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25 de Abril: quatro meses antes

O esquerda.net republica as "Recordações da Casa Vermelha" de João Martins Pereira – um conjunto de recortes e memórias dos meses que precederam a Revolução, publicado na revista Combate nos 20 anos do 25 de Abril.
As "Recordações da Casa Vermelha" recolhidas por João Martins Pereira em 1994.

Recordações da Casa Vermelha

Mês -4 | Dezembro 1973

GRANDES TEMAS

Estudantes

Início agitado do ano lectivo nas universidades, que são autorizadas a recusar a matrícula de alunos “prejudiciais à manutenção de um saudável ambiente de trabalho”. Os “vigilantes” criados por Veiga Simão controlam as entradas em Letras e Direito, e entregam estudantes à polícia. Esta, pela mão do novo reitor, Veríssimo Simão, invade as instalações da A. E. de Medicina. Forte contestação à Direção do IST, que recusou 70 matrículas. Economia tem as aulas suspensas. A situação irá manter-se sem grande alteração até Abril do próximo ano.

Militares

Mês decisivo para o Movimento dos Capitães, embora em Óbidos, no dia 1, tenha sido recusada, pelo peso dos paraquedistas, a “preparação da revolução”. 

Pelo seu lado, Kaulza prepara um golpe de extrema-direita (em que estaria metido Adriano Moreira) e namora os “capitães”. Estes, ao saberem da prevista eliminação de Spínola e Costa Gomes, provocam a denúncia do golpe por Fabião (então spinolista) aos seus colegas de curso nos Altos Estudos Militares, fazendo-o abortar. Sem este precioso serviço, a História poderia ter sido diferente.

A partir daí o Movimento dos Capitães passa a ter dois generais “apalavrados” para o seu próprio golpe, que começa a desenhar-se: Spínola (que revê as provas do seu livro “Portugal e o Futuro”) e Costa Gomes (que em Setembro já intercedera junto de Caetano para que revogasse os famosos “decretos”). Os aumentos dos vencimentos dos militares, decretados este mês, vêm tarde demais.

Vasco Gonçalves aparece pela 1ª vez numa reunião do Movimento em 8 de Dezembro, na Caparica.

GENTE

Perigosa. Preso Palma Inácio, que se evadira em 1969 da DGS no Porto, e por cuja captura se ofereciam 50 contos aos meritórios denunciantes. Presos também Nuno Teotónio Pereira e Luís Moita. Recusada a aplicação da recente amnistia ao capitão Peralta, cubano capturado na Guiné em 1968, e libertado só depois do 25 de Abril, à força de manifestações de rua.

Inofensiva. O “Expresso” elege António Maria Pereira (hoje deputado do PSD) o “playboy do ano”.

De peso. Kissinger visita Lisboa pela primeira vez: “Portugal tem sido um bom e fiel amigo dos Estados Unidos”.

ANTECIPAÇÕES

No parecer da Câmara Corporativa ao IV Plano de Fomento justificam-se as elevadas taxas de crescimento nele previstas por serem “necessárias para modernizar a economia, melhorar rápida e significativamente o nível de vida da população e adaptar o país aos condicionalismos resultantes da integração europeia”. Substituindo esta última por “Novo contexto europeu”, quase coincide com as “Opções estratégicas” do actual PDR.

A Carris fica sob tutela da Câmara Municipal de Lisboa, finda (por acordo) a concessão dada em 1899 à Lisbon Electric Tramway britânica. É o que o Governo pretende fazer de novo em 1993 (a Carris passará a Empresa Pública em 1975).

LÁ FORA

Notícias que podiam vir, mais coisa menos coisa, no jornal de ontem: atentado do IRA em Londres, cimeira da CEE em Copenhague, Conferência de paz para o Médio-Oriente em Genebra, atentado da ETA em Madrid (morre Carrero Blanco, sucessor designado de Franco) – tudo isto em… Dezembro de 1973.

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