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Parlamento aprova co-adoção por casais do mesmo sexo

No Dia Internacional contra a Homofobia, o Parlamento português discutiu três propostas sobre a adoção de crianças por casais homossexuais. O projeto de lei que consagra a co-adoção pelo cônjuge ou unido de facto do mesmo sexo conseguiu reunir os votos necessários para a aprovação. Mas ainda não foi desta que a adoção plena ficou inscrita na lei portuguesa.
Com a decisão de hoje, abre-se a possibilidade de co-adoção para as crianças que já vivem com casais do mesmo sexo. Foto Paulete Matos

O projeto de lei apresentado por um grupo de deputados do PS foi aprovado com 99 votos a favor, 94 contra e 9 abstenções, repartidas igualmente pelas bancadas do PS, PSD e CDS. À esquerda parlamentar juntaram-se 15 deputados do PSD no voto favorável que permitiu a aprovação da lei. No voto contra estiveram a maioria das bancadas do PSD e CDS e dois deputados do PS. Este projeto de lei consagra a co-adoção ao cônjuge ou unido de facto da pessoa que já detenha a responsabilidade parental em relação a um menor, caso não exista um segundo vínculo de filiação da criança. 

"Num casal de sexo diferente recém-casado, por exemplo, o cônjuge – mesmo que conheça o filho há um mês - pode co-adotar, caso a criança só esteja legalmente registada no nome da mãe. Mas numa família em que duas mães planearam e levaram a bom termo a gravidez, a criança não tem, nem pode ter em Portugal, um vínculo legal de qualquer espécie à mãe não biológica. Isto não faz sentido. Salta aos olhos", defende o projeto de lei que a deputada Isabel Moreira apresentou no plenário. 

O Bloco de Esquerda apresentou dois projetos de lei para eliminar a impossibilidade legal de adoção e apadrinhamento civil por casais do mesmo sexo e para alterar o Código do Registo Civil no mesmo sentido.  "Todas as famílias, todas as crianças, os mesmos direitos. E para consagrar estes direitos é preciso mudar a lei", explicou a deputada bloquista Cecília Honório durante o debate desta sexta-feira, lembrando que "o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos veio pôr Portugal na lista negra" por restringir este direito à co-adoção e saudando o "exemplo digno de França, na consagração do casamento e adoção" no passado dia 12 de fevereiro.

"É pelo fim desta discriminação e pelo superior interesse das inúmeras crianças que, em Portugal, aguardam a oportunidade de uma família que as acolha e lhes dê todos os cuidados a que têm direito, que se impõe a consagração deste direito na legislação nacional", defende o projeto de lei do Bloco. Ambos os projetos foram rejeitados pela maioria das bancadas da direita e a abstenção do PCP, tendo os votos favoráveis do Bloco, da grande maioria da bancada do PS e do PEV.  

O mesmo resultado teve a iniciativa do PEV para alargar as famílias com capacidade de adoção aos casais homossexuais. "A sociedade tem o direito de garantir uma boa família a todas as crianças (e boas e más famílias não dependem das orientações sexuais dos seus membros, existindo ambas em casais homo ou heterossexuais), e é às instituições que têm competências nas diversas etapas de um processo de adoção que compete decidir se determinada família tem ou não condições objetivas para garantir o que de melhor se pode oferecer para criar uma criança", defendia a proposta dos Verdes.

Associações aplaudem progresso na lei

A par do debate legislativo, a associação ILGA Portugal entregou em março uma queixa contra o Estado português, em nome de dez famílias a quem é negado o registo da parentalidade a ambos os membros do casal. "Recentemente, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos condenou a Áustria por não permitir a co-adoção em casais do mesmo sexo, quando a permite para casais de sexo diferente. Não temos dúvidas de que esta violação de Direitos Humanos acontece em Portugal e queremos, portanto, que a justiça para as famílias arco-íris não falhe – e também não tarde", disse Luís Grave Rodrigues, o advogado que representa a ILGA nesta ação judicial.

O dirigente da ILGA Paulo Corte-Real afirmou que a aprovação desta lei “é uma vitória dos direitos humanos, das crianças e das famílias” porque diz respeito "à proteção de crianças que já existem, à garantia de que terão direito ao reconhecimento das suas figuras parentais a todos os níveis, na saúde, na educação e em caso de eventual morte da única pessoa que era legalmente reconhecida”, afirmou.

Para Paulo Vieira, da Associação Não Te Prives, foi dado esta sexta-feira "um passo na proteção das centenas de crianças que existem em Portugal e que não tinham legalmente as suas famílias reconhecidas". No entanto, declarou à agência Lusa que este "é claramente um passo mais que coxo" contra a discriminação, por ficar uma "particular incongruência legislativa" no que toca à adoção plena dos casais homossexuais. "Não é igualdade plena e portanto a discriminação fica plasmada de novo na lei em Portugal e continuamos com uma desigualdade legislativa, institucional, forte em Portugal, que na realidade só reforça depois as formas de discriminação que esta população sofre", concluiu Paulo Vieira.

Também a Associação de Homossexuais Católicos "Rumos Novos" se congratulou com a aprovação da lei num “dia já de si histórico” e “é um primeiro passo importante no sentido de vir a alargar as famílias com capacidade de adoção aos casais do mesmo sexo, que esperamos possa a vir a acontecer num futuro próximo”.

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