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Trabalhar para ganhar a liberdade, por Oriol Junqueras

Artigo publicado pelo vice-presidente da Catalunha, Oriol Junqueras, no Diário Ara, no dia da sua prisão. Nele, o presidente da Esquerda Republicana da Catalunha demonstra que já previa a prisão e faz um apelo à unidade de ação e a uma estratégia em comum de todos os que respeitam a cidadania.
Oriol Junqueras, vice-presidente do governo catalão e líder da ERC, faz um apelo à unidade de ação e a uma estratégia em comum de todos os que respeitam a cidadania
Oriol Junqueras, vice-presidente do governo catalão e líder da ERC, faz um apelo à unidade de ação e a uma estratégia em comum de todos os que respeitam a cidadania

Há dois dias apenas, falava com o amigo e Conselheiro Romeva sobre a ameaça de prisão que pesava sobre todos nós. As palavras do Procurador-Geral, Maza, “mais dura será a queda”, não pressagiavam nada de bom. De facto, já víramos no caso dos Jordis como dois dias antes de serem encarcerados já se comentava nos meios políticos e jornalísticos que a ordem seria de prisão. Ocorreu de novo a mesma coisa, cinco minutos de declarações foram suficientes. Oito conselheiros do Governo da Catalunha, incluído eu mesmo, estamos hoje na prisão, por aplicação do código de justiça que rege o Estado espanhol. Fomos intimados através dos meios de comunicação social, terça-feira; só recebemos a convocatória na quarta-feira, dia feriado, em menos de 24 horas éramos intimados a comparecer à Audiência Nacional de Madrid para nos defendermos de acusações que podiam somar 30 anos de prisão para cada um de nós.

Dizia terça-feira o Conselheiro Romeva que se o preço da liberdade era a prisão, pagaríamos este preço. Disse-o com veemência, usando palavras serenas e claras, com uma dignidade que me tocou, enquanto partilhava com alguns de nós, também na presença dos conselheiros e amigos Carles Mundó, Jordi Turull e Josep Rull, que nestes dias já se tinha ido despedindo da família, dos filhos, da sua mulher, dos amigos. O mesmo que tínhamos feito todos nós, tentando passar os últimos dias próximos dos nossos, dos que mais estimamos, dos meus dois filhos que, pequenos como são, ainda não podem entender o que se está a passar.

Desde há dias que estamos muito conscientes do nível de agressividade do governo do PP, legitimado pelo PSOE. Permiti-me que, com toda a serenidade, me pergunte se teria sido possível a aplicação do 155 sem a absoluta cumplicidade do PSOE e, tristemente também, do PSC. Sem o PSC, entregue de corpo e alma ao PP, o nosso destino não seria hoje a prisão. Nem os Jordis estariam encarcerados. A sua legitimação para perpetrar esta cena de repressão foi imprescindível. Entre a voz do povo, entre aqueles que só querem votar e decidir e o autoritarismo de um partido como o PP, a direção do PSC escolheu a repressão, a suspensão das liberdades, a liquidação das instituições e a prisão de todos nós.

E não o digo com aspereza, porque sinto pena, verdadeira lástima, por um partido que acabou enredado em manifestações ao lado do PP e da extrema-direita, lado a lado do partido mais corrupto da Europa, ferozmente ao lado do partido de tradição democrática mais escassa que tenha podido existir, do partido que recolhia assinaturas “contra a Catalunha” com Rajoy na chefia, do partido que converteu o aparelho judicial num órgão servil, que naturalizou a corrupção a todos os níveis e que conspira a partir do próprio Ministério do Interior para fabricar calúnias, arruinar pessoas ou destroçar a Previdência pública. E tudo, tudo, com absoluta impunidade.

