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"Honoris Causa" a Adriano Moreira em Cabo Verde é um "insulto"

Adriano Moreira vai ser distinguido hoje, Dia Internacional dos Direitos Humanos, com o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade do Mindelo. A Associação Cabo-Verdiana de Ex-Presos Políticos considera o ato um “insulto”, “porque foi ministro do Ultramar e foi sob a sua liderança que o campo de concentração do Tarrafal foi reaberto”. Adriano Moreira nega, mas a portaria comprova.

Adriano Moreira será distinguido com titulo de Doutor Honoris Causa este sábado, pela Universidade do Mindelo numa cerimónia a ser realizada a partir das 10 horas no Centro Cultural do Mindelo, Cabo Verde.

A Associação Cabo-Verdiana de Ex-Presos Políticos (ACEP) considerou que o Doutoramento Honoria Causa é um insulto. Pedro Martins, presidente da ACEP, fundamentou em declarações à agência Lusa: “É um insulto porque foi ministro do Ultramar e foi sob a sua liderança que o campo de concentração do Tarrafal foi reaberto (Junho de 1961). Também foi nesse período em que a PIDE foi trazida para Cabo Verde”.

Adriano Moreira negou a acusação da ACEP, afirmando a A Semana: “Estas declarações foram feitas certamente por alguém que conhece mal a história de Cabo Verde. Essas pessoas deveriam pesquisar a história para verem qual foi a última vez que o Tarrafal funcionou. Porque quando assumi o Ministério do Ultramar o campo de Concentração do Tarrafal já não existia”.

Como se pode ler na imagem, a portaria nº 18.539 de 17 de Junho de 1961, institui “em Chão Bom um campo de trabalho”, ao contrário do que Adriano Moreira afirma e a portaria tem a sua assinatura como Ministro do Ultramar.

Numa opinião, publicada no blogue Entre as brumas da memória de Joana Lopes e com o título “A amnésia do leão é a glória do caçador”, Diana Andringa realça:

“Não pondo em causa as qualidades académicas do Professor-Doutor Adriano Moreira, não posso deixar de pensar que conceder-lhe o Doutoramento Honoris Causa no Dia Internacional dos Direitos Humanos, tendo sido ele o autor da Portaria 18.539, de 17 de Junho de 1961, que instituiu o Campo de Trabalho de Chão Bom – onde estiveram presos, em condições de inumanidade, mais de duas centenas de nacionalistas de Angola, Guiné e Cabo Verde – é, além de uma notável demonstração de humor negro, uma afronta à memória dos homens e mulheres que lutaram pela libertação dos seus países do jugo colonial português. Não se trata de perpetuar ódios, mas de respeitar a memória das vítimas.”

Diana Andringa lembra ainda que: “No cemitério da Vila do Tarrafal permanecem ainda os restos mortais dos guineenses Cutubo Cassamá e Biaba Nabué, falecidos no campo a 12 e 24 de Novembro de 1962. Morreram também, em consequência da sua detenção no campo, os angolanos António Pedro Benge (13 de Setembro de 1962) e Magita Chipóia (13 de Maio de 1970). Muitos outros presos – alguns dos quais cabo-verdianos – vivem ainda as consequências dos maus tratos sofridos no campo mandado reabrir pelo agora homenageado no Dia Internacional dos Direitos Humanos.”

Também a direção do Movimento Não Apaguem a Memória tomou posição (como pode ser lido no blogue O que fica do que passa), referindo nomeadamente que:

“Esta homenagem de uma Universidade da República de Cabo Verde não pode deixar de ser considerada uma afronta aos patriotas de Cabo Verde, da Guiné-Bissau e de Angola que lutaram pela independência dos seus países e que sofreram inomináveis brutalidades, às ordens da PIDE, neste campo de concentração de má memória, onde já tinham sido condenados a morte lenta, tantos portugueses, antes de ter sido reaberto naquela data por Adriano Moreira.”

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