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Ex-diretor geral de Saúde alerta para "abusos” no prolongamento da vida, sobretudo no privado

Durante a conferência sobre a despenalização da morte assistida, promovida pelo Bloco, Francisco George defendeu que “esta lei tem de ser aprovada no interesse público". A iniciativa contou com debates sobre as implicações biomédicas da morte assistida, a legislação de um direito e a resposta política a dar à lei atual.
Foto de Arno Mikkor, Wikimedia.

Durante a conferência sobre a despenalização da morte assistida, promovida pelo Bloco, o atual presidente da Cruz Vermelha, Francisco George, defendeu que “esta lei tem de ser aprovada no interesse público, porque no final da vida há abusos médicos muitas vezes, por pressão de administrações sobretudo no setor privado, onde se mantém a vida artificial, que não é aceitável nem no plano moral, nem no plano da ética, nem no plano médico, nem no plano económico”.

Francisco George participou na mesa dedicada a “implicações biomédicas”, que contou também com a participação de Alexandre Quintanilha, Júlio Machado Vaz, Machado Caetano e Bruno Maia.

Durante a sua intervenção, o médico Machado Caetano defendeu que “a ciência e o carinho são indispensáveis no desempenho da medicina”.

Já o cientista e deputado do PS Alexandre Quintanilha respondeu às críticas à proposta de despenalização da morte assistida.

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“Invoca-se a noção de que a morte não é solução porque existem variadas formas de controlar a dor nos cuidados paliativos. Mas as doses de fármacos necessárias são muitas vezes igualmente intoleráveis”, referiu.

“Afirma-se que, permitindo a morte assistida, se abrem as portas ao descontrolo. Este efeito - o slippery slope - não aconteceu em nenhum país que legalizou a morte assistida”, acrescentou ainda o deputado do deputado do PS.

Alexandre Quintanilha terminou com uma citação de Montaigne: “A nossa vida depende da vontade de outros. A nossa morte, da vontade própria”.

“O que verdadeiramente nos define é a vida com dignidade”

Num outro painel da conferência, dedicado às implicações jurídicas da despenalização da morte assistida, os três convidados elogiaram o projeto do Bloco, considerando que o mesmo não levanta quaisquer problemas constitucionais.

O deputado do PS e constitucionalista Bacelar de Vasconcelos destacou que tem “alguma repugnância em submeter a morte assistida à ideia do direito à vida, porque o que verdadeiramente nos define é a vida com dignidade”.

“Acho [o projeto do Bloco] irrepreensível porque, para além de delimitar de forma muito precisa o âmbito em que a morte assistida deve passar a ser descriminalizada, há todo um percurso, uma fiscalização que responde a todas as críticas que mais tradicionalmente se esgrimem”, avançou.

O presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais vincou, inclusive, que “a despenalização da morte assistida é um imperativo constitucional”, com base no artigo 1.º da Constituição, que, a seu ver, identifica a dignidade humana e vontade popular como pilares da República Portuguesa.

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A diretora da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Teresa Pizarro Beleza, afirmou-se convicta de que “o direito à vida implica o direito à morte”, alertando que a eutanásia já é hoje “praticada diariamente” em hospitais, com outros nomes, como “a sedação profunda”.

“A vida humana será inviolável por terceiros, pelo próprio não o é no sistema penal português”, assinalou.

Também o ex-bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves defendeu que a despenalização da morte assistida, em caso de “sofrimento atroz”, é “compatível com a proteção do direito à vida prevista na Constituição ou a condenação do homicídio de forma severa”.

“Num caso de irreversibilidade de sofrimento e morte atroz, o indivíduo deve decidir o seu destino. Exceto numa visão saloia do direito à vida”, disse Rogério Alves.

O ex-bastonário da Ordem dos Advogados enfatizou que “todos entendem que, nestas situações, quando é o próprio a pedir, a morte assistida não é homicídio”.

É de “direitos, garantias e liberdades que falamos quando falamos de morte assistida”

“É francamente redutor discutir esta matéria sob o ponto de vista da despenalização”, afirmou a deputada do PSD e ex-ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz, que participou no último painel sobre a morte assistida, dedicado à resposta política.

“A Constituição não obriga à vida, define sim a inviolabilidade da vida humana, e isso inclui a morte”. É, portanto, de “direitos, garantias e liberdades que falamos quando falamos de morte assistida”, salientou Paula Teixeira da Cruz.

A deputada do PSD considera que este “não é um tema partidário”, com defensores e detratores em todos os partidos, sendo que seria “um erro tremendo” restringir a discussão a esse nível.

Já a deputada do PS Maria Antónia Almeida Santos, congratulou o Bloco pela nova versão do projeto, por ser “bastante mais garantístico” quanto a preocupações da sociedade.

“Defender a vida é defendê-la até ao fim”, defendeu Maria Antónia Almeida Santos.

O médico Gilberto Couto referiu que “devemos partir sempre do princípio da relação de confiança entre doente e médico e a doutrina de consentimento informado”.

Sessão Despenalizar a Morte Assistida | ESQUERDA.NET

Catarina Martins na conferência sobre despenalização da morte assistida | ESQUERDA.NET

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