Mas não é a estes que quero dedicar mais palavras. Não vale a pena. Diz o versículo da Bíblia “Senhor, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem”. Desta forma, esquecemos toda a dor que nos querem infligir e não nos deixamos arrastar por outro sentimento que não seja o amor à liberdade. Precisamos de dedicar todas as nossas energias a defender a democracia, a organizar a defesa dos direitos civis e políticos, a trabalhar para ganhar a liberdade, a seguir trabalhando para que se respeitem os direitos civis e políticos de todos e cada um dos cidadãos da Catalunha, nascidos onde quer que seja, falem a língua que falem, sintam-se catalães, espanhóis, árabes ou argentinos, ou talvez tudo ao mesmo tempo. Esta luta não é de bandeiras, é por democracia, é para permitir que a voz da cidadania seja respeitada. E temos de continuar a fazê-lo, com determinação, com coragem, mas também com absoluto respeito pelas ideias de todos e civicamente, repudiando toda a expressão de violência, a começar pela única que estamos a ver nas ruas, a da extrema-direita que atua com toda a impunidade.

Também quero pedir aos partidos e às entidades que façam todos o seu trabalho, cada qual no seu lugar, com uma sólida unidade de ação. E por favor, peço a concórdia e a harmonia de todos, basta de debates e de polémicas sobre como se apresentará cada partido às eleições. Basta, este debate só nos faz mal e leva-nos a perder de vista todo o trabalho que é preciso continuar a fazer. Já vivemos este episódio e foi nefasto. Cada qual que escolha a melhor fórmula para concorrer às eleições, que nenhum democrata fique em casa no 21-D, que nenhuma pessoa que preza a liberdade deixe de ir votar, que cada partido se esforce por obter o melhor resultado possível e que a unidade de ação e uma estratégia partilhada seja o que nos una, com respeito a todas as sensibilidades.

Também me permito, como presidente da ERC, de fazer chegar uma mensagem a todo o povo da Esquerda Republicana da Catalunha e a todas aquelas pessoas que foram aderindo nos últimos anos. Quero-vos a todos unidos, como sempre, dando apoio à secretária-geral, Marta Rovira, uma grande mulher que desfruta de toda a nossa estima e confiança, ela é o futuro. Sei que seguireis somando e somando, construindo uma grande política ao serviço da liberdade e da justiça, quero que sigamos sendo um exemplo de honestidade, de rigor, de boas pessoas. De facto, quanto a isso estou muito calmo, porque estou rodeado de gente que é muito melhor que eu, de pessoas com uma grande capacidade e um compromisso inequívocos. Os estimados Joan Tardà e Gabriel Rufian, em representação de todos os deputados e senadores, não afrouxem, amigos!, é um prazer e uma honra partilhar este caminho com vocês; com Chaquir, Alba Vergés, Roger Torrent e todo o grupo parlamentar, sois muito boas pessoas; todos os presidentes de câmara e vereadores que deixam a pele todos os dias, todos e cada um dos militantes que trabalham com paixão em cada um dos seus municípios. Recordai bem o que vos digo, somos aqueles que nunca se cansam, somos os que nunca se rendem!

E finalmente, uma mensagem a todo o povo de Catalunha. Apostamos tanto que jogamos tudo. Sejamos dignos de todos os que nos precederam, pensai nos vossos filhos, pensai em que estamos diante de uma operação de castigo às liberdades, contra a Catalunha, que nos querem ver de joelhos, submissos, que nos querem converter numa província, que atiçam o ódio contra a escolha catalã para criar um problema onde este não existia, que atentam contra todas as nossas decisões e vontade, que fomentam a fuga de empresas com toda a falta de vergonha, que alimentam a economia especulativa e desprezam a economia produtiva, que nem ao menos se comprometem a respeitar as eleições que eles mesmos convocaram.

E diante de tudo isto, serenidade, determinação, mobilização, compromisso e votos nas urnas; damos um exemplo votando em massa, como fizemos no dia 1 de Outubro, apesar dos golpes de cassetete e da brutalidade policial contra os cidadãos que queriam votar. Pois agora, voltamos a votar, porque para nós as urnas são sagradas e a melhor resposta que podemos dar é uma vitória da democracia em 21 de dezembro. Trabalhamos sem descanso, prosseguimos, perseveramos, com o ânimo bem alto e a alma ditosa.

Um abraço fraternal a todos os catalães, somos um grande povo e temos de estar orgulhosos.

Venceremos! Não duvidem, por difícil que seja o caminho, porque a causa que representamos é a da liberdade e a fraternidade entre todos os povos.

Publicado originalmente no diário Ara, em catalão.

Tradução de Luis Leiria para o Esquerda.net

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