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“O país humaniza-se quando permite a escolha de quem está em sofrimento”

Durante o encerramento da conferência sobre a despenalização da morte assistida, Catarina Martins afirmou que “é sobre a nossa capacidade de respeitar o direito das pessoas no fim de vida que falamos nesta iniciativa”. Proposta do Bloco é entregue esta semana no Parlamento.
Foto de Nuno Fox, Lusa.

“Não há quase ninguém neste país que não compreenda o que é o drama de alguém que, perante uma doença incurável que levará irremediavelmente à morte com um sofrimento terrível, peça ajuda para que esse sofrimento acabe e essa ajuda lhe seja negada”, afirmou Catarina Martins durante a sessão de encerramento da conferência sobre a despenalização da morte assistida, organizada pelo Bloco de Esquerda.

“Por todo o país, o que vimos nestes dois anos de debate foi tantas pessoas que conheciam da maneira mais dura, da maneira mais cruel, a impotência de valer a alguém que foi condenado a um sofrimento atroz depois de já ter sido condenado por uma doença sem cura”, acrescentou a coordenadora bloquista, sublinhando que “é sobre a nossa capacidade de respeitar o direito das pessoas no fim de vida que falamos nesta iniciativa”.

Para Catarina Martins, “ninguém pode ser obrigado a ser amarrado ao sofrimento”.

“É tão digno o fim de vida de quem decide suportar todo o sofrimento, como é digno o desejo de antecipar a morte para parar esse sofrimento que se considera inútil e irremediável. O que é indigno é um país que negue essa opção a quem quiser controlar o seu fim de vida”, defendeu.

“O país humaniza-se quando permite a escolha de quem está em sofrimento”, assinalou ainda a dirigente do Bloco.


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Catarina Martins explicou que, “com este projeto, queremos despenalizar e regulamentar a morte medicamente assistida - despenalizar a prática por parte dos profissionais de saúde e regulamentar o processo de decisão com as devidas garantias de como este processo se faz”.

“O projeto de lei do Bloco vai entrar agora no parlamento, vai seguir o seu rumo de debate e é bom que possamos debater cada aponto afincadamente, com mais propostas se existirem, e corrigindo, chegando a consensos que sejam alargados sobre todos estes pontos, mas sem fantasmas, sem confundir o que não deve ser confundido”, vincou.

Abrir o espaço da tolerância e do respeito pela dignidade de todas as pessoas

José Manuel Pureza afirmou que o projeto bloquista visa aumentar “o campo da tolerância e o respeito da livre decisão pelas pessoas em fim de vida, não punindo os profissionais de saúde que entendam agir de acordo com esse princípio de tolerância e de respeito pela livre decisão”.

Referindo-se aos argumentos dos conservadores, o deputado bloquista destacou que a proposta do Bloco “dá uma resposta clara a essa estratégia de contaminação do debate pelos fantasmas do medo”.

Em primeiro lugar, definindo “com o máximo rigor as condições e requisitos a preencher pelo doente que peça a antecipação da morte”, o que implica “a cumulação de quatro elementos: um diagnóstico (doença incurável e fatal ou lesão definitiva), um prognóstico (a doença em causa tem que ser incurável e fatal), um estado clínico (sofrimento duradouro e insuportável) e um estado de consciência (capacidade de entender o sentido e o alcance do pedido)”.

Em segundo lugar, o Bloco estabelece “como referência inabalável o respeito pela vontade livre e esclarecida do doente”. A proposta exclui, por isso, menores e doentes mentais do universo de requerentes legítimos da antecipação da morte.

A proposta consagra ainda a “garantia de um rigoroso cumprimento da lei, através de um mecanismo de validação prévia do procedimento seguido, mecanismo que não existe nas leis dos outros países que legalizaram a morte assistida”.

No que respeita ao argumento do autoritarismo, José Manuel Pureza avançou que os conservadores, “ao doente que livre e conscientemente pede a antecipação da morte porque os patamares de dignidade que se fixou para si mesmo em toda a sua vida estão irreversivelmente afastados”, respondem com “um claro não, em nome da sua filosofia, da sua religião ou do seu entendimento da vida”. “Tão autoritários são que se arrogam ser esse seu entendimento o único que pode valer”, frisou o deputado.

Ambicionando “dar voz ao primado da livre decisão de todas as pessoas em fim de vida”, o projeto do Bloco atribui relevo “à vontade expressa no Testamento Vital por quem, tendo iniciado e prosseguido o procedimento de antecipação da morte de acordo com o disposto na lei, entra em condição de inconsciência e fica incapacitado de confirmar essa vontade no último momento”.

Por outro lado, os bloquistas procuram “assegurar plenamente o cumprimento escrupuloso dos requisitos legais da despenalização”, reforçando “os mecanismos de garantia, atribuindo à Comissão de Avaliação prevista neste Projeto de Lei competência para verificação prévia do cumprimento do procedimento consagrado na lei que agora propomos, algo que não existe nas legislações dos demais países que legalizaram a prática da morte assistida”.

De acordo com José Manuel Pureza, estamos perante “um projeto de lei sensato, equilibrado, rigoroso que responde ao extremismo à intolerância de quem usa o medo e o autoritarismo como argumentos”.

“Estamos convictos de que esta nossa opção encontrará eco positivo nos/as deputados/as dos outros partidos. Pela nossa parte, faremos tudo para continuar a abrir o espaço da tolerância e do respeito pela dignidade de todas as pessoas. É esse o nosso compromisso”, garantiu.

Catarina Martins na conferência sobre despenalização da morte assistida | ESQUERDA.NET

Sessão Despenalizar a Morte Assistida | ESQUERDA.NET

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