, reforçava essa obrigação. Mas, isso foi no seguimento do que disse o Presidente da República, o primeiro-ministro, todos os partidos da Assembleia da República e o Tribunal Constitucional”, sublinha.

“Os administradores da Caixa não estavam à espera que a Assembleia da República mudasse a lei para não os obrigar a apresentar [a declaração de rendimentos] ou, muito menos, que o Bloco de Esquerda fosse contra a transparência”.

“A votação na Assembleia da República não deu nada de novo em relação aquilo que já se sabia ser uma obrigação. E, também, não deu nada em relação ao que as pessoas esperam do Bloco de Esquerda: combate pela transparência”.

“Quem não quiser ter transparência não pode estar na Caixa”, explica Catarina Martins.

“A Caixa é um banco sólido, é o maior banco português, é um banco que vem de um processo de negociação muito duro com a Comissão Europeia para ser recapitalizado do ponto de vista público. Deve ser notícia por isso e pela sua capacidade de dinamizar a economia, de criar emprego, de haver investimento. Uma administração que não percebe isso não tem lugar na Caixa”.

Perguntada sobre se o “ruído” em torno do banco público tem prejudicado a atividade da Caixa, explica que “em relação à transparência, o ruído foi criado pela administração ao não entregar as declarações. É lamentável, não devia ter acontecido”. Contudo, sublinha Catarina Martins, “o Bloco também reconhece que a direita tem tentado criar algum ruído contra o processo de recapitalização. A direita sempre quis fragilizar a Caixa para depois obrigar à sua privatização, que estava aliás no programa do PSD”.

Salários da administração da CGD: Catarina Martins critica hipocrisia do PSD

Confrontada com a proposta do PSD para fixar o teto dos salários dos gestores públicos no salário do primeiro-ministro, Catarina Martins recorda que “o Bloco de Esquerda fez essa proposta, precisamente no Orçamento do Estado, e o PSD não fez com que a proposta passasse”.

“Bastava que o PSD tivesse votado a favor com o Bloco e já era assim. O PSD absteve-se e com isso a proposta foi chumbada. Portanto, talvez seja bom não levar demasiadamente a sério essa proposta”, esclarece.

“Tanto quanto eu sei, a proposta tradicional do PSD é assim: os salários dos gestores públicos são limitados ao salário do primeiro-ministro, exceto quando há uma empresa no mercado, e, portanto, o ministro das Finanças pode pagar o salário médio dos últimos três anos. O que quer dizer que boa parte dos administradores da Caixa podiam estar a ganhar mais do que estão a ganhar”.

“Este não é o Orçamento que o Bloco faria”

“Nós fizemos um acordo com o Partido Socialista sobre a recuperação de rendimentos do trabalho em Portugal. Porque quem vive do seu trabalho, quem trabalhou toda uma vida, teve enormes cortes nos anos de governação da direita. Iria continuar a ter cortes se a direita continuasse no governo, era essa a proposta”, recorda.

“Mesmo com o Partido Socialista, se tivesse maioria absoluta, no programa com que foi a eleições previa cortar nas pensões, previa uma serie de formas de precarização maior do trabalho – regime conciliatório do despedimento, etc. Nós fizemos um acordo que tem que ver com recuperar rendimentos e também recuperar proteção laboral. Porque tem não tem proteção laboral acaba por nunca ter salário, quem é precário ganha sempre três vezes e meia menos, em média, menos em relação a quem tem contrato de trabalho efetivo”, esclarece a coordenadora bloquista.

“Neste Orçamento há duas medidas que, para nós, são muito importantes. Por um lado, do ponto de vista de recuperação de rendimentos, mantém-se a trajetória que o outro Orçamento já tinha, nomeadamente com o fim da sobretaxa. Mas, há um olhar especial para as pensões, porque os pensionistas tinham sido particularmente vítimas da austeridade. Este aumento extraordinário das pensões - o maior aumento da década - foi muito negociado, foi muito difícil e ainda bem que foi possível”.

“A outra parte que, para o Bloco de Esquerda é muito importante, foram as negociações sobre a precariedade. Tanto a alteração a uma lei que combate a precariedade no setor privado, o reforço da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), para que possamos identificar e resolver os abusos que existem. E, também, o acordo de princípio para integrar os precários, porque não pode o Estado dar o mau exemplo, recorrendo a trabalho precário, tantas vezes contra a lei”.

“Este não é o Orçamento que o Bloco faria. Para nós, o maior problema deste Orçamento é o peso da dívida pública, vamos gastar mais de 8 mil milhões de euros só em juros da dívida, quase tanto como em todo o Serviço Nacional de Saúde, mais do que na escola pública”.

“Embora o Orçamento combata o défice, vai ser o Orçamento com menor défice, se for cumprido, da democracia portuguesa, na verdade faz isso à conta do investimento na escola, nos hospitais, na cultura e na ciência, que todas as pessoas percebem ser precisa neste país. Para o Bloco de Esquerda, a urgência da reestruturação da dívida pública é uma urgência que este Orçamento só vem demonstrar. Temos que fazer caminho sobre essa proposta.

Apelo a compromisso para retirar medidas da troika da legislação laboral

“Com a troika foi destruída a contratação coletiva e foram precarizados os postos de trabalho. Nós precisamos de recompor a legislação do trabalho. Quando um trabalhador ou uma trabalhadora está perante a sua entidade patronal não é uma relação de iguais. O trabalhador está numa relação mais frágil”, assevera a também deputada.

“A legislação laboral não é uma legislação comercial, não é como se fosse uma relação entre duas partes iguais. Tem que defender a parte mais frágil que é a do trabalhador.

“Nós achamos que um compromisso mínimo com o Partido Socialista seria retirar aquelas normas [do Código do Trabalho] que a troika obrigou a pôr”.

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