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A urgência de mudar de modelo de segurança alimentar

A situação atual põe em perigo a vida das gerações futuras e a própria vida na terra e necessita uma mudança radical e urgente. Artigo de Samuel Thirion, que participará no debate “Soberania e segurança alimentar, que relação com os circuitos curtos locais”, com Carmen Ibañez, no Fórum Socialismo 2017.
A situação atual põe em perigo a vida das gerações futuras e a própria vida na terra e necessita uma mudança radical e urgente
A situação atual põe em perigo a vida das gerações futuras e a própria vida na terra e necessita uma mudança radical e urgente

O problema: a urgência de mudar de modelo de segurança alimentar

A segurança alimentar é hoje em dia garantida por um modelo produtivista de agricultura intensiva utilizando produtos químicos, energia fóssil e muita água, concentrada em grandes explorações agrícolas e com circuitos de transformação agroalimentares e de distribuição longos (em média, os alimentos percorrem 1500 km desde o campo de produção até o prato do consumidor). Resulta no consumo alimentar com excesso de carne, açúcar e sal e absorção de biocidas e graves problemas de saúde humana (obesidade, diabete, cancro, e, mais preocupante, degradação do património genético humano como, por exemplo, na redução da fertilidade e no desenvolvimento do autismo nas crianças), para além da perca do contacto com a natureza e da noção mesmo de alimentação sã.

Este modelo não é sustentável porque funciona ao custo da destruição dos ecossistemas e da biodiversidade, participando fortemente no aquecimento global (24% das emissões com efeito de estufo), para além dos enormes desperdícios (mais de 30%) ao longo de toda a cadeia dos circuitos de produção e distribuição e do tratamento humanamente inaceitável dos animais nas grandes unidades de pecuária intensiva. Esta situação põe em perigo a vida das gerações futuras e a própria vida na terra e necessita uma mudança radical e urgente da maneira de garantir a segurança alimentar.

Soluções

Soluções existem nomeadamente com 1) a agroecologia (agricultura biológica, permacultura,…) produzida a nível local a escala humana; 2) circuitos curtos e relações diretas, solidárias e de corresponsabilidade entre produtores e consumidores; e 3) sistemas de solidariedade social considerando a alimentação sã como um bem comum e um direito universal. São os 3 caracteres de uma segurança alimentar com soberania alimentar construída a partir do nível local, ou seja com autonomia na resolução do direito a uma alimentação sã para todos sem impacto social ou ambiental negativo (ver a definição da soberania alimentar proposta em 1996 na FAO por Via Campesina).

Demonstração

O relatório de Olivier de Schutter, quando era Relator do Direito da Alimentação nas Nações Unidas demonstra que a agroecologia pode alimentar o mundo inteiro respeitando o ambiente, mesmo com 9 ou 15 mil milhões de habitantes como se prevê até ao fim do século XXI.

Isto implica contudo uma inversão da tendência da redução do número de ativos na agricultura o que pode ser facilitado acabando com os desperdícios e organizando formas de produção participativa (jardins partilhados, produção alimentar dentro das cidades).

A chave da transformação: a cidadania

Esta mudança necessária só pode vir dos cidadãos, nomeadamente com a organização de circuitos curtos a nível local não numa base de uma relação mercantil mas uma relação solidaria e corresponsável entre quem produz e quem consume. Os AMAP (Associações para a Manutenção da Agricultura de Proximidade) são exemplos disto. As suas mais-valias económicas, sociais e ambientais são tão elevadas que estão naturalmente em via de extensão no mundo inteiro (tendo começado no Japão nos anos 1960), mesmo sem apoio. Mas a sua velocidade de difusão é insuficiente!

Necessidade de políticas de apoio corajosas

Tendo em conta a urgência da transformação, a cidadania para a soberania alimentar não poderá desenvolver-se a uma velocidade suficiente sem uma política de apoio corajosa, ou seja desligada dos interesses dos grandes lóbis agroindustriais e dos interesses a curto prazo. Exemplos de medidas possíveis:

  • Incentivos a constituição de uma plataforma de concertação e codecisão em cada freguesia ou município com todos os atores ou seus representantes (agricultores, consumidores individuais e coletivos, autoridades publicas, associações serviços técnicos públicos – Ministério- e privados). Esta plataforma seria encarregada de elaborar e realizar um plano de reconversão da agricultura intensiva a agroecologia em todo o território
  • Base de dados de todas a soluções possíveis e programa da formação de animadores destas plataformas
  • Apoio à constituição de redes nacionais ou internacionais de intercâmbio entre as iniciativas como por exemplo a Rede Portuguesa das AMAP em fase de constituição
  • Reorientação do ensino agrícola e da investigação agronómica em prioridade sobre as diversas formas de agroecologia.
  • Taxação carbono e de todas as externalidades ambientais negativas segundo o princípio do poluidor pagante e utilização desta fonte financeira para suportar a reconversão.

Artigo de Samuel Thirion, que participará no debate “Soberania e segurança alimentar, que relação com os circuitos curtos locais”, com Carmen Ibañez, no Fórum Socialismo 2017. O debate será sábado 26 de agosto, às 10h na Sala 3.

Termos relacionados Fórum Socialismo 2017, Sociedade
